As tensões no Oriente Médio têm provocado manifestações de ódio contra israel, líderes que esbravejam, países preparados para conflitos regionais, troca de insultos, ameaças. Os últimos a serem lembrados neste momento são os cerca de 115 reféns que permanecem sob controle do Hamas. E cujo retorno seria determinante para o fim desta guerra.
E se, assim como vítimas civis dos dois lados, os reféns estão esquecidos, os parentes daqueles que morreram estão ainda mais. Em silêncio, depois que os holofotes da mídia deixaram de se direcionar aos enterros, às declarações de choque e ao instante da perda, eles procuram refazer suas vidas, sem no entanto conseguirem preencher o vazio.
É o caso de Mary Shohat, irmã de Michel Nisenbaum, brasileiro de 59 anos assassinado pelo Hamas no ataque do dia 7 de outubro a Israel. O Exército de Israel recuperou o corpo dele no dia 24 de maio, sete meses depois. Neste período, a família acreditava que Michel era mantido como refém do grupo terrorista.
“Parte da minha família recebeu a notícia com choque, outra parte já esperava”, conta Mary a “Eu fazia parte daqueles que já esperavam. No fundo, eu sabia dentro de mim que ele tinha morrido, não podia falar isso para não abalar minha mãe, minhas sobrinhas e toda a família.”
Mary e seus parentes têm acompanhado as notícias sobre a guerra. Mas o principal foco deles está longe do que a maioria da imprensa tem ressaltado: a libertação dos reféns.
“Será um alento para nós vermos os reféns libertados e de volta para casa, algo que não ocorreu com Michel.”
Nascido em Niterói (RJ), em 1964, Michel foi morar em Israel em 1976. Quem o trouxe foi Mary, nascida em Porto Alegre (RS), sete anos mais velha. Ela havia imigrado um ano antes. A mãe deles, Sulmira, de 87 anos, também vive no país. Eles são filhos de pais diferentes.
“Éramos nós dois”, conta a irmã. “O meu pai faleceu quando eu tinha 1 ano, e o pai do Michel faleceu vários anos atrás no Brasil.”
Tentativa de retomar a vida
À família, agora, resta tentar retomar a vida. “Estamos tentando seguir em frente”, conta ela. “A filha do Michel, Hen [Mahlouf Nisenbaum], está para dar à luz, mas a saudade e a dor são grandes.”
A própria Mary tem buscado atividades para não sucumbir à tristeza. Uma de suas atribuições é manter o ânimo da mãe, que está consciente de tudo o que houve.
“Estou com ela todos os dias”, afirma Mary. “Às vezes ela está animada e de repente cai no choro. Diz que teve dois filhos. Eu e Michel. Agora só tem a mim.”
Outra atividade de Mary é ajudar idosos em sua cidade, Be’er Sheva. Uma senhora espanhola, que não fala hebraico, tem recebido atenção da irmã de Michel pelo menos duas vezes por semana.
“Ficamos conversando, faço esse trabalho para ajudá-la, ela não tem ninguém com quem conversar.”
Ao falar sobre o , Luiz Inácio Lula da Silva, ela não esconde seu ressentimento. Refere-se com frieza ao presidente. Mary conta que, no dia do enterro de Michel, recebeu uma mensagem dele.
“O Lula dizia que sentia muito por nossa perda e veio com todo aquele blá-blá-blá”, diz a brasileira. “Tudo é política.”
A ideia a respeito desse interesse político a levou a nem se sentir chocada pelo fato de o vice-presidente do Brasil, Geraldo Alckmin, ter participado de um evento em que ficou muito perto do líder do Hamas, Ismail Haniyeh.
Poucas horas depois, Haniyeh foi morto no local em que estava hospedado em Teerã, em um assassinato atribuído a Israel, que não assumiu a autoria.
“Nesta situação [Alckmin próximo de Haniyeh], não me surpreendo, digo o mesmo: a política fala mais alto.”
Fonte: revistaoeste