Estudos científicos destacam o lúpulo como elemento essencial da cerveja, com compostos promissores na prevenção de doenças e proteção celular
Nos últimos tempos, especialistas têm se debruçado sobre uma das bebidas mais consumidas no planeta: a cerveja. Celebrada anualmente na primeira sexta-feira de agosto, o Dia Internacional da Cerveja reforça sua presença global.
No entanto, o motivo da atenção vai além do paladar. O lúpulo, ingrediente central na construção do sabor amargo e aroma da cerveja, tem demonstrado propriedades funcionais com potencial terapêutico.
“O lúpulo é o verdadeiro protagonista”, diz Glen Fox, professor de ciência cervejeira na Universidade da Califórnia, EUA.
Ensaios laboratoriais, testes com animais e pesquisas clínicas preliminares indicam que o lúpulo possui ações antimicrobianas, anticancerígenas, anti-inflamatórias e pode auxiliar na regulação da glicemia.
O que torna o lúpulo especial
O lúpulo (Humulus lupulus), planta da família do cânhamo, concentra compostos antioxidantes potentes nos cones das flores femininas — parte usada na produção cervejeira.
Essas substâncias atuam no controle da inflamação e na defesa celular contra o estresse oxidativo, compondo aproximadamente 14% da planta.
Entre os compostos mais estudados estão os ácidos amargos e os polifenóis, que também são responsáveis pelo aroma e sabor característicos da bebida.
O xanthohumol, exclusivo do lúpulo, tem despertado atenção devido ao seu potencial antioxidante elevado.
Além de sabor e aroma, o lúpulo também contribuiu historicamente para a conservação da cerveja, sendo amplamente adotado por mestres cervejeiros europeus desde a Idade Média.
Cerveja e lúpulo: uma parceria ancestral
A união entre lúpulo e cerveja remonta ao surgimento das civilizações agrícolas, há mais de 12 mil anos, quando grãos como cevada, trigo e milho passaram a ser cultivados.
Com o tempo, a fermentação espontânea desses grãos revelou o álcool, e a bebida começou a tomar forma.
Buscando mais sabor e conservação, antigas sociedades utilizavam misturas herbais chamadas gruit.
Por volta do século XI, o lúpulo foi incorporado às receitas como conservante natural, estabelecendo-se como elemento essencial na cervejaria.
“Grande parte do que apreciamos na cerveja vem do lúpulo”, diz a médica e pesquisadora Zugravu Corina-Aurelia, da Universidade Carol Davila, na Romênia.
Avanços nas pesquisas
Cerca de um terço do xanthohumol ingerido é absorvido pelo organismo, sugerindo boa biodisponibilidade, segundo estudos recentes.
Testes em animais revelaram efeitos promissores: redução nos níveis de açúcar no sangue, controle de triglicérides, prevenção da obesidade, proteção contra a oxidação do colesterol LDL e até ação contra células tumorais.
O xanthohumol também está sendo estudado em doenças inflamatórias intestinais, como a de Crohn, por circular pelo trato gastrointestinal antes da eliminação.
Um experimento com humanos usando doses elevadas por oito semanas demonstrou segurança, e os dados clínicos mais recentes estão em fase de análise.
Desafios de acesso e aplicação
Apesar dos benefícios potenciais, a maior parte do lúpulo produzido globalmente vai para a fabricação de cerveja, o que reduz sua disponibilidade para uso farmacêutico.
Além disso, as concentrações do composto ativo são muito baixas nas cervejas: variedades artesanais mais intensas oferecem apenas 4 a 5 mg de xanthohumol por litro — muito abaixo das doses usadas nas pesquisas.
Como aumentar os efeitos positivos
Pesquisadores buscam desenvolver cultivares com maior teor de polifenóis e técnicas de produção que preservem mais desses compostos na bebida final.
Isso poderá levar a versões mais nutritivas, especialmente entre cervejas com baixo ou zero teor alcoólico.
No entanto, Corina-Aurelia lembra que o álcool, embora aumente a absorção dos antioxidantes, traz riscos sérios à saúde se consumido em excesso, incluindo doenças cardíacas, hepáticas e câncer. Moderação é essencial.
Consumir com responsabilidade
Tentar obter os benefícios do lúpulo exclusivamente via consumo de cerveja não é eficaz nem seguro, devido à baixa concentração dos compostos e à presença de álcool.
Fox observa que até as versões sem álcool são alternativas mais saudáveis. Corina-Aurelia reforça que o consumo eventual ou de bebidas com baixo teor alcoólico é a melhor opção.
“É a dose que faz o veneno”, compara a pesquisadora, defendendo equilíbrio semelhante ao de açúcar e gorduras. Ela também destaca que, ao contrário do vinho, as cervejas sem álcool modernas ainda preservam bom sabor.
O futuro do lúpulo
O interesse pelo lúpulo como agente terapêutico deve crescer, com novas pesquisas focadas em sua aplicação no tratamento de doenças cardiovasculares, metabólicas, digestivas e até câncer.
O objetivo é encontrar formas eficazes e seguras de explorar todo o potencial desta planta milenar.
Enquanto isso, quem aprecia cerveja pode brindar o Dia Internacional da Cerveja com consciência — afinal, além de sabor, a bebida esconde ingredientes que merecem atenção.
Fonte: National Geographic Brasil.
Fonte: cenariomt