- Baixa rentabilidade da atividade, altos custos de produção e dificuldade para aquisição de sementes e comercialização das mudas estão entre as razões para a queda da produção.
- Entre 120 viveiros identificados no estado, 35 foram desativados na última década.
- Produção estimada no estado é de 4,8 milhões anuais, o que corresponde a 44% da capacidade produtiva dos viveiros.
- Viveiros reproduzem somente 22% da biodiversidade vegetal do bioma.
- Planejamento e ações de incentivo são essenciais para a manutenção da atividade
Pesquisa realizada pela Embrapa Agrobiologia (RJ) revela que a produção de mudas para reflorestamento sofreu uma retração de 30% no estado do Rio de Janeiro, nos últimos dez anos. O estado possui metade do seu território coberto por áreas degradadas e a baixa produção de mudas de espécies florestais em viveiros pode ser um dos maiores entraves para a restauração. “A produção atual de mudas no estado supre menos de 1% da demanda para restaurar as áreas prioritárias de proteção de mananciais hídricos”, revela a pesquisadora Juliana Freire.
Para que os viveiros possam atender à demanda de reflorestamento com uma gama diversificada de espécies, é essencial que os empreendimentos se planejem e façam encomendas aos viveiristas com uma certa antecedência, ressalta Freire. “Também é fundamental que o setor público implemente ações de incentivo permanente para o setor”, complementa.Originalmente, a Mata Atlântica cobria cerca de 98% da área do estado e hoje ocupa apenas 17%. Mas, a depender do que é produzido pelos viveiros fluminenses, as formações florestais não poderão contar com toda diversidade do bioma, apontado como um dos mais ricos do planeta. “Embora a riqueza de espécies produzidas pelos viveiros tenha aumentado nos últimos anos, e represente uma das maiores do Brasil, ainda é muito baixa se comparada à diversidade encontrada no bioma”, explica a pesquisadora. Segundo o estudo da Embrapa, os viveiros produzem somente 22% da diversidade de espécies nativas da Mata Atlântica do estado do Rio de Janeiro.
A produção de mudas de espécies florestais em todo o estado foi estimada em 4,8 milhões ao ano. Esse número corresponde a 44% da capacidade produtiva, que é acima de 10 milhões de mudas. De acordo com a pesquisa, a baixa rentabilidade para os viveiristas, os altos custos de produção e a dificuldade para aquisição de sementes e comercialização são os principais fatores que contribuem para uma produção tão abaixo da capacidade e da demanda existente.
Retração de 30%
Nos viveiros fluminenses são produzidas 977 espécies diferentes, sendo 539 nativas da Mata Atlântica. Cada viveiro produz, em média, 99 espécies nativas. Porém, ainda há uma baixa produção de espécies endêmicas e ameaçadas.
O estudo mostrou que, dos 120 viveiros identificados, 35 foram desativados na última década, sendo 27 viveiros pertencentes à iniciativa privada. Dos que ainda estão em atividade, 48 são públicos, 31 privados e 2 do terceiro setor; e sobre os outros 4restantes não houve informações. Esses números revelam a retração de 30% do setor produtivo comparado ao último diagnóstico realizado em 2010 pelos órgãos públicos estaduais.
Processo da pesquisa
Para elaborar o diagnóstico, os pesquisadores avaliaram o perfil, a distribuição regional, a riqueza e a capacidade produtiva dos viveiros, assim como a diversidade de espécies produzidas por eles. Também foi analisado o potencial em atender ao aumento da demanda de restauração ecológica frente aos compromissos ambientais em regiões hidrográficas fluminenses.
O contato com os viveiros foi feito por e-mail, telefone e visita técnica, para avaliação e aplicação de um questionário padronizado contendo 69 tópicos a serem preenchidos. Além disso, foi realizado um mapeamento por meio das coordenadas geográficas fornecidas pelos próprios viveiristas. Também foi contabilizado o número de viveiros no município e por região hidrográfica do Rio de Janeiro e coletados os dados de produção anual de mudas em cada estabelecimento.
Após coleta de informações, os pesquisadores criaram um banco de dados sobre os viveiros (categoria administrativa, capacidade produtiva e tamanho) e sobre cada espécie de arbustos e árvores, classificando-as em nome, hábito vegetal, distribuição natural, grau de ameaça, entre outras informações. E, por fim, a divisão da demanda total por mudas em cada região, considerando apenas áreas de interesse para a proteção e recuperação de bacias hidrográficas com prioridade alta e muito alta, conforme estudo de 2018 do Instituto Estadual do Ambiente (Inea).
Foi identificado ainda que existem muitos viveiros de pequeno e médio porte que, embora contribuam pouco na produção, são importantes para a diversidade de espécies de mudas oferecidas.
A arte de coletar sementes
Adentrar lugares de difícil acesso, escalar a copa de imensas árvores na floresta e carregar um peso razoável do meio da mata até os locais de produção das mudas. Isso faz parte da rotina nada fácil de quem trabalha em um viveiro. “Geralmente tiramos um quarto das sementes que têm na árvore e ao final do dia arrastamos um peso razoável para chegar com as sementes de volta ao viveiro”, relata Marina Figueira de Mello, do Viveiro Mata Atlântica, em Nova Friburgo, na Região Serrana fluminense.
A viveirista conta, entusiasmada, que está em busca da otimização desse processo. A expedição na floresta para recolher sementes é feita de uma a duas vezes por semana com base no banco de dados das árvores matrizes. “Buscamos ter cautela na coleta das sementes para não retirar demais e desequilibrar o processo natural de frutificação das árvores matrizes”, explica.
O viveiro Mata Atlântica produz, anualmente, de 30 mil a 40 mil mudas nativas. “A gente marca as matrizes, desenvolve um calendário fenológico (período reprodutivo – flores e frutos) e visita essas matrizes na ocasião da frutificação para ver se consegue obter a semente que precisa”, descreve Mello.
Após a germinação, as sementes apresentam 40% de chance de se transformar em uma árvore. Logo, o trabalho do viveiro é importante para viabilizar que as sementes se transformem em mudas que, no futuro, vão contribuir com a restauração ecológica da Mata Atlântica.
Espécie rara
A viveirista Barbara Pellegrini já encontrou mais de 400 espécies na floresta. No viveiro Muda Tudo, em Petrópolis, na Região Serrana fluminense, ela produz atualmente cerca de 40 mil mudas por ano. São trezentas espécies, com destaque para aquelas apropriadas para o enriquecimento da diversidade e a restauração de áreas de nascentes, matas ciliares e terrenos secos.
Na rotina dos viveiros, um dia nem sempre é igual ao outro. “Um marco importante foi uma vez que eu estava olhando para o mato e vendo uma árvore com flor amarela que eu achava que podia ser uma aleluia ou um fedegoso, e um biólogo falou para mim: não, essa é uma braúna, esse amarelo é um pouco diferente.” A braúna (Melanoxylon brauna) é uma espécie considerada ameaçada pela União Internacional pela Conservação da Natureza (IUCN) e difícil de produzir mudas. “Agora quando olho para o mato, vejo amarelo, fico atenta porque já sei que um tom pode ser diferente do outro”, comenta a viveirista.