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O melhoramento genético deve resultar em animais com qualidade de carcaça e da carne, mantendo as características adaptativas que a raça alcançou por meio da seleção natural. Foto: Alexandre Floriani
A Embrapa Recursos Genéticos e Biotecnologia (DF) revelou recentemente avanços significativos na conservação genética da raça bovina Crioula Lageana. A pesquisa identificou touros da raça para atuar como doadores de sêmen, visando assegurar a preservação da variabilidade genética da raça em bancos de germoplasma. O estudo revelou que o tamanho efetivo do rebanho é de 21 animais, um número inferior ao recomendado pela Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO) para evitar o risco de extinção. Contudo, esse número é considerado razoável para uma raça de pequena população, que conta com aproximadamente 1.500 indivíduos no Brasil.
O tamanho efetivo representa o número de reprodutores não aparentados, tanto machos quanto fêmeas, que estão contribuindo geneticamente para a formação da população. Apesar de o rebanho total da Crioula Lageana ter cerca de 1.500 animais, estima-se que apenas 21 reprodutores não aparentados estão efetivamente participando dos cruzamentos.
A FAO sugere que um tamanho efetivo de cerca de 50 animais é necessário para garantir a sobrevivência de uma raça ao longo do tempo. Em comparação, a raça Nelore, com milhões de indivíduos globalmente, tem um tamanho efetivo estimado em cerca de 100 animais, conforme relatado pela pesquisadora Patrícia Ianella, da Embrapa.
“Nessas raças localmente adaptadas, como a Crioula Lageana, o número de animais é geralmente muito pequeno, resultando em uma população efetiva ainda menor,” explica Ianella. A Embrapa analisou 450 animais registrados de oito fazendas para avaliar a variabilidade genética e orientar os cruzamentos, em colaboração com a Associação Brasileira de Criadores de Bovinos da Raça Crioula Lageana (ABCCL).
Avanços no Programa de Conservação
O Programa de Conservação e Uso de Recursos Genéticos Animais da Embrapa considera a colaboração com a ABCCL um avanço significativo. “Atualmente, temos 10 animais armazenados em nosso Banco Genético. Com o estudo recente, esperamos aumentar esse número para 21, através da coleta de sêmen de touros-chave das fazendas participantes,” destaca Ianella.
A coleta de materiais já está em andamento, com alguns materiais sendo obtidos e outros aguardando a disponibilidade dos produtores para enviar os animais para a central de coleta. Ianella projeta que a atualização do Banco Genético será concluída em no máximo cinco anos.
Além das análises genéticas, o trabalho também envolve a elaboração de um projeto para organizar o manejo genético da raça, realizado com o auxílio do pesquisador Alexandre Floriani. “Em rebanhos pequenos, a variabilidade genética pode ser comprometida. O objetivo é garantir a preservação dessa variabilidade e promover a seleção e o melhoramento genético,” afirma Floriani.
A análise permitirá orientar os cruzamentos para evitar a endogamia, maximizar a variabilidade genética e melhorar a produtividade da raça. Em paralelo, a Embrapa e a ABCCL estão buscando criadores não associados para integrar o programa e aumentar a variabilidade populacional.
Perspectivas Futuras
O trabalho de melhoramento genético visa aprimorar o desempenho ponderal, a qualidade da carcaça e da carne, mantendo as características adaptativas da raça, como tolerância térmica e resistência a parasitas e doenças. “Estamos também explorando cruzamentos do Crioulo Lageano com Nelore na região do Matopiba para produzir carne premium de forma sustentável,” comenta Floriani.
O estudo genético da raça Crioula Lageana foi publicado em um artigo científico com a autoria principal da aluna de mestrado Daiza Orth, da Universidade de Brasília (UnB), e coautoria de Lucas Macedo Santos Basílio, Alexandre Floriani Ramos, Alexandre Rodrigues Caetano, Patrícia Ianella e Geraldo Magela Cortes Carvalho.
Intitulado “Genomic Characterization of the Brazilian Crioulo Lageano: Insights for Conservation of a Brazilian Local Bovine Breed”, o artigo está disponível na íntegra [aqui](link para o artigo).
Ianella destaca uma inovação no Programa de Conservação e Uso de Recursos Genéticos Animais: “Estamos agora ativamente selecionando os animais para preservar o material em nosso banco, visando otimizar o processo de conservação e garantir a variabilidade com o menor número de amostras possíveis.”
Conservação e Importância Histórica
A raça Crioula Lageana, originária dos antigos bovinos Hamíticos, adaptou-se ao Brasil durante a colonização e desenvolveu características únicas de rusticidade e adaptação ao clima frio do sul do País. A raça também mostrou tolerância a temperaturas mais elevadas, similar a outros bovinos brasileiros.
Com chifres que podem alcançar até 2 metros e excelente aptidão para carne e leite, o Crioulo Lageano quase enfrentou a extinção sem o trabalho da família Camargo, que preservou e valorizou a raça. A Embrapa iniciou o trabalho de conservação na década de 1980 e, em 2004, fundou a Associação Brasileira de Criadores de Bovinos da Raça Crioula Lageana (ABCCL). Em 2008, a raça foi oficialmente reconhecida pelo Ministério da Agricultura e Pecuária (Mapa), consolidando seu futuro.
Fonte: portaldoagronegocio