Após vencer uma eleição presidencial que, pela primeira vez em quase duas décadas não contou com um candidato do Movimento ao Socialismo (MAS) entre os favoritos, o novo presidente boliviano Rodrigo Paz, de centro-direita, iniciou uma agenda de reformas profundas para desmontar estruturas deixadas pelos governos de esquerda e reconstruir a economia nacional.
Semanas após tomar posse, Paz eliminou impostos, anunciou cortes administrativos inéditos, expôs irregularidades que, segundo ele, drenaram bilhões de dólares do Estado e deu início a uma reorientação completa da política externa da Bolívia.
As primeiras medidas concentraram-se na economia. Ainda em novembro, o novo governo derrubou quatro tributos – o Imposto sobre Grandes Fortunas, o Imposto sobre Transações Financeiras, o Imposto sobre Jogos e o Imposto sobre Promoções Empresariais -sob o argumento de que esses impostos, criados pelos governos socialistas do MAS, afastaram investimentos e aceleraram a fuga de capitais da Bolívia. O plano econômico do novo governo também prevê reduzir em 30% o gasto público até 2026, com revisão integral do orçamento que está sendo discutido no Parlamento.
A reforma administrativa promovida por paz começou pelo Ministério da Justiça, que deixou de existir. O novo presidente acusou os governos socialistas de Evo Morales e Luis Arce de terem transformado a pasta em um instrumento de perseguição contra opositores na Bolívia.
“Não haverá mais perseguição política na Bolívia. O Ministério de Justiça morreu e vamos enterrá-lo bem para que não volte a perseguir bolivianos e bolivianas”, afirmou Paz.
O combate à corrupção tornou-se outro eixo central das primeiras decisões do novo governo. Em entrevista coletiva ainda no início de seu mandato, Paz afirmou que auditorias iniciais encontraram “um esgoto com mais de 15 bilhões de dólares em corrupção” envolvendo contratos, compras e estruturas administrativas montadas ao longo de 20 anos de governos socialistas. Entre os casos citados estão radares de fabricação francesa avaliados em 360 milhões de euros que, segundo o novo presidente, não funcionam há mais de uma década. O novo governo também investiga neste momento irregularidades cometidas dentro do Ministério de Hidrocarbonetos, na estatal YPFB e na Agência Nacional de Hidrocarbonetos (ANH), apontadas como responsáveis por parte do desabastecimento de combustível no país.
Ao tomar posse, o governo Paz disse ter encontrado a “pior crise econômica em quatro décadas” na Bolívia, com reservas internacionais em níveis críticos, dificuldades para aquisição de combustíveis e distorções provocadas por um câmbio artificial. Para superar o quadro, a equipe econômica negocia mais de US$ 9 bilhões em financiamentos externos, além de um empréstimo emergencial de US$ 550 milhões do Banco de Desenvolvimento da América Latina e Caribe.
No campo institucional, Paz defendeu uma “reconstrução de raiz” do sistema judicial da Bolívia, afirmando que o país viveu anos de “justiça politizada”. Em discurso durante um evento no mês passado, o presidente disse que encontrou “um Estado preso pela burocracia” e afirmou que a independência da Justiça boliviana será condição para recuperar a confiança pública. O governo anunciou também a digitalização de todos os processos judiciais para evitar perda de arquivos e manipulação de casos.
Reaproximação com os EUA
A política externa da Bolívia também passa por realinhamento neste governo. O novo chanceler do país, Fernando Aramayo, anunciou em novembro que a Bolívia deixará de manter alianças políticas com Cuba, Venezuela e Nicarágua e buscará uma diplomacia “pragmática, profissional e baseada em valores democráticos”. O país já estabeleceu relações diplomáticas plenas com os Estados Unidos, que estavam rompidas desde 2008, iniciou conversas sobre o retorno da DEA (agência antidrogas dos EUA) para a Bolívia, eliminou a exigência de visto para cidadãos americanos e lançou uma política de “céus abertos” para facilitar conexões aéreas.
As mudanças em curso marcam a maior guinada política boliviana desde 2006, quando o MAS chegou ao poder através de Morales. Com cortes de gastos, reestruturação institucional e aproximação com o Ocidente, o governo de centro-direita tenta reverter quase duas décadas de modelo estatista e reposicionar a Bolívia no cenário internacional.
Fonte: gazetadopovo






