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Ciência & Saúde

Fotógrafo Lalo de Almeida retrata a devastação da Amazônia: um olhar impactante e urgente

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Lalo de Almeida trabalha há três décadas como fotojornalista na Folha de S.Paulo. Desde 2009, ele já realizou várias expedições para fazer reportagens no meio da Amazônia, e tem acompanhado de camarote a devastação do meio ambiente e o avanço das mudanças climáticas.

Hoje, ele também é um explorador da National Geographic: Lalo recebe uma bolsa da empresa para conduzir reportagens sobre a relação dos povos da floresta com a água.

A Bacia Amazônica é a maior bacia hidrográfica do mundo, e os povos que vivem na região dependem dos rios e lagos para tudo: plantar, pescar, se locomover, tomar banho. “A vida dessas populações na floresta é totalmente conectada aos ciclos naturais”, diz Lalo.

Em comemoração ao Dia Mundial da Água, que acontece em 22 de março, a Super conversou com o fotógrafo para entender como é fazer reportagens no meio da maior floresta do mundo, como a exploração sem freios da Amazônia contribui para o aquecimento global – e como os povos da floresta acabam se tornando os maiores afetados.

Devastação atemporal

Lalo começou a fotografar a Amazônia em 2009, quando foi enviado pela Folha para fazer a cobertura das audiências públicas para a construção da hidrelétrica de Belo Monte na bacia do rio Xingu, perto do município de Altamira (PA).

“Eu percebi que aquela obra teria um impacto gigantesco na região, assim como foi o impacto da Transamazônica [rodovia faraônica inacabada, construída durante o regime militar].” Por causa disso, o fotógrafo decidiu acompanhar os impactos desse modelo de ocupação da floresta de perto.

Em 2013, com financiamento do Prêmio Marc Ferrez do Ministério da Cultura, Lalo morou 4 meses em Altamira para documentar os impactos da obra. O trabalho na Amazônia levou Lalo a cobrir garimpo em terras indígenas, a construção das hidrelétricas do rio Madeira e de trechos da Transamazônica.

Tudo isso virou um projeto chamado “Distopia Amazônica“, com fotos que documentam os impactos ambientais e sociais de atividades legais e ilegais empreendidas no meio da floresta. Lalo escolheu fazer os registros em preto e branco, porque, segundo ele, a devastação da Amazônia é atemporal.

“Quando eu comecei a olhar aquelas fotos, pareciam imagens feitas 50 anos atrás. O que eu estava vendo era a repetição de um ciclo que vinha acontecendo na região desde que os europeus chegaram na região há 500 anos.”

Como fotografar a floresta?

O trabalho na Amazônia é complexo e caro. A logística de chegar nos lugares isolados é a principal dificuldade do fotojornalista. Ele carrega consigo mosquiteiro, barraca, saco de dormir (a floresta é muito fria de madrugada, por causa da umidade), pílulas de cloro para purificar a água, kit de primeiro socorros e comunicador via satélite para emergências. São ferramentas de trabalho tão importantes quanto as câmeras.

Lalo leva duas câmeras digitais, para o caso de que uma dê problema no meio da floresta, com poucas lentes. “Eu viajo leve”, diz. Nos últimos anos, ele começou a usar drones para chegar em locais de difícil (ou perigoso) acesso. “Quando você faz uma foto de cima, você dá escala, você tem noção do tamanho.” Antes do drone, ele precisava alugar um avião sem portas para tirar as fotos. Era mais caro e mais complicado: “você fotografa, mas é o piloto que escolhe seu ângulo”.

O alto custo das viagens limita a quantidade de reportagens que podem ser feitas na região. O jornalismo na floresta também é perigoso: o Brasil tem um histórico longo e triste de assassinatos de ativistas ambientais e repórteres na região. E boa parte do que o Lalo cobre são atividades ilegais, como invasão de terra, garimpo, grilagem, desmatamento.

Como lidar? “A gente procura fazer as histórias do melhor jeito possível, mas sempre pensando que o maior objetivo é voltar para casa.”

Em junho de 2023, Lalo voltou para São Paulo, onde mora, num avião-UTI. Ele estava trabalhando em uma história sobre exploração de petróleo no Oiapoque, no Amapá. Quando ele chegou à cidade de menos de 30 mil habitantes depois de 10 horas passando mal no carro, foi direto para o hospital. Lá, descobriu que estava com meningite meningocócica, uma doença infecciosa perigosíssima que pode levar à morte em menos de 24 horas.

Ele conseguiu voltar para São Paulo a tempo e sobreviver à infecção, mas o choque foi grande. “Imagina se eu estivesse numa comunidade a dois dias de barco de uma cidade pequena, como eu estou careca de ir?.”

Crise climática de perto

A partir de 2023, Lalo percebeu que a grande ameaça à floresta e às pessoas que vivem nela atualmente é a crise do clima, e que ela não está desconectada das outras ameaças que ele vinha fotografando. “Esse modelo de ocupação predatória da Amazônia é o exemplo clássico do modelo econômico, do modo de pensar da sociedade que causou as mudanças climáticas.”

No mesmo ano, quando Lalo chegou na comunidade indígena de Porto Praia, ele não conseguia chegar ao mesmo local que tinha visitado em 2022 por causa de uma seca no rio. “Largamos a canoa e fomos numa trilha pela floresta, uns 5 ou 6 km, mais ou menos uma hora [de caminhada].” Quando os jornalistas saíram da floresta, eles se depararam com um grande deserto de areia.

“O rio tinha desaparecido. A comunidade estava olhando para um grande vazio”, de acordo com o fotojornalista. Esse era o mesmo local que, em 2022, ele tinha percebido que “a vida da comunidade se dá ao longo do rio”. As crianças vão para a escola de barco, a ‘ambulancha’ leva as pessoas doentes para o hospital, os alimentos circulam de uma comunidade a outra. Sem rio, como dá para ter vida?

Sua foto, que mostra um braço do rio Solimões com 1,5 km de largura completamente seco, ganhou o prêmio World Press Photo.

“Essas são as populações menos responsáveis pelas mudanças climáticas e, ao mesmo tempo, as mais impactadas.” A vida dos povos da floresta é pautada de acordo com os ciclos naturais da floresta, e esses ciclos estão sendo constantemente interrompidos e quebrados por eventos extremos em decorrência da crise climática.

O trabalho do fotógrafo com a National Geographic trata de mostrar a relação entre humanos e floresta e como os eventos climáticos extremos impactam a vida deles. Tanto a ausência quanto o excesso de água, que ele pretende fotografar mais, podem ser questão de vida ou morte. Durante a seca, Lalo conta que, mesmo no lugar mais cheio de água do mundo, “as pessoas precisaram ser abastecidas com garrafões de água doados pela Defesa Civil”.

“A água é onde tudo acontece, é nos rios que a vida circula. Quando isso muda completamente, a vida deles [povos da floresta] fica paralisada.” São séculos de conhecimento tradicional que não condizem com a rápida transformação da natureza frente às mudanças climáticas. Lalo percebe uma “sensação de espanto” geral entre as comunidades tradicionais da floresta.

Agora, no projeto financiado pela NatGeo, Lalo pretende mostrar, além do impacto das secas, os danos que as cheias causam nas comunidades ribeirinhas. As mudanças climáticas não causam só secas, mas toda sorte de eventos climáticos extremos que bagunçam a natureza. A Amazônia e seus habitantes estão pagando o preço do caos climático que um modelo de exploração focado em lucro máximo plantou.

Fonte: abril

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