A relação entre Homo sapiens e Homo neanderthalensis sempre foi motivo de disputa cientĂfica. Durante muito tempo, acreditava-se que os neandertais eram uma espĂ©cie completamente distinta e atĂ© inferior aos sapiens. Agora, graças a uma enxurrada de novas pesquisas, sabemos que esse nĂŁo Ă© o caso.
Os neandertais nĂŁo sĂł tinham hĂĄbitos e tĂ©cnicas semelhantes Ă s nossas, como tambĂ©m mantinham relaçÔes com nossos antepassados â relaçÔes mais do que amistosas. A reprodução entre essas duas espĂ©cies fez com que elas trocassem genes entre si, e agora, uma parcela do seu DNA Ă© um âDNA neandertalâ.
Desde 2010, quando foi montado o primeiro genoma neandertal completo a partir dos ossos de trĂȘs fĂȘmeas de 40 mil anos atrĂĄs, os pesquisadores sabem que compartilhamos DNA com esses indivĂduos. Mas cada pessoa pode ter mais ou menos dessa parcela.
Isso contraria tambĂ©m uma ideia equivocada, mas muito comum, de que os neandertais e os sapiens eram duas espĂ©cies totalmente diferentes. Se assim fosse, nĂŁo poderiam gerar descendentes fĂ©rteis (exemplo: as mulas e burros, que sĂŁo filhos de Ă©guas com jumentos, sĂŁo infĂ©rteis). Agora, ambos sĂŁo entendidos como uma possĂvel subespĂ©cie que possuĂa vĂnculo genĂ©tico suficiente para ter filhos que podiam ter filhos tambĂ©m.
Os povos da Europa, Ăsia, AmĂ©rica e Oceania tĂȘm cerca de 2% de seu DNA formado pela parte neandertal. Para africanos Ă© menos, cerca de 0,5%. Os neandertais jĂĄ viviam na EurĂĄsia, e sĂł começaram a cruzar com sapiens depois que alguns deles migraram para a regiĂŁo. Quando esses hominĂdeos migrantes se dispersaram para o resto do mundo, levaram consigo os resquĂcios neandertais em seus genes.
Uma anålise do laboratório Genera, feita com 200 mil brasileiros, afirma que temos, em média, 2,5% de DNA neandertal em nosso próprio código genético. Eles analisaram 600 mil pontos do genoma dos envolvidos e compararam com o genoma neandertal em busca de pontos em comum.
O serviço faz parte de um painel realizado pelo laboratório; pagando determinado valor, a pessoa tem acesso a essas e outras informaçÔes sobre seu próprio código genético.
Os dados foram retirados de assinantes do serviço que, por consequĂȘncia, tĂȘm maior poder aquisitivo, e mĂ©dia de idade entre 25 e 45 anos. âNo fim, a gente fez uma estimativa baseada na nossa base de dadosâ, afirma Ricardo di Lazzaro, mestre em genĂ©tica e cofundador da Genera. âEntĂŁo nĂŁo foi um estudo para ser necessariamente representativo da população brasileira, e sim, um levantamento com o maior nĂșmero de pessoas.â
Mesmo assim, a Genera tem a maior base de dados genĂŽmicos do paĂs, entĂŁo esses nĂșmeros podem ser um bom indicativo de uma tendĂȘncia nacional.
O DNA neandertal nĂŁo Ă© sĂł um enfeite no seu cĂłdigo genĂ©tico. Ele Ă© responsĂĄvel por algumas caracterĂsticas importantes do seu fenĂłtipo â desde aspectos fĂsicos, como altura e formato do nariz, atĂ© resistĂȘncias naturais a vĂrus, fungos, bactĂ©rias e propensĂŁo a anemia.
Para Di Lazzaro, é importante entender e desmistificar a imagem do neandertal. Muitas vezes retratado como uma figura extremamente primitiva e retrógrada perto do Homo sapiens, ele também tinha sociedades complexas e técnicas comparåveis às de seus parentes.
âAjuda um pouco tambĂ©m a quebrar algumas imagens do ser humano como superior, e mostrar que a gente, como todos as outras espĂ©cies, tivemos diferenças, tivemos subespĂ©cie, tivemos cruzamentos. A gente, como qualquer outro ser vivo, faz parte desse processo biolĂłgico evolucionĂĄrioâ, afirma.
Fonte: abril