Estima-se que o autismo afete pelo menos uma em cada 100 pessoas em todo o mundo, sendo caracterizado por alterações no comportamento social, na comunicação e em padrões de interesse ou atividades repetitivas.
Embora suas causas ainda não sejam totalmente compreendidas, acredita-se que uma combinação de fatores genéticos e ambientais contribua para o seu desenvolvimento, incluindo exposições pré-natais a infecções, toxinas ou condições maternas, como a diabetes.
Nos últimos anos, a ciência tem aprofundado o estudo da relação entre o intestino e o cérebro, revelando que os microrganismos presentes no intestino — conhecidos coletivamente como microbioma — podem exercer influência significativa no desenvolvimento neurológico.
Esse ecossistema intestinal afeta desde a digestão e a produção de vitaminas até a regulação de neurotransmissores relacionados ao humor e ao comportamento.
Essa conexão entre intestino e cérebro tem despertado atenção especial na pesquisa sobre o Transtorno do Espectro Autista (TEA), com o objetivo de compreender melhor suas causas e abrir caminhos para novas estratégias de diagnóstico e tratamento.
O microbioma intestinal — composto por bactérias, vírus, fungos, arqueias e outros microrganismos — desempenha um papel central na digestão, síntese de vitaminas e produção de neurotransmissores, como serotonina e dopamina, que influenciam o humor e o comportamento.
Estudos recentes sugerem que alterações nesse ecossistema podem estar associadas a sintomas do autismo, especialmente à inflamação neural e a distúrbios gastrointestinais, comuns em crianças com TEA.
Nessas crianças, observa-se uma diversidade menor de microrganismos saudáveis e uma proporção maior de espécies potencialmente nocivas.
Um estudo realizado pela Universidade Chinesa de Hong Kong analisou o microbioma de 1.627 crianças entre 1 e 13 anos, utilizando sequenciamento metagenômico e técnicas de inteligência artificial.
A pesquisa identificou mudanças em 14 arqueias, 51 bactérias, sete fungos, 18 vírus, 27 genes microbianos e 12 vias metabólicas em crianças com TEA, comparadas a crianças neurotípicas.
Com base nesses dados, foi desenvolvido um modelo capaz de identificar crianças com autismo com 82% de precisão, indicando que esses microrganismos podem servir como biomarcadores potenciais para diagnóstico precoce.
Simultaneamente, projetos europeus como GEMMA e CANDY investigam a relação entre o microbioma intestinal e o desenvolvimento neurológico em crianças consideradas de risco.
O estudo inclui 500 crianças com idades entre zero e 36 meses que têm irmãos mais velhos diagnosticados com autismo.
Acredita-se que a probabilidade de uma criança nascer com autismo seja até 10 vezes maior quando já existe um irmão no espectro autista.
O objetivo é identificar precocemente alterações no ecossistema intestinal e propor intervenções com probióticos e prebióticos para restaurar o equilíbrio microbiano, melhorar a integridade da parede intestinal e, possivelmente, influenciar comportamentos associados ao TEA.
Especialistas, no entanto, ressaltam que ainda não há uma relação comprovada de causa e efeito entre alterações no microbioma e o autismo.
É possível que diferenças nos microrganismos intestinais sejam resultado de fatores como dieta restrita ou seletividade alimentar, comuns em crianças com TEA, e não necessariamente a origem do transtorno.
Por isso, mais estudos multicêntricos e de diferentes populações são necessários antes que essas descobertas possam ser incorporadas à prática clínica.
O avanço dessa linha de pesquisa, porém, abre caminho para uma compreensão mais ampla do TEA, sugerindo que intervenções baseadas no microbioma intestinal possam, futuramente, complementar o diagnóstico e o tratamento, oferecendo esperança de detecção precoce e abordagens terapêuticas mais personalizadas.
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Fonte: curapelanatureza






