“Esse velho mundo é algo que habita muito próximo da gente. Ele só não está aí porque a gente está perdendo a capacidade de enxergar.” A frase de Teago Oliveira define o espírito que atravessa “Canções do Velho Mundo”, seu novo álbum solo lançado pelo selo Meia Noite FM no último 10 de outubro. O disco, sucessor de “Boa Sorte” (2019), reafirma o lugar do artista baiano como uma das vozes mais singulares da música brasileira contemporânea: um cronista da delicadeza em tempos caóticos.
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Fotos: Duane Carvalho
“Esse disco tenta tirar a gente um pouco desse lugar e lembrar de como podemos seguir nesse mundo novo, sendo de um mundo velho”, explica Teago em entrevista ao ROCKline. “Trazer algo de substancial pra essa época tão acelerada.”
“Canções do Velho Mundo” nasceu dentro de casa, literalmente. Teago montou seu próprio estúdio e decidiu gravar o álbum de forma quase artesanal, com instrumentos reais, poucos recursos digitais, nenhuma pressa e a ajuda de colegas, como os produtores Otavio Bonazzi e Bruno Orsini.
“Usei muito pouca coisa de computador. Priorizei fazer igual antigamente. Não curto Ctrl+C, Ctrl+V. Gosto de deixar a coisa fluir; é a forma como eu me divirto mais, e a arte também é um pouco de diversão.”
O processo foi também um resgate pessoal. O cantor fala sobre o quanto a prática de gravação no passado exigia ensaio, presença e entrega, valores que ele quis recuperar. “A fita cassete exigia que você praticasse o que estava gravando. A gente ensaiava mais, se preparava melhor. Hoje é tudo rápido, você apaga, afina, grava de novo. Acho que essa facilidade muda o perfil do músico,” disse.
A sonoridade do novo disco reflete essa escolha. O álbum, que tem 12 faixas no total, serve como um diálogo entre o analógico e o contemporâneo, entre o calor humano das cordas e o frescor de timbres setentistas.
Um artista múltiplo
Em “Canções do Velho Mundo”, TeagoOliveira assina não apenas as letras e os vocais, mas também arranjos e produção. “Estou bastante seguro desse disco. Confio nessas músicas e acho que cheguei em outro lugar. Hoje estou operando em um nível que me agrada mais”, afirma.
Depois de anos à frente da Maglore, banda com cinco álbuns lançados e uma trajetória sólida no indie brasileiro, ele encontrou no trabalho solo um espaço de expansão.
“Eu gosto muito de produzir discos. Montei meu estúdio, produzo outros artistas. Estou me descobrindo de outras formas musicalmente. É algo que eu sempre quis fazer, mas faltava maturidade e tempo de vida.”
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Vale lembrar, inclusive, que Teago já cedeu suas composições para alguns medalhões da nossa música. Em 2019, no álbum “A Pele Do Futuro Ao Vivo”, Gal Costa gravou a canção “Motor” (que também ganhou regravação de Pitty). Em 2018 foi Erasmo Carlos quem gravou uma composição de Teago, “Não Existe Saudade No Cosmos”, que virou single do álbum “Amor é Isso”.
Referências
As referências de Teago Oliveira seguem amplas: da Tropicália e do rock dos anos 1970 ao indie e folk internacional. “Meu norte vem muito dos anos 70 — da Tropicália, do rock, do grunge. E também de artistas contemporâneos como Wilco, Adrianne Lenker, Big Thief e Dr. Dog, que é a minha banda americana preferida.”
Um dos membros da Dr. Dog, inclusive, tá em “Canções do Velho Mundo”. O cantor e baterista Eric Slick faz dueto com Teago em “Sapceships”. Assim como Silvia Machete aparece em “Vida de Casal”, cantando em português e espanhol.

Fotos: Duane Carvalho
A Bahia, no entanto, segue fundamental em sua construção artística. Mesmo morando há mais de uma década em São Paulo, Teago carrega o estado natal como se fosse timbre. A faixa “Sou de Salvador” é um reflexo direto dessa presença que nunca o abandona e já fez outras visitas em canções como “Longe da Bahia”, do “Boa Sorte”, e “Avenida Sete”, com a Maglore.
“Todo disco meu tem que ter uma música mais baiana. Não sei por quê, é involuntário. Acho que quando eu fizer uma coletânea vai dar pra ter um bloco só de músicas puxadas pra Bahia’. Eu só sou artista porque sou baiano. Salvador me deu tudo: as referências, os professores, os ídolos. Gilberto Gil é o meu maior ídolo musical. Tudo que eu faço vem desse chão.”
Mesmo longe, ele não se descola da origem. “Eu tô perdendo o sotaque morando em São Paulo, mas sempre serei visto como um músico baiano. É difícil largar a terrinha. Um dia talvez eu volte a morar em Salvador, acho que tá mais perto do que longe.”
O velho mundo de Teago Oliveira
O novo disco de Teago Oliveira já chegou completo aos serviços de streaming, acompanhado do clipe de “Eu Nasci Pra Você”, gravado em cenários icônicos de São Paulo, como a escadaria do Bixiga e o metrô, em contraste com imagens de natureza. Antes disso, ele havia lançado os singles “Não Se Demore” e “Vida de Bicho”, escolhidos por representarem “os dois extremos do projeto”.
Mais do que uma coleção de faixas, “Canções do Velho Mundo” é o gesto de um artista que insiste em ver o que muita gente já deixou de enxergar. Ao revisitar formas antigas de tocar, gravar e sentir, Teago Oliveira faz do seu novo álbum um lembrete de que ainda é possível encontrar beleza e humanidade em meio ao caos. Com sua música, Teago mais uma vez, nos convida a desacelerar e ouvir o mundo com atenção e delicadeza.
Fonte: portalpopline