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Agronegócio

A experiência na Gestão socioambiental da bovinocultura pode acelerar entrada das agroindústrias de aves e suínos em mercados mais exigentes

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A experiência na Gestão socioambiental da bovinocultura pode acelerar entrada das agroindústrias de aves e suínos em mercados mais exigentes

A estratégia da agroindústria brasileira de aves e suínos para a expansão da comercialização de produtos com foco em mercados mais competitivos enfrenta muitos desafios e as oportunidades estão crescendo. Um exemplo é a Ucrânia. Responsável por cerca de 10% das exportações de carne de frango do planeta, o país não conseguirá atender à demanda devido à guerra, o que pode ampliar o mercado para o Brasil. Entre as exigências de alguns blocos econômicos está o cumprimento à legislação socioambiental. Mas, um exemplo vindo da pecuária de corte pode servir como base para estruturar o segmento e deixá-lo apto para atender as demandas.

Carolina Gonçalves Mota, advogada da área ambiental do Martinelli Advogados, destaca que os obstáculos para atender as exigências dos países importadores já vêm sendo encarados pela indústria da bovinocultura desde meados dos anos 2000. Na época, o setor começou a sofrer pressão de grandes compradores, investidores, instituições e órgãos públicos por relacionar o aumento do desmatamento no Brasil com a instalação de pastagens, o que os obrigou a demonstrar maior transparência às boas práticas da cadeia de fornecedores e exercer atividade com menor impacto socioambiental. A adequação às boas práticas desencadeou em oportunidades, como por exemplo, colocar no mercado produto com maior valor agregado, apresentando menor emissão de carbono. “Por isso, a adequação de grandes frigoríficos à legislação pode servir de exemplo para que as agroindústrias ligadas à avicultura e suinocultura se adequem às políticas socioambientais dos principais mercados internacionais”, reforça a especialista.

O mercado de aves e suínos segue em ascensão e, consequentemente, os desafios de controle social e ambiental também, entre eles o aumento de consumo de água e resíduos produzidos pela cadeia produtiva, o que exige uma destinação adequada. Para se ter uma ideia do tamanho do segmento, dados da Associação Brasileira de Proteína Animal (ABPA) apontam que o Brasil produziu, no ano passado, 14,33 milhões de toneladas (t) de carne de frango, ante 13,84 milhões/t do ano anterior, e 4,7 milhões/t de carne suína, contra 4,3 milhões/t referente ao ano de 2020.

Em contrapartida, segundo dados científicos, a pegada hídrica média global é de 5.988 litros por kg de carne suína e 4.325 litros de água por kg de carne de frango. Quanto à geração de resíduos, segundo informações da Embrapa indicam que uma granja de suínos com vinte matrizes em ciclo completo, pode produzir 500 m³ de dejetos por ano. Já na avicultura, estima-se que num ciclo de 42 a 47 dias de vida do frango gerará 2kg de dejeto.

“O mercado de forma geral vê de forma muito ruim quando uma atividade econômica gera um impacto social e ambiental negativo, seja pela alta emissão de carbono, alto consumo de água ou pela poluição de rejeitos. Isto desencadeia em restrição de mercado, na desvalorização do produto além de taxa de juros maiores. Hoje, a agroindústria de aves e suínos pode aproveitar muito da experiência da bovinocultura de corte no que diz respeito à rastreabilidade de toda a cadeia produtiva, tanto em relação à emissão de gases quanto ao consumo de recursos naturais”, explica Carolina. Um dos maiores gargalos neste processo, pontua a advogada, está no rastreamento dos fornecedores em relação à emissão de gases. Na bovinocultura, por exemplo, a criação de gado representa cerca de 15% do total das emissões de carbono global, muito maior do que a agroindústria em si gera.

“No caso da produção de suínos, a falta do gerenciamento de dejetos dos animais, que muitas granjas acabam despejando de forma e em lugares inadequados, é um dos problemas mais comuns que as agroindústrias precisam administrar. Uma situação irregular de descarte de dejetos pode comprometer grandes contratos no mercado internacional”, afirma. Nesta questão, Carolina vê o problema como uma oportunidade das agroindústrias incentivarem os criadores a ampliarem seus rendimentos a partir da produção de energia através do biometano e adoção de práticas do Plano ABC da Embrapa. Além de reduzir o custo de produção do granjeiro que pode utilizar a energia gerada e passível de vender crédito de carbono, as agroindústrias podem conquistar mercados mais regulados, que geralmente pagam melhor pelo quilo da carcaça, e com isso todos podem sair ganhando.

Adequações

Para que isso aconteça, a especialista em direito ambiental do Martinelli observa que uma agroindústria precisa, antes de mais nada, conquistar o respectivo licenciamento, com o cumprimento das exigências dos órgãos estaduais e municipais, principalmente no que diz respeito ao controle de efluentes e captação de água. “A demora nesses procedimentos diante da burocracia ainda é um entrave, mas vale a pena investir, pois a possibilidade de ganhos com uma atividade regular é muito grande, além de afastar riscos regulatórios para a atividade”, salienta Carolina.

No caso da avicultura, completa a advogada, a cartilha é a mesma. Além dos rejeitos, que devem ser descartados de forma adequada, as áreas dos fornecedores precisam estar regularizadas. Ou seja, não deve ser uma propriedade ligada a terras indígenas ou quilombolas, precisa respeitar as reservas legais e Áreas de Proteção Permanentes (APPs) e ser livre de trabalho análogo à escravidão. “Para averiguar todas essas situações, além da organização e verificação dos documentos, a empresa interessada nesses mercados mais regulados precisa fazer auditoria periódica dos fornecedores”.

Muitas agroindústrias do setor de aves e suínos já estão fazendo o dever de casa e, com isso, elevando as exportações brasileiras. De acordo com a Associação Brasileira de Proteína Animal (ABPA), em 2021 os embarques de carne de frango obtiveram um crescimento de 8,95% no comparativo com o ano anterior, totalizando 4,609 milhões de toneladas. Já a carne suína, registrou um incremento de 10,9% nas exportações no ano passado no comparativo com 2020, com um total de 1,137 milhão de toneladas.

O principal destino para o frango brasileiro em 2021 foi a Ásia, com 36,76%, seguido da África, com 14,81%. O da carne suína foi o continente asiático com 75,16%, seguido do continente americano (15,46%).

Na prática

Patrícia de Pádua Rodrigues, advogada e especialista em direito ambiental do Martinelli, explica que a conquista do selo verde, conhecido como Programa de Rotulagem Ambiental (ISO-14020) já alcançado por frigoríficos ligados à bovinocultura de corte, também pode ser alcançada pelas agroindústrias de aves e suínos com a adoção do sistema de compliance.

“Tudo começa com o mapeamento de riscos. Nele, verificamos o que a lei exige naquele momento, pois elas mudam constantemente. Primeiro, levantamos todas as possibilidades referente a matriz de risco, ou seja, quais as ameaças que uma agroindústria pode gerar, a exemplo de possíveis embargos, responsabilização de indenização sobre riscos de poluição, infração criminal, entre outros”. Todos esses processos, completa Patrícia, precisam ser acompanhados por especialistas.

Patrícia complementa que, ainda com base no exemplo de alguns frigoríficos de bovinos de corte, investir em práticas ESG, sigla que vem do inglês e significa Ambiental, Social e Governança, pode ser uma saída para impulsionar o potencial produtivo e mercadológico das agroindústrias brasileiras de aves e suínos e colocá-las em um patamar ainda mais competitivo.

No entanto, complementa Carolina, devem observar as práticas que são benéficas para a sociedade, meio ambiente e financeiramente para a atividade, observando os desdobramentos médio e longo prazo bem como com transparência para não incorrer no chamado greenwashing. “O mercado investidor está cada vez mais especializado em analisar os critérios ESG nos diversos segmentos. Reportar ESG sem transparência e sem observar os desdobramentos de uma determinada prática para sociedade e meio ambiente, é pior do que não reportar ESG. É necessário cautela.”

 

Fonte: portaldoagronegocio

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