Apesar da queda no desemprego, o número de famílias brasileiras endividadas segue em alta e bate recordes. A realidade é agravada por um cenário de alta inadimplência que afeta tanto a economia do país quanto a vida financeira dos consumidores. Segundo pesquisa realizada pela Confederação Nacional de Dirigentes Lojistas (CNDL) e pelo Serviço de Proteção ao Crédito (SPC Brasil), em parceria com a Offerwise Pesquisas, os principais motivos que levam os brasileiros a atrasar pagamentos são os imprevistos, como problemas de saúde, morte, manutenção de casa ou carro (19%), e a falta de controle sobre o orçamento (17%).
Outros fatores como queda de renda (15%) e o aumento dos preços (14%) também foram citados pelos inadimplentes. As dívidas mais recorrentes estão relacionadas ao cartão de crédito (23% entre os negativados), empréstimos em bancos (16%), crediário (12%), cheque especial (12%) e contas de água e luz (9%).
De acordo com o presidente da CNDL, José César da Costa, a questão da inadimplência tem sido alvo de programas de renegociação por parte do governo, mas os efeitos ainda são limitados. “Além da questão dos juros altos, temos um cenário de consumo exacerbado, muitas vezes incentivado pelas redes sociais. O consumidor compra no impulso e depois não consegue pagar”, explica.
Esse comportamento aparece de forma clara na pesquisa. Entre os inadimplentes, 43% disseram ter aproveitado promoções sem avaliar se o gasto caberia no orçamento, 23% compraram algo que desejavam muito sem esperar ter o dinheiro e 19% estavam emocionalmente abalados e gastaram como forma de compensação. No geral, 47% admitiram ter feito compras sabendo que o pagamento seria difícil, e 39% não avaliaram sua capacidade de pagamento antes de comprar.
Apesar da inadimplência, os brasileiros ainda priorizam o pagamento de contas consideradas essenciais, como internet (73%), água e luz (68%) e telefone (65%). Isso reflete, segundo José César da Costa, o papel fundamental que essas ferramentas desempenham na vida moderna, tanto no aspecto social quanto profissional.
Entretanto, 77% dos inadimplentes afirmam que, se quitassem todas as dívidas em atraso, o pagamento das despesas básicas ficaria comprometido — totalmente para 40% e parcialmente para 37%. As dívidas chegam, em média, a R$ 2.444, sendo que 21% devem entre R$ 2.500 e R$ 7.500, enquanto 14% devem entre R$ 500 e R$ 1.000.
Mais da metade dos entrevistados (84%) acredita que conseguirá quitar ao menos parte das dívidas nos próximos três meses. Para isso, 33% farão cortes no orçamento, 27% buscarão parcelamentos com os credores, 25% pretendem fazer bicos e 23% utilizarão bônus, férias ou comissões. Os principais cortes devem ser em lazer (50%), alimentação fora de casa (49%), roupas (43%), produtos de beleza (34%) e salão de beleza (30%).
As consequências da inadimplência vão além do bolso. Para 51% dos entrevistados, o pior impacto é a negativação do nome, seguido de pagamento de juros altos (35%) e perda de crédito no mercado (31%). O impacto emocional também é relevante: 33% sentem-se constrangidos com as cobranças, 30% chateados, 27% angustiados, 26% tristes e 24% pressionados. A maioria (53%) avalia que as cobranças foram feitas de forma respeitosa, mas há relatos de abordagens impessoais (27%), ameaçadoras (15%) e agressivas (14%).
A impulsividade também aparece como um traço marcante nos comportamentos de consumo. Cerca de 53% admitem gastar mais do que o orçamento permite, 48% compram para se sentir melhor, 42% reconhecem que o prazer da compra supera o controle financeiro e 39% afirmam que redes sociais influenciam diretamente seus gastos. Além disso, 45% sentem-se pressionados a gastar mais na presença de familiares e amigos, e 43% gastam além do que podem para agradar parceiros e filhos.
Segundo Roque Pellizzaro Júnior, presidente do SPC Brasil, a pesquisa revela a urgência de promover maior conscientização financeira. “A impulsividade e o descontrole financeiro desempenham papel fundamental na inadimplência. É necessário desenvolver estratégias de educação financeira para evitar o comprometimento do orçamento com dívidas que afetam não apenas a estabilidade econômica, mas também os relacionamentos e o bem-estar emocional das famílias”, conclui.
A pesquisa foi realizada entre os dias 22 e 30 de janeiro de 2025, com 600 consumidores inadimplentes de todas as capitais do país, com contas em atraso há mais de três meses. A margem de erro é de 4 pontos percentuais e o nível de confiança é de 95%.
Fonte: cenariomt