Com slogans sedutores que prometem refrescância e sabor sem calorias, os refrigerantes diet conquistaram um lugar cativo no paladar do público. No entanto, por trás da doçura aparentemente inofensiva, há um mundo de debates sobre os potenciais perigos à saúde, sendo que cada vez mais pesquisas associam o consumo dessas bebidas a problemas no coração, desenvolvimento de gordura no fígado, diabetes, doenças autoimunes e câncer.
Estudo publicado em março deste ano na revista da Associação Americana do Coração destacou, pela primeira vez, uma possível conexão entre o consumo dessas bebidas e o desenvolvimento de fibrilação atrial, um tipo de arritmia ligada à formação de coágulos no coração.
Os pesquisadores analisaram os dados de saúde de mais de 200 mil pessoas e encontraram um risco 20% maior entre aquelas que consumiam mais de dois litros de refrigerantes diet semanalmente. No entanto, segundo o cardiologista Leandro Zimerman, o estudo não estabelece uma relação direta de causa e efeito entre o consumo de refrigerantes dietéticos e a fibrilação atrial.
“Essa associação é complexa porque, geralmente, quem toma essa quantidade de refrigerante diet têm maior massa corporal, ou seja, são pessoas com algum grau de obesidade, ou que ainda apresentam diabetes, que são fatores de risco para a condição”, explica Zimerman, que é especialista em arritmias cardíacas pela Duke University e membro da Sociedade Brasileira de Cardiologia.
Além disso, de acordo com o cardiologista, o estudo é meramente observacional e não considera outras variáveis, como o padrão alimentar dos participantes, o consumo de outras bebidas e até mesmo fatores genéticos, que podem influenciar nos resultados. “O que os estudos já conseguiram provar é uma correlação entre o consumo excessivo de álcool e alterações no ritmo cardíaco”, diz.
Apesar das incertezas, Zimerman afirma que, especialmente pessoas com fatores de risco cardiovascular, devem reduzir o consumo de refrigerantes diet. “Embora não tenhamos uma prova definitiva, é importante considerar outras opções de bebidas, especialmente diante das preocupações levantadas pela OMS (Organização Mundial de Saúde) sobre os refrigerantes dietéticos”, enfatiza.
Classificação da OMS e o risco de câncer
Em julho de 2023, o aspartame, adoçante sintético que é amplamente utilizado pelas indústrias de refrigerante, foi classificado como uma substância “possivelmente cancerígena” pela Iarc (Agência Internacional de Pesquisa em Câncer), entidade da OMS dedicada à investigação de câncer.
Essa classificação foi baseada na análise de 1.300 estudos, cujas evidências são limitadas e não conseguiram estabelecer uma relação causal definitiva. Em um comunicado, a epidemiologista Mary Schubauer-Berigan, chefe do Programa de Monografias do Iarc, relatou a necessidade de mais pesquisas para refinar a compreensão sobre o risco carcinogênico do aspartame.
Apesar do alerta, a OMS manteve a recomendação diária de consumo de aspartame entre 0 e 40 mg por quilograma de peso corporal, o que implica que um adulto de 70 kg teria que ingerir entre 9 a 14 latas de refrigerante diet por dia (contendo, em média, de 200 a 300 mg de aspartame cada) para ultrapassar a ingestão diária aceitável, desde que não haja consumo adicional de outras fontes da substância.
A oncologista Maria Del Pilar Estevez Diz ressalta que o câncer tem causa multifatorial, sendo o estilo de vida um elemento crucial nesse processo. Essa interligação, segundo a oncologista, é especialmente evidente no contexto atual em que o consumo de alimentos e bebidas industrializadas é onipresente na sociedade. “A classificação trouxe um alerta sobre o consumo de produtos não naturais e a necessidade de criar hábitos mais saudáveis”, reflete ela, que atua como diretora de corpo clínico do Icesp (Instituto do Câncer do Estado de São Paulo).
Refrigerante diet e o risco de diabetes
Muitas pessoas acreditam erroneamente que os refrigerantes diet são uma opção mais saudável devido à sua menor quantidade de açúcar. No entanto, pesquisa publicada em setembro de 2023, que analisou dados de mais de 100 mil pessoas, revelou um aumento no risco de desenvolvimento de diabetes tipo 2 em quem consumia uma quantidade maior de adoçantes.
De acordo com o endocrinologista Wellington Santana da Silva Junior, apesar de haver limitações, estudos acendem alerta, especialmente para aquelas pessoas que consomem produtos dietéticos sem indicação médica.
“Para pessoas com diabetes, a substituição de alimentos adoçados com açúcar por opções adoçadas artificialmente contribui significativamente para o controle glicêmico. É importante ressaltar que as escolhas alimentares da população em geral devem ser baseadas preferencialmente em alimentos in natura, minimamente processados e livres de aditivos”, enfatiza Silva Junior, que atua como professor da UFMA (Universidade Federal do Maranhão) e é diretor do Departamento de Diabetes da SBEM (Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia).
Ganho de peso e distúrbios alimentares
Estudos indicam que adoçantes artificiais podem atuar sobre o sistema nervoso central, interferindo na sensação de recompensa e controle alimentar. Isso ocorre porque, ao consumir um refrigerante comum, o sabor doce está ligado diretamente ao valor calórico do açúcar presente na bebida. Assim, o corpo recebe não apenas o sabor doce, mas também a energia proveniente do açúcar. Em contrapartida, nos refrigerantes dietéticos, o adoçante artificial proporciona apenas a palatabilidade sem fornecer calorias significativas.
“Essa discrepância pode ser entendida pelo cérebro como uma ‘falta’ de energia, o que, em hipótese, leva a um desejo aumentado por alimentos calóricos, resultando em um aumento na ingestão dos mesmos e, consequentemente, no ganho de peso”, explica o nutricionista Jeferson Ferraz Goularte, que é doutor em ciências biológicas e fisiologia pela UFRGS (Universidade Federal do Rio Grande do Sul).
Além disso, pesquisas também apontam que o consumo de refrigerante diet está relacionado com alguns distúrbios alimentares, principalmente por pessoas que tentam fazer controle de calorias, aumentando o risco de episódios de bulimia, por exemplo. Por outro lado, é importante observar que muitos desses estudos são de curta duração e apenas observacionais, o que significa que apenas mostram uma associação e não uma relação de causa e efeito definitiva. “O ideal é sempre limitar o consumo ao mínimo possível, principalmente porque ela é uma bebida sem nenhum valor nutricional”, destaca Goularte.
Dicas para limitar ou abandonar o refri diet
Para ajudá-lo a abandonar ou reduzir o hábito de consumir o líquido efervescente sem açúcar, que em nada contribui para sua saúde, reunimos as seguintes dicas dos especialistas:
Substitua gradualmente: estabeleça metas de redução do consumo. Se antes você consumia todos os dias, por exemplo, comprometa-se a ingerir apenas aos finais de semana
Identifique os comportamentos: identificar o momento do dia em que você sente mais vontade de consumir o refri diet pode ser um primeiro passo para implementar mudanças positivas em sua rotina. Se perceber que geralmente sente vontade durante o almoço, pode ser útil refletir sobre o que acontece nesse momento. Talvez você associe a bebida com uma refeição específica, como uma sensação de refrescância para acompanhar a comida, ou pode ser uma resposta a algum aspecto do seu ambiente durante o almoço.
Faça trocas saudáveis: experimente outras bebidas que possam satisfazer seu desejo por algo doce, como chá verde gelado, kombucha, água de coco, suco natural ou água gaseificada com frutas. “Adicionar fatias de frutas como abacaxi e laranja e folhas de hortelã à água gaseificada é uma maneira de satisfazer o paladar porque gera uma memória de que você está tomando o refrigerante”, conta Goularte.
Evite o acesso fácil: mantenha o refrigerante dietético fora de casa ou em locais menos acessíveis para reduzir a tentação de consumi-lo regularmente.
Fonte: uol