📝RESUMO DA MATÉRIA
- Na minha entrevista com o renomado pesquisador de mitocôndrias, Hemal Patel, discutimos que as mitocôndrias são cruciais para a saúde geral, já que a função mitocondrial comprometida está no cerne da maioria das doenças crônicas.
- A conexão íntima entre as mitocôndrias e a membrana celular, em especial os microdomínios especializados chamados cavéolas, é crucial para regular o fornecimento de oxigênio e metabolismo.
- O microbioma intestinal e as mitocôndrias têm uma comunicação bidirecional, com metabólitos microbianos impactando a função mitocondrial e vice-versa, oferecendo potencial para a previsão e prevenção de doenças.
- A colaboração entre a biologia mitocondrial, a saúde intestinal e a medicina personalizada, promete desbloquear um bem-estar vibrante e duradouro ao abordar as causas raízes das doenças crônicas.
🩺Por Dr. Mercola
Como defensor do papel crucial da saúde mitocondrial no bem-estar geral, fiquei entusiasmado com a oportunidade de conversar com o renomado pesquisador mitocondrial, Hemal Patel, professor de biologia na Universidade da Califórnia, em San Diego.
Discutimos os últimos avanços dessas notáveis potências celulares na nossa compreensão, além da fascinante conexão entre a função mitocondrial e o microbioma intestinal. Patel e eu compartilhamos a opinião de que a função mitocondrial prejudicada está no cerne da maioria das doenças crônicas. Segundo ele:
“As pessoas tendem a pensar que as mitocôndrias estão envolvidas na longevidade, que é o envelhecimento saudável. Mas há [muitas] outras coisas que as pessoas pensam que também estão envolvidas, que podem ou não ser importantes… onde o foco está mudando é que, no fim, trata-se mesmo das mitocôndrias. Se você não tiver isso e não estiver produzindo uma boa energia, nenhum desses outros fatores importa no final das contas”.
Esse sentimento reflete minha própria convicção de que otimizar a saúde mitocondrial é o passo mais importante que você pode tomar para alcançar uma saúde vibrante e duradoura.
Explorando sua paisagem mitocondrial
Patel forneceu insights fascinantes sobre a imensa escala e complexidade da rede mitocondrial dentro do corpo humano. Existem cerca de 100.000 trilhões de mitocôndrias no seu corpo, cada uma com centenas de cadeias de transporte de elétrons.
O número impressionante dessas organelas produtoras de energia, cada uma com seu próprio maquinário complexo, ressalta o quão vitais elas são para a função celular e, por extensão, para o seu bem-estar geral. Um dos aspectos mais intrigantes da nossa discussão, centrou-se na teoria endossimbiótica da evolução mitocondrial.
Conforme descrito por Patel, acredita-se que essas organelas tenham se originado como microrganismos independentes, que foram incorporados nas primeiras células eucarióticas há cerca de 1,5 bilhão de anos. Essa relação simbiótica não só permitiu o desenvolvimento de uma produção de energia mais eficiente, mas também deu às mitocôndrias a capacidade de “regular processos-chave relacionados à morte e a sobrevivência celular”. De acordo com Patel:
“Esses organismos, que talvez fossem alienígenas na época, foram incorporados às células, e criaram a simbiose que permitiu que alguns passos mágicos seguintes acontecessem. Tudo na vida é focado em crescimento, e tudo que é focado em crescimento depende de energia. Seja um crescimento bom ou ruim, ele requer energia para acontecer. Então, as mitocôndrias mudaram essa dinâmica de maneira fundamental.
Os processos bioquímicos que produziam energia antes disso eram ineficientes, certo? Você podia cozinhar, mas não conseguia cozinhar rápido o suficiente e de forma acelerada. As mitocôndrias nos deram a aceleração para chegar ao próximo passo. E dessa perspectiva, as pessoas sempre pensaram nelas como geradoras de energia, a força motriz da célula. Acho que isso é quase verdade.
Mas a outra coisa que elas não percebem é que, como temos esse organismo que agora é um simbionte em nossas células, ele regula outras coisas também. Ele precisa sobreviver e, para garantir a sobrevivência, ele regula processos-chave ligados à morte celular e à sobrevivência. Acho que essa é a característica mais importante. A energia é um equilíbrio disso, mas na verdade é a capacidade dele de sinalizar, perceber e organizar…”
A relação entre as mitocôndrias e a membrana celular
O trabalho inovador de Patel expande a conexão íntima entre as mitocôndrias e a membrana celular, em especial os microdomínios especializados conhecidos como cavéolas. Ele acredita que a membrana celular é na verdade a parte mais importante das suas células:
“Vou perguntar às pessoas qual é a parte mais importante da célula. E a maioria das pessoas dirá que é o núcleo, porque somos ensinados a pensar nele como o cérebro central e o centro de controle das coisas. A próxima coisa que as pessoas dizem são as mitocôndrias, porque elas sabem sobre energia e sistemas energéticos. Pouquíssimas pessoas dizem que a membrana celular é a parte mais importante da célula. E como biólogo da membrana celular, essa é a parte mais importante, certo?
É o que define uma célula. É o que define quem você é. Quando esse conglomerado de células se reúne, essa é a primeira barreira que vai perceber qualquer tipo de estresse. Concordo que em todas essas doenças crônicas, a disfunção mitocondrial é o efeito final. O efeito principal, eu diria, é um defeito na membrana, que acaba levando à interrupção da geração e utilização de energia na célula”.
Além disso, como ele explicou, “cada célula metabólica tem essa conexão interessante entre a membrana e as mitocôndrias. E no coração, há essa interação particular que acontece quase o tempo todo. Se houver mitocôndrias na superfície da célula, quase 100% das vezes, elas estão associadas a esse microdomínio”.
Ainda mais intrigante, Patel sugere que essas estruturas de cavéolas podem, na verdade, funcionar como um “capacitor de oxigênio”, servindo como um sistema especializado de armazenamento e distribuição dessa molécula vital. Ele descreveu como a alta concentração de colesterol dentro desses microdomínios permite que eles se liguem e regulem o fluxo de oxigênio para dentro da célula, protegendo assim as mitocôndrias dos efeitos prejudiciais do estresse oxidativo.
“Acreditamos que essa membrana se torna, na verdade, o canal de armazenamento e a via pela qual o oxigênio é regulado e entregue à célula”, explicou ele. “Ela funciona como um capacitor, e publicamos várias análises sobre esse conceito, e essa ideia de que as cavéolas são um capacitor para o oxigênio e metabolismo”.
O eixo mitocondrial intestinal e a previsão de doenças com seu microbioma
A pesquisa de Patel também destaca a complexa relação entre a função mitocondrial e o microbioma intestinal. De acordo com ele:
“O intestino e o resto da rede mitocondrial em seu sistema estão interagindo e engajados, onde, se seu nervo vago e seu intestino estiverem conectados, você está enviando sinais diferentes sobre quem e o que você é. “Isso muda toda a composição e você está criando novos metabólitos que podemos capturar no plasma, e que fazem coisas únicas e incríveis quando testamos isso em um sistema celular”.
Essa comunicação bidirecional entre o seu intestino e suas mitocôndrias, facilitada pela produção de metabólitos microbianos, representa uma fronteira promissora em nossa compreensão de como otimizar a saúde humana. Como Patel observou, sua pesquisa mostrou que mesmo uma mudança de curto prazo no microbioma intestinal, como a observada durante um retiro de meditação de uma semana, pode ter um impacto profundo nos marcadores do metabolismo e no bem-estar geral.
Patel e seus colegas até usaram algoritmos de aprendizado de máquina para analisar dados do microbioma intestinal e prever a presença de vários estados de doença. Como ele explicou:
“Podemos prever apenas observando a sequência metagenômica… você pode treinar o sistema de aprendizado de máquina sobre como a ansiedade se parece em termos de microbioma e, então, dar a ele alguns controles para dizer que isso não é o que a ansiedade parece, e então começar a alimentá-lo com dados conhecidos e fazê-lo prever.
Ele pode prever a ansiedade com cerca de 74% de precisão e, no caso de cânceres, em especial o câncer de mama, a precisão chega a quase 90%. O TEPT [transtorno de estresse pós-traumático], que é um pouco mais complicado, chega a cerca de 65%”.
Por fim, Patel afirmou: “Com mais e mais dados, você pode chegar ao ponto em que será capaz de analisar uma série única de fatores que são muito limitados. Você quer analisar todos esses fatores para então começar a prever várias doenças”. Depois, você pode identificar as causas subjacentes e fazer mudanças para ajudar a preveni-las.
A espiral do buraco negro da morte prematura
O cólon desempenha um papel na disfunção mitocondrial e na saúde precária. Como expliquei, acredito que a degradação gradual do epitélio colônico, é causada por fatores como o consumo excessivo de ácido linoleico (LA) de gorduras poli-insaturadas (PUFAs) encontrados em óleos de sementes. Este e outros venenos mitocondriais levam a uma interrupção no delicado equilíbrio de oxigênio no seu intestino.
Isso cria um ambiente que favorece a proliferação de micróbios nocivos e tolerantes ao oxigênio, ao mesmo tempo em que inibe o crescimento de micróbios benéficos e intolerantes ao oxigênio, que são cruciais para a saúde intestinal e o bem-estar geral. A mucina serve como a cola que mantém o epitélio colônico unido. Os colonócitos, ou células que revestem o cólon, criam uma barreira e uma vedação que precisam ser mantidas.
Quando interrompidos, vejo isso como uma “espiral de buraco negro” metafórica — uma espiral progressiva e descendente em direção à morte prematura.
Até que uma intervenção resolva o que está danificando seus colonócitos e restaure os níveis adequados de oxigênio, a população de micróbios benéficos e intolerantes ao oxigênio, não poderá ser restabelecida. Essa comunicação entre as mitocôndrias e o microbioma intestinal é crucial, mas se as bactérias patogênicas tolerantes ao oxigênio predominarem, as bactérias benéficas são eliminadas e você não conseguirá produzir os metabólitos necessários para prosperar.
A menos que você consiga remover o excesso de oxigênio do seu cólon, mesmo os melhores fatores de estilo de vida, como exercícios, sono, nutrição e suplementos, não levarão a uma melhoria. No entanto, você não pode introduzir probióticos para repor seus micróbios intolerantes ao oxigênio, pois os probióticos disponíveis de forma comercial, muitas vezes não são viáveis.
Eles fornecem benefícios pós-bióticos, mas não podem servir como uma verdadeira “semente” para restabelecer a comunidade microbiana adequada. O ambiente deve ser adequado para que esses micróbios prosperem, assim como não se pode esperar que uma semente cresça no deserto. Evitar venenos mitocondriais, como o LA e produtos químicos desreguladores endócrinos, é fundamental para isso.
Superando as limitações dos testes mitocondriais convencionais
Patel compartilhou insights sobre as limitações das abordagens convencionais para avaliar a função mitocondrial. Ele explicou que a maioria dos estudos pré-clínicos utiliza modelos animais jovens e saudáveis, que não refletem com precisão as complexidades das doenças humanas.
Para superar esses desafios, Patel destacou a importância de desenvolver modelos mais sofisticados e clinicamente relevantes, que incorporem fatores como idade e estados de doenças existentes. “Para desenvolver terapias pré-clínicas, você precisa analisar os modelos de doenças nos quais está testando, e os modelos de doenças relevantes que representam a condição humana”.
Patel também compartilhou sua perspectiva sobre as limitações dos testes mitocondriais tradicionais baseados em biópsia muscular, que ele descreveu como “dolorosos” e “autolimitados”. Para resolver isso, sua equipe tem explorado o uso de abordagens novas e menos invasivas, como a análise de amostras de sangue:
“É provável que temos feito isso em sistemas celulares há cerca de uma década. Quem diria que os humanos estariam interessados em saber sobre sua biologia mitocondrial? Então, estávamos trabalhando em uma série de estudos onde fazíamos biópsias musculares, que são o padrão ouro. Fazemos muitos ensaios clínicos com colaboradores no campus.
Eles nos dão tecido muscular, nós analisamos a função mitocondrial naquele tecido, e damos a vocês todos os tipos de informações sobre se, usando gordura, glicose ou cetonas, algum complexo está com defeito. A forma como você está usando os elétrons está funcionando de maneira correta? Esse tipo de coisa você pode manipular nesse nível. O problema é que não há como escalar isso, e é doloroso”.
Em vez disso, Patel e sua equipe desenvolveram um teste comercial chamado “mescreen“, que permite que indivíduos obtenham uma avaliação abrangente de sua função mitocondrial a partir de uma simples coleta de sangue. Essa abordagem inovadora não apenas fornece insights valiosos sobre a saúde metabólica de uma pessoa, mas também abre caminho para uma adoção mais ampla de testes mitocondriais como uma ferramenta para cuidados de saúde preventivos e personalizados.
Forjando um caminho colaborativo para o futuro
A intersecção da biologia mitocondrial, saúde intestinal e medicina personalizada, representa uma área promissora para futuras colaborações. Com a experiência de Patel em biologia mitocondrial e no eixo intestino-microbioma, e meu próprio foco no papel crucial do ambiente colônico, acredito que estamos prontos para fazer avanços significativos em nossa compreensão de como otimizar a saúde e a longevidade humanas.
À medida que avançamos, estou animado para continuar explorando o mundo milagroso das mitocôndrias e descobrir as conexões complexas entre essas potências celulares, o microbioma intestinal e o estado geral da sua saúde. Acredito que podemos descobrir as chaves para desbloquear um bem-estar vibrante e duradouro para indivíduos e comunidades.
Olhando mais a frente, o trabalho de pesquisadores como Patel é muito promissor para o futuro da saúde. Ao aprofundar nossa compreensão da função mitocondrial e sua complexa relação com o microbioma intestinal, podemos desenvolver intervenções mais direcionadas e personalizadas para abordar as causas raízes das doenças crônicas.
Do uso de aprendizado de máquina para prever riscos de doenças com base em perfis de microbioma à exploração de novas terapias direcionadas às mitocôndrias, o campo da medicina mitocondrial está prestes a revolucionar a maneira como abordamos o bem-estar e a longevidade.
Ao capacitar os indivíduos com o conhecimento e as ferramentas para otimizar sua saúde mitocondrial, podemos abrir caminho para uma nova era de cuidados de saúde proativos e preventivos, que abordem os fatores subjacentes à doença, em vez de apenas tratar os sintomas.
Fonte: mercola