Marcada por intensas mudanças, a adolescência é a fase em que há maior prevalência de casos de transtornos alimentares. Foi justamente com 16 anos que a filha da empresária Vanina Oliva, 48, passou a se exercitar demais, em 2016. A disciplina e boa forma da garota eram motivo de elogio e a família não percebeu nenhum problema, até o momento em que o padrasto passou a ficar em casa o dia todo, se recuperando de uma lesão. Foi ele quem notou que a adolescente tinha momentos de compulsão e que depois vomitava.
“Eu achava que ele estava pegando no pé dela e neguei a situação por desconhecer do que se tratava. Até o momento em que ela emagreceu muito”, lembra Vanina.
Depois de seis meses de buscas por um tratamento e de ter passado com a filha por diversos profissionais, que não identificaram o problema, Vanina levou a filha ao Hospital das Clínicas da USP.
“Ela estava com 33 kg e a internaram no mesmo dia, onde ficou por nove meses recebendo tratamento especializado da equipe do Geta (Grupo Interdisciplinar de Assistência e Estudos em Transtornos Alimentares). Eles salvaram a minha filha”, conta a mãe.
Já o auditor fiscal Roberto Nunes*, 55, começou a desconfiar que algo não ia bem com a filha, de 16 anos, em 2021. Ele percebeu que a quantidade de comida que ela punha no prato diminuiu. Em conversas diárias com ela, ele falava sobre a importância da alimentação para que ela tivesse energia e saúde para fazer as outras atividades das quais gostava.
“Eu fui conversando e abordava o problema comparando o corpo dela antes e como estava. Não era fácil, mas consegui convencê-la sobre a situação e a levei ao psiquiatra”, enfatiza.
Os transtornos alimentares são doenças psiquiátricas em que a relação da pessoa com a alimentação fica distorcida, podendo afetar tanto a ingestão como a absorção dos alimentos. Os principais são:
Anorexia nervosa: quando a pessoa come muito pouco ou deixa de se alimentar.
Bulimia nervosa: episódios de restrição alimentar seguidos de compulsão. A pessoa provoca vômito ou usa medicamentos laxativos.
Compulsão alimentar: há descontrole ao se alimentar.
Em todos os transtornos há um grande sofrimento psicológico e muita culpa. As causas do problema são multifatoriais e envolvem questões psicológicas, biológicas e sociais.
A cultura de obsessão pela magreza, pelo o que é saudável, a forma como a família se relaciona entre si e com a comida também são fatores que podem levar ao desenvolvimento de um transtorno alimentar. Pabyle Flauzino, nutricionista doutoranda em saúde coletiva UEC (Universidade Estadual do Ceará)
Sinais de alerta
Dinâmica excessiva de controle do peso;
Distorção da imagem corporal: a pessoa se percebe maior do que ela realmente é;
Mudança do ciclo menstrual em mulheres;
Problemas gastresofágicos;
Sofrimento ao se alimentar;
Isolamento social.
Hoje eu percebo que alguns comportamentos da minha filha já eram um alerta muito antes de ela ficar extremamente magra. Por exemplo: ela passou a ir ao supermercado comigo e escolhia os alimentos olhando os rótulos para contar as calorias. Ela também passou a querer fazer tudo a pé e usava roupas quentes mesmo se estivesse calor. Além disso, os parafusos do ralo da minha casa também sumiam porque ela tirava para vomitar lá dentro e ninguém perceber. Vanina Oliva
O que fazer?
O primeiro passo, se você desconfia que alguém próximo esteja com transtorno alimentar, segundo as especialistas, é se informar, conhecer os sintomas, as características da doença e como funciona o tratamento. Depois, tente conversar, demonstrando suas preocupações.
“Você pode dizer: ‘Olha, eu estou percebendo que você tem perdido muito peso. Isso está me preocupando, porque a gente sabe que a alimentação é importante para nossa sobrevivência’. Ou para pessoas que, por exemplo, possam estar com compulsão alimentar: ‘Tenho percebido que você tem comido mais rápido, que você não está se alimentando mais na mesa com a gente'”, sugere a psiquiatra Ana Raquel Santiago de Lima, docente do curso de medicina da UFS (Universidade Federal de Sergipe) e coordenadora do programa Physis de Comportamento Alimentar.
De acordo com a psicóloga Ana Luiza Sobral, especialista em transtornos alimentares e mestre em psicologia social pela UFS, pessoas com transtorno alimentar geralmente controlam ao máximo os comportamentos compensatórios e os rituais para perda de peso, para que ninguém perceba. Então, possivelmente quando você reparar que algo não vai bem, isso já significa que o transtorno se agravou. “É preciso abordar, de forma empática, que a pessoa precisa passar por uma avaliação psiquiátrica e psicológica”, explica Sobral.
Segundo a Astral (Associação Brasileira de Transtornos Alimentares), também é importante não minimizar o problema, nem culpar ou criticar a pessoa com o transtorno. “Temos que ter muita atenção com essa cultura de elogiar quem perdeu peso, porque com isso há a internalização de que isso é bom e saudável, como se a magreza fosse sinônimo de saúde e felicidade”, reforça Lima.
Onde encontrar ajuda?
É possível encontrar grupos de pesquisa e profissionais especializados em transtorno alimentar em todo o país através do site da Astral: www.astralbr.org
Fontes: Ana Luiza Sobral, psicóloga especialista em transtornos alimentares e mestre em psicologia social pela UFS (Universidade Federal de Sergipe); Ana Raquel Santiago de Lima, psiquiatra, docente do curso de medicina da UFS e coordenadora do programa Physis de Comportamento Alimentar; Pabyle Flauzino, nutricionista e doutoranda em saúde coletiva UEC (Universidade Estadual do Ceará).
*Nome alterado a pedido do entrevistado
Marcada por intensas mudanças, a adolescência é a fase em que há maior prevalência de casos de transtornos alimentares. Foi justamente com 16 anos que a filha da empresária Vanina Oliva, 48, passou a se exercitar demais, em 2016. A disciplina e boa forma da garota eram motivo de elogio e a família não percebeu nenhum problema, até o momento em que o padrasto passou a ficar em casa o dia todo, se recuperando de uma lesão. Foi ele quem notou que a adolescente tinha momentos de compulsão e que depois vomitava.
“Eu achava que ele estava pegando no pé dela e neguei a situação por desconhecer do que se tratava. Até o momento em que ela emagreceu muito”, lembra Vanina.
Depois de seis meses de buscas por um tratamento e de ter passado com a filha por diversos profissionais, que não identificaram o problema, Vanina levou a filha ao Hospital das Clínicas da USP.
“Ela estava com 33 kg e a internaram no mesmo dia, onde ficou por nove meses recebendo tratamento especializado da equipe do Geta (Grupo Interdisciplinar de Assistência e Estudos em Transtornos Alimentares). Eles salvaram a minha filha”, conta a mãe.
Já o auditor fiscal Roberto Nunes*, 55, começou a desconfiar que algo não ia bem com a filha, de 16 anos, em 2021. Ele percebeu que a quantidade de comida que ela punha no prato diminuiu. Em conversas diárias com ela, ele falava sobre a importância da alimentação para que ela tivesse energia e saúde para fazer as outras atividades das quais gostava.
“Eu fui conversando e abordava o problema comparando o corpo dela antes e como estava. Não era fácil, mas consegui convencê-la sobre a situação e a levei ao psiquiatra”, enfatiza.
Os transtornos alimentares são doenças psiquiátricas em que a relação da pessoa com a alimentação fica distorcida, podendo afetar tanto a ingestão como a absorção dos alimentos. Os principais são:
Anorexia nervosa: quando a pessoa come muito pouco ou deixa de se alimentar.
Bulimia nervosa: episódios de restrição alimentar seguidos de compulsão. A pessoa provoca vômito ou usa medicamentos laxativos.
Compulsão alimentar: há descontrole ao se alimentar.
Em todos os transtornos há um grande sofrimento psicológico e muita culpa. As causas do problema são multifatoriais e envolvem questões psicológicas, biológicas e sociais.
A cultura de obsessão pela magreza, pelo o que é saudável, a forma como a família se relaciona entre si e com a comida também são fatores que podem levar ao desenvolvimento de um transtorno alimentar. Pabyle Flauzino, nutricionista doutoranda em saúde coletiva UEC (Universidade Estadual do Ceará)
Sinais de alerta
Dinâmica excessiva de controle do peso;
Distorção da imagem corporal: a pessoa se percebe maior do que ela realmente é;
Mudança do ciclo menstrual em mulheres;
Problemas gastresofágicos;
Sofrimento ao se alimentar;
Isolamento social.
Hoje eu percebo que alguns comportamentos da minha filha já eram um alerta muito antes de ela ficar extremamente magra. Por exemplo: ela passou a ir ao supermercado comigo e escolhia os alimentos olhando os rótulos para contar as calorias. Ela também passou a querer fazer tudo a pé e usava roupas quentes mesmo se estivesse calor. Além disso, os parafusos do ralo da minha casa também sumiam porque ela tirava para vomitar lá dentro e ninguém perceber. Vanina Oliva
O que fazer?
O primeiro passo, se você desconfia que alguém próximo esteja com transtorno alimentar, segundo as especialistas, é se informar, conhecer os sintomas, as características da doença e como funciona o tratamento. Depois, tente conversar, demonstrando suas preocupações.
“Você pode dizer: ‘Olha, eu estou percebendo que você tem perdido muito peso. Isso está me preocupando, porque a gente sabe que a alimentação é importante para nossa sobrevivência’. Ou para pessoas que, por exemplo, possam estar com compulsão alimentar: ‘Tenho percebido que você tem comido mais rápido, que você não está se alimentando mais na mesa com a gente'”, sugere a psiquiatra Ana Raquel Santiago de Lima, docente do curso de medicina da UFS (Universidade Federal de Sergipe) e coordenadora do programa Physis de Comportamento Alimentar.
De acordo com a psicóloga Ana Luiza Sobral, especialista em transtornos alimentares e mestre em psicologia social pela UFS, pessoas com transtorno alimentar geralmente controlam ao máximo os comportamentos compensatórios e os rituais para perda de peso, para que ninguém perceba. Então, possivelmente quando você reparar que algo não vai bem, isso já significa que o transtorno se agravou. “É preciso abordar, de forma empática, que a pessoa precisa passar por uma avaliação psiquiátrica e psicológica”, explica Sobral.
Segundo a Astral (Associação Brasileira de Transtornos Alimentares), também é importante não minimizar o problema, nem culpar ou criticar a pessoa com o transtorno. “Temos que ter muita atenção com essa cultura de elogiar quem perdeu peso, porque com isso há a internalização de que isso é bom e saudável, como se a magreza fosse sinônimo de saúde e felicidade”, reforça Lima.
Onde encontrar ajuda?
É possível encontrar grupos de pesquisa e profissionais especializados em transtorno alimentar em todo o país através do site da Astral: www.astralbr.org
Fontes: Ana Luiza Sobral, psicóloga especialista em transtornos alimentares e mestre em psicologia social pela UFS (Universidade Federal de Sergipe); Ana Raquel Santiago de Lima, psiquiatra, docente do curso de medicina da UFS e coordenadora do programa Physis de Comportamento Alimentar; Pabyle Flauzino, nutricionista e doutoranda em saúde coletiva UEC (Universidade Estadual do Ceará).
*Nome alterado a pedido do entrevistado
Fonte: uol
Colunista: @chefcarlosmiranda