Apesar de previsto em lei, o direito de crianças opinarem sobre temas que as afetam ainda enfrenta obstáculos para ser plenamente reconhecido e aplicado. Essa é a avaliação da pesquisadora Zsuzsanna Rutai, referência internacional em salvaguarda infantil, durante visita ao Brasil.
O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) e a Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos da Criança garantem esse direito desde os anos 1990. No entanto, segundo Zsuzsanna, ele ainda não está consolidado, nem mesmo nos países que assinaram o tratado internacional.
“Após tantas décadas de implementação da convenção, esse princípio ainda não está estabelecido em todos os países e, mesmo nos países onde há iniciativas, não está estabelecido em todos os níveis em que deveria estar presente. Desde a família até nas políticas internacionais”, afirmou.
Atuando na organização Child Rights Connect, Zsuzsanna ressalta que a ausência de participação infantil em decisões legislativas é sintomática. Segundo ela, mesmo em democracias consolidadas, o espaço para que crianças expressem suas opiniões é restrito e, muitas vezes, deslegitimado.
“Quando crianças defendem seus direitos ou os de outros, não são levadas a sério. Sua presença é frequentemente questionada”, apontou.
Ex-integrante da Divisão de Direitos da Criança do Conselho da Europa, a pesquisadora também destacou formas sutis de repressão a crianças ativistas, como pressões escolares que comprometem seu desempenho acadêmico.
Transformação educacional
Zsuzsanna acredita que a chave para uma sociedade mais justa está na transformação das escolas e no envolvimento direto das crianças nesse processo. Ela lidera, junto ao Instituto Alana, o desenvolvimento de um currículo não formal voltado à formação de crianças ativistas.
O projeto-piloto, chamado Agora e o Futuro, será implementado em quatro países: Brasil, Togo, Moldávia e Tailândia. Os primeiros encontros já ocorrem em São Paulo, com atividades interativas que ajudam as crianças a conhecer seus direitos de forma prática.
“Será um currículo baseado na educação não formal, portanto, é aprender fazendo. Nada de palestras formais ou textos obrigatórios, e sim experiências significativas”, explicou.
A proposta é que essa formação influencie diretamente estruturas judiciais e sistemas de proteção infantil. Para Zsuzsanna, fortalecer as futuras gerações é o caminho para sociedades mais democráticas e respeitosas com os direitos humanos.
“É preciso ter gerações bem-educadas, empáticas e realmente confiantes no que fazem, acreditando na democracia, nos direitos humanos, protegendo a terra, respeitando o ambiente. Por isso, se quisermos realmente deixar um legado, temos que erguer as próximas gerações”, concluiu.
Fonte: cenariomt