Marcelo Urtado decidiu cursar agronomia na Unesp de Bauru para trabalhar na fazenda de café do pai. Mas mudou de rumo em 2016, ao comprar a própria fazenda, em Monte Carmelo, no Cerrado Mineiro, para produzir café em gestão compartilhada com a mulher, Paula, de forma equilibrada, resiliente, sem uso de produtos químicos, dando condições à natureza para gerar o chamado “café carbono neutro”.
Renomeada como Três Meninas, em homenagem às três mulheres da vida de Urtado (a mulher e as duas filhas, Malu e Fernanda, de 12 anos e 8 anos) a fazenda tem 54 hectares, 40 de cafezais. A produção pioneira no sistema regenerativo e orgânico tem um rendimento médio de campo de cerca de 54 sacas por hectare ante uma produtividade média brasileira de café de 30,6 sacas por hectare.
“A fazenda que compramos estava na UTI, precisando de quimioterapia. Pensamos em arrancar tudo, mas decidimos investir para recuperar a plantação de café e transformar o modo de produção. A transição demandou cinco anos, com o uso de plantas de cobertura e de químicos associados a produtos biológicos. A cada ano, fomos reduzindo os químicos. Dessa forma, mudamos o ecossistema, criando um meio conservativo e dependendo menos de insumos externos”, explica.
O custo de produção cresceu 20% nesse período de transição, mas a partir daí, o casal passou a economizar com os fertilizantes. Na última safra, a economia foi de 47%. O cafeicultor, engenheiro agrônomo – e também arborista certificado no município de São Paulo – paulista afirma que geralmente os produtores enxergam erroneamente tecnologia como sinônimo de moléculas de químicos para matar o que não é café, lutando contra a natureza.
Para a mudança, ele usou os ensinamentos de agrofloresta da universidade e foi buscar informações sobre agricultura regenerativa na Empresa de Pesquisa Agropecuária de Minas Gerais (Epamig) e com especialistas, como a agroecologista Ana Maria Primavesi e o pesquisador Ademir Calegari.
“Nós buscamos o equilíbrio na produção, com o plantio de plantas de cobertura pelo menos três vezes por ano, o que mantém o solo sempre coberto, melhora a biologia e serve como defesa contra inimigos do café. O plano não era ser uma produção orgânica, mas isso foi a consequência, um presente pelo trabalho bem feito. Mas em vez de orgânico, prefiro chamar a nossa produção de agricultura conservativa e climaticamente inteligente”, diz Urtado.
Urtado e a “três meninas” que dão nome à fazenda de café especial orgânico (Foto: Divulgação/Fazenda Três Meninas)
Urtado e a "três meninas" que dão nome à fazenda de café especial orgânico (Foto: Divulgação/Fazenda Três Meninas)
O manejo orgânico, sem químicos e com certificação do Brasil Orgânico, não significa uma lavoura sem pragas. O nível é semelhante ao de uma fazenda que usa herbicidas químicos, mas o controle de danos garante a produtividade. Urtado faz questão de esclarecer que ser orgânico não significa produzir menos da metade do convencional. “Isso é preconceito. Mesmo nos anos de transição, produzimos bem e tivemos lucro.”
Quando é necessário, Urtado usa produtos biológicos, como as iscas para controle das formigas corta-folhas. Além dessas inimigas, a fazenda tem muitas espécies de “formigas do bem”, incluindo as predadoras da broca-do-café, inseto que ataca o fruto e derruba a produtividade. As abelhas também inundam a propriedade. “Algumas vezes, o zumbido das abelhas até atrapalha a conversa”, diz ele.