Apesar de serem frequentemente confundidas, a intolerância à lactose e a alergia à proteína do leite são condições completamente diferentes. Para esclarecer essas diferenças e ajudar você a entender qual pode ser o seu problema, o Primeira Página conversou com a nutricionista Nádia Lauro.
Na reportagem, você vai conhecer os sintomas de cada condição, formas de diagnóstico, os riscos de negligenciar a intolerância, cuidados com certos produtos, opções de queijos e outros alimentos sem lactose, alternativas para obter cálcio e o papel da enzima lactase na digestão da proteína do leite.
No caso da intolerância, o corpo produz pouca ou nenhuma lactase, enzima responsável por quebrar a lactose (o açúcar natural do leite) – entenda o papel da enzima no final da reportagem. Sem essa digestão, a molécula chega “inteira” ao intestino, provocando desconfortos.
Já a alergia à proteína do leite envolve o sistema imunológico. Nesse caso, não é apenas uma dificuldade de digestão: o organismo reage como se a proteína fosse uma “ameaça”, liberando substâncias que podem causar inflamações e sintomas mais graves. Diferente da intolerância, não há alternativa: é necessário excluir completamente o leite e seus derivados da alimentação.
Sintomas mais comuns
A intolerância pode se manifestar de várias formas, variando de acordo com a quantidade ingerida e o nível de deficiência de lactase. Entre os principais sinais estão:
- Distensão abdominal (inchaço visível da barriga);
- Excesso de gases;
- Diarreia;
- Cólicas e dores abdominais;
- Sensação de queimação ou cólica intestinal.
Já no caso da alergia, os sintomas podem incluir:
- Urticária (irritação da pele que provoca vergões salientes, vermelhos ou da cor da pele, geralmente acompanhados de coceira);
- Inchaço;
- Chiado no peito;
- Náuseas;
- Vômitos;
- Risco de choque anafilático em situações graves.
Diagnóstico e exames
O diagnóstico correto é essencial para diferenciar a intolerância de um alergia. Os exames mais comuns são:
- Teste genético: identifica se a pessoa possui predisposição hereditária à intolerância;
- Teste de tolerância oral à lactose: mede os níveis de glicose no sangue após a ingestão de uma solução com lactose. Se não houver aumento esperado de pelo menos 20 mg/dL, há indícios de intolerância.
Além disso, médicos e nutricionistas podem recomendar diários alimentares e protocolos de exclusão, acompanhados da observação clínica dos sintomas.
Riscos de negligenciar a intolerância
Ignorar a intolerância e continuar consumindo leite e derivados pode trazer consequências sérias a médio e longo prazo.
Segundo a nutricionista Nádia Lauro, o contato repetido com a lactose não digerida machuca o revestimento intestinal, levando a um quadro chamado disbiose intestinal (um desequilíbrio das bactérias que protegem o intestino). Isso pode evoluir para:
- Inflamação crônica;
- Síndrome do intestino irritável (intestino hipersensível a qualquer alimento);
- Doença de Crohn (condição grave, inflamatória e sem cura);
- Maior risco de desenvolver alergias alimentares;
- Comprometimento da saúde cerebral, com sintomas como falhas de memória, dificuldade de concentração e até alterações motoras, devido à ligação entre o intestino e o cérebro.
“Cuidar da intolerância é simples se comparado às complicações que podem surgir quando ela é ignorada. Não vale a pena arriscar”, reforça a nutricionista.
Atenção aos industrializados
Muitos produtos processados contêm lactose “escondida”, o que pode surpreender os intolerantes. Entre os principais vilões estão:
- Pães e bolos industrializados
- Chocolates comuns
- Molhos prontos
- Embutidos
- Whey protein tradicional (concentrado)
Nesses casos, a recomendação é optar por versões isoladas, hidrolisadas ou alternativas não derivadas do leite, como proteína da carne, colágeno ou opções veganas.
A intolerância à lactose é uma das condições digestivas mais comuns da atualidade, mas, quando tratada corretamente, não precisa comprometer a qualidade de vida.
“O segredo está no diagnóstico correto, na escolha consciente dos alimentos e no acompanhamento profissional. Cada organismo reage de um jeito, mas o mais importante é não ignorar os sinais que o corpo dá”, finaliza a nutricionista Nádia Lauro.
Queijos e produtos sem lactose
Uma das maiores dúvidas dos pacientes intolerantes é: ‘Posso comer queijo?’ A resposta da nutricionista é que depende do tipo: queijos frescos, como ricota e minas, ainda apresentam altos níveis de lactose.
Já os maturados, como parmesão, grana padano, provolone e emmental, possuem apenas traços mínimos. Isso acontece porque, no processo de maturação, as bactérias consomem a lactose e produzem ácido lático, deixando o queijo mais ácido e praticamente sem lactose.
No Brasil, o queijo Canastra maturado por mais de 30 dias também entra na lista dos naturalmente livres de lactose.
No entanto, mesmo nesses casos, a especialista recomenda cautela. “A quantidade mínima de lactose pode ser suficiente para irritar o intestino de pacientes mais sensíveis. Sempre oriento que façam uso da enzima lactase ao consumir”, explica.
Já os produtos “zero lactose” encontrados no mercado são, na verdade, alimentos com adição da enzima lactase. Embora sejam bem tolerados por muitas pessoas, não funcionam para todos.
Alternativas e substituições
Quando há sintomas persistentes, o ideal é recorrer a substitutos seguros.
Ao contrário do que muitos acreditam, o leite não é a principal fonte de cálcio. Diversos vegetais superam seu teor quando consumidos regularmente.
Entre eles:
- Leites vegetais: amêndoas, castanhas, aveia, arroz;
- Cremes e iogurtes vegetais: versões feitas de castanhas ou aveia.
Fontes naturais de cálcio:
- Vegetais verde-escuros (couve, brócolis, rúcula);
- Sementes (chia, gergelim, linhaça);
- Oleaginosas (amêndoas, nozes, castanhas);
- Peixes como a sardinha, com alto teor de cálcio nos ossos.
O papel da enzima lactase
O suplemento de lactase pode ser um grande aliado para quem não quer abrir mão de certos alimentos. No entanto, a dose deve ser personalizada.
Existem diferentes concentrações disponíveis no mercado, geralmente entre 4.500 e 10.000 UFC. Segundo a nutricionista Nádia, é preferível começar com doses mais altas para garantir eficácia, ajustando conforme a necessidade.
Outro ponto importante: um comprimido não cobre uma refeição inteira. Se houver consumo repetido de alimentos com lactose em curto intervalo de tempo, pode ser necessário tomar mais de uma cápsula.
Ainda assim, há pacientes para os quais o recurso não funciona, sendo necessário retirar totalmente o leite da dieta.
Fonte: primeirapagina