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Ciência & Saúde

Ratinhos de uniforme: solução inovadora contra tráfico de animais

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Crimes contra a vida selvagem formam um mercado enorme e bilionário, semelhante ao do tráfico de drogas e de armas. Diversas espécies são vítimas – e alguns exemplos famosos incluem o marfim de elefantes, chifres de rinocerontes e peles de tigres. O problema, no entanto, é ainda maior e pode envolver desde tartarugas marinhas até madeira de árvores exóticas.  

Grupos criminosos matam animais em busca de grandes lucros no mercado negro, um ato conhecido como caça furtiva. Em 1973, dezenas de países assinaram a Convenção sobre o Comércio Internacional das Espécies da Fauna e da Flora Silvestre Ameaçadas de Extinção (CITES), visando regular o comércio internacional de espécies ameaçadas para protegê-las da extinção. Mesmo assim, o contrabando ainda é um problema constante. 

Mas há luz no fim do túnel: os ratos. Esses animais improváveis estão sendo treinados por cientistas para farejar chifres de rinoceronte, escamas de pangolim, presas de elefante, madeira negra africana e vários outros materiais transportados ilegalmente.

Usar animais para identificar tráfico não é algo novo. Há muito tempo, cães são utilizados em aeroportos para sentir o cheiro de explosivos, drogas ilegais, dinheiro, sangue e produtos eletrônicos, como telefones celulares ilícitos, por exemplo. Eles também trabalham no ramo da do tráfico selvagem.

O problema é que os caçadores furtivos e traficantes estão cada vez mais criativos: pintam marfim de elefantes de preto, envolvem os materiais contrabandeados em chocolate, misturam escamas de pangolim em caixas com castanhas, criam compartimentos falsos em seus containers ou escondem materiais em café. O item ilegal acaba misturado com materiais de cheiros muito fortes, com o objetivo de confundir os cães. 

É aí que entram os ratos. A espécie escolhida para o trabalho são os ratos-gigante-africano (Cricetomys ansorgei), os maiores no mundo das ratazanas, podendo chegar aos seus 90 cm do nariz à cauda – bem maior que um cão pincher ou um yorkshire. Estes animais são naturais da África sub-Saariana e possuem um currículo excepcional, com as qualidades necessárias para o trabalho: um olfato excelente e facilidade de aprender. 

Essa mesma espécie ficou famosa em 2013, quando foi treinada para identificar minas terrestres, já que conseguia sentir o cheiro de TNT. Outras experiências prévias incluem a detecção de tuberculose e a busca por sobreviventes de terremotos. Agora, o mesmo nariz apurado desses animais pode ter uma nova função, graças a uma ONG africana chamada APOPO que cria e treina os bichos.

Publicado no Frontiers in Conservation Science, um novo estudo usou 11 ratos – uniformizados, claro, pois são profissionais – para buscar elementos que viriam a ser traficados. 

A equipe treinou os roedores a inserir o focinho em um buraco, para serem expostos a amostras de cheiro, usando a técnica de recompensa: toda vez que acertavam a tarefa, ganhavam um petisco. Após dominarem essa habilidade, os pesquisadores apresentaram aos ratos quatro itens comumente contrabandeados junto com odores usados para mascarar esses produtos. 

Oito ratos completaram o treinamento e aprenderam a diferenciar entre os quatro odores-alvo e 146 outros odores. Testes realizados cinco e oito meses depois mostraram que os ratos ainda lembravam dos cheiros. Além de identificar os itens contrabandeados, eles também aprenderam a alertar seus tratadores puxando uma bolinha conectada a um colete especial, que ativa um sinal sonoro, um traje vermelho típico de um funcionário do setor de fiscalização.

Foto de um ratinho de colete dentro de um contêiner.
(APOPO/Reprodução)

Após dominar o comportamento de detecção de contrabando em laboratório, os ratos farejadores foram testados no porto de , na Tanzânia, onde conseguiram identificar mais de 83% dos alvos plantados, mesmo com outros odores presentes.

Caso os ratões sejam efetivados em grande escala, eles seriam um grande passo para a solução de alguns problemas globais.

O comércio ilegal de vida selvagem é avaliado entre 7 bilhões e 23 bilhões de dólares por ano, segundo um relatório do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente e da Interpol. É a quarta maior indústria de comércio ilegal, só atrás de narcóticos, tráfico humano e produtos falsificados.

Crawford Allan, vice-presidente de crimes naturais e defesa de políticas do WWF, destaca em depoimento à CNN que a vida selvagem é vista como uma mercadoria de baixo risco, e o crime organizado explora as falhas nos métodos de detecção em portos e aeroportos, especialmente na África.

Além disso, o sucesso dos ratos seria um avanço importante na preservação da biodiversidade. Isso porque a captura e a morte de animais compromete a reprodução das espécies, levando à extinção de populações inteiras.

A caça furtiva também interfere nas funções ecológicas, já que muitas espécies são essenciais para a dispersão de sementes. A extinção dessas vidas vegetais, por sua vez, desequilibra ecossistemas inteiros. A destruição de florestas tropicais, que são cruciais para a produção de oxigênio e absorção de CO2, também tem sérias consequências para o clima global a longo prazo.

O Brasil não sai atrás no contrabando. Neste ano, um navio cargueiro que partiu daquilo encalhou em Togo – e lá foram encontradas araras-azuis e micos-leão-dourados à bordo (ilegalmente).

Não existem dados consolidados sobre o tráfico internacional de animais no Brasil, mas um levantamento da ONG Freeland calcula que mais de 140 mil animais e quase 900 ovos foram apreendidos no país entre 2018 e 2022, com base em notícias.

A América Latina como um todo é vulnerável ao tráfico de vida selvagem devido à sua rica biodiversidade. Embora seja difícil obter dados precisos sobre o comércio ilegal de animais e plantas, o Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e Recursos Naturais estima que pelo menos 12 milhões de animais selvagens sejam caçados anualmente no Brasil.

A inserção dos ratos no mercado de trabalho não substituiria completamente os cães farejadores, e sim complementaria o serviço, já que os roedores são menores e mais ágeis para explorar espaços reduzidos. Eles também são mais baratos para transporte e manutenção, rápidos ao aprender e fáceis de treinar, além de viverem até 11 anos.

Esses fatores são especialmente importantes pois os contrabandistas frequentemente operam em países mais pobres. A coautora do estudo, Isabelle Szott, destaca a necessidade urgente de aumentar a triagem de cargas, e os ratos da APOPO se mostram ferramentas de detecção de odores eficientes e acessíveis.

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Fonte: abril

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