Via @metropoles | Em decisão monocrática, a conselheira do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) Daniela Pereira Madeira negou o pedido para suspender a demissão e reintegrar a ex-juíza Angélica Chamon Layoun, após a defesa apresentar recurso acompanhado de laudos médicos com diagnóstico de Transtorno do Espectro Autista (TEA) nível 1. Ela foi demitida pelo Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJRS) sob acusação de utilizar um mesmo modelo padrão de decisão em cerca de 2 mil processos, o que teria inflado artificialmente seus índices de produtividade.
A conselheira rejeitou o pedido, apesar de reconhecer que o diagnóstico de autismo e de burnout “pode, em tese, repercutir na apreciação do mérito” no futuro. Ainda assim, manteve a rejeição do pedido de liminar que buscava reintegrar a ex-juíza ao cargo.
“Causa perplexidade que a conselheira não tenha se sensibilizado com uma demissão de uma magistrada que não foi acusada de corrupção nem de enriquecimento ilícito, e que tenha se recusado a trazer ao exame do colegiado a análise do resultado das sindicâncias que foram abertas para apurar as denúncias formuladas pela magistrada contra terceiros. Ela não se pronunciou sobre os temas centrais que a defesa suscitou e tampouco sobre os efeitos das resoluções ao caso”, afirmou à coluna o advogado e ex-advogado-geral da União Fábio Medina Osório.
A defesa também criticou o fato de a decisão ter sido tomada em caráter monocrático.
“É dever da conselheira levar imediatamente o julgamento do caso ao plenário, e não decidir de forma monocrática. Ela, afinal, reconheceu na decisão a observância das resoluções de gênero e de pessoas autistas, mas não as aplicou.”
Laudo de espectro autista
Segundo o recurso apresentado pela defesa ao CNJ, exames médicos e avaliações psicológicas realizados entre setembro e novembro de 2025 atestaram que a ex-juíza possui TEA nível 1, além de altas habilidades e quadro de esgotamento profissional (burnout).
De acordo com a defesa, essa condição interfere na comunicação, organização e resposta a situações de pressão, impactando tanto o desempenho funcional quanto a condução da defesa no processo disciplinar.
A defesa sustenta que comportamentos analisados no procedimento administrativo como indícios de negligência ou má-fé foram avaliados sem a devida consideração do contexto clínico, e que dificuldades de comunicação e organização acabaram interpretadas como falhas funcionais.
Além da acusação de uso de modelos padronizados em sentenças, o processo disciplinar também levou em conta dados de produtividade e supostas irregularidades na condução de processos. A defesa, porém, questiona a confiabilidade dessas informações e afirma que pedidos de esclarecimento técnico e de produção de provas foram negados de forma genérica, sem análise detalhada.
O recurso também aponta suposto tratamento desigual durante a apuração. Segundo a defesa, mesmo após o encerramento da fase de produção de provas, o processo teria sido reaberto para diligências que poderiam reforçar as acusações, enquanto pedidos de produção de provas que poderiam beneficiá-la — como a verificação da contabilização de atos processuais — teriam sido negados.
Outro ponto levantado é o pedido para que o CNJ solicite a íntegra de um procedimento administrativo arquivado no TJRS que teria apurado denúncias feitas pela própria acusada sobre possíveis problemas internos. Segundo a defesa, esse material é relevante para compreender o contexto do processo disciplinar.
Ao final, os advogados pediram a revisão da decisão que negou a produção de provas, a reabertura da fase de apuração e a suspensão dos efeitos da demissão até o julgamento final. Eles também solicitaram que o diagnóstico de TEA seja considerado na análise das acusações, inclusive a relacionada ao uso reiterado de decisões padronizadas, bem como na avaliação da penalidade aplicada.
A defesa também solicitou que o diagnóstico de TEA seja levado em conta na análise das acusações, incluindo a relacionada ao uso reiterado de decisões padronizadas em sentenças, e na avaliação da punição aplicada.
Quem é a ex-juíza
Natural de Mariana (MG), Angélica Chamon Layoun atuou por seis anos como juíza no Estado de Pernambuco antes de ser aprovada em concurso para a magistratura gaúcha. Ao ser nomeada no Rio Grande do Sul, em julho de 2022, ela optou por se exonerar do Judiciário pernambucano.
A carreira no Judiciário gaúcho durou apenas 1 ano, 2 meses e 15 dias. Em outubro de 2023, ela passou a responder a investigação administrativa por:
- uso de um mesmo modelo padrão para sentenciar cerca de 2 mil processos cíveis;
- desarquivamento de processos já julgados e emissão de sentenças idênticas, computadas como novos julgamentos.
Como ainda estava em estágio probatório, ela não possuía a garantia de vitaliciedade.
De acordo com o Tribunal, Angélica teria adotado as práticas que geraram a demissão, na tentativa de aumentar artificialmente os índices de produtividade.
“Angélica foi muito massacrada pela mídia desde o primeiro momento, após o vazamento de sua condenação, tão logo decretada pelo Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, sob relatoria do desembargador Marcelo Bandeira Pereira. Na ocasião, foram divulgadas informações deturpadas a respeito do processo e de sua demissão”, concluiu o advogado.
Paulo Cappelli
Fonte: @metropoles







