O Tribunal de Contas da União (TCU) abriu investigação para apurar eventuais irregularidades cometidas por órgãos do governo federal ao manter contratos com a empresa AC Segurança LTDA., mesmo depois de ela ter sido formalmente impedida de participar de licitações e firmar novos vínculos com a Administração Pública.
A apuração ocorre depois de uma representação do subprocurador-geral Lucas Rocha Furtado, do Ministério Público junto ao TCU, que denunciou “fortes indícios de irregularidade nas renovações de contrato”, conforme informou o portal Metrópoles neste sábado, 26.
A penalidade à empresa foi determinada pelo Ministério da Educação (MEC), com validade de 12 meses, por “atraso no pagamento/não pagamento dos salários dos colaboradores”. A sanção tem abrangência nacional e impede a empresa de ser contratada por qualquer órgão da Administração Pública direta ou indireta.
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Apesar disso, o MEC não cadastrou a punição no Sistema de Cadastramento Unificado de Fornecedores (Sicaf) e no Cadastro Nacional de Empresas Inidôneas e Suspensas (Ceis) dentro do prazo legal de 15 dias, conforme exigido pela lei. A atualização só foi realizada em julho, mais de três meses depois da penalidade.
Nesse intervalo, ao menos quatro ministérios — Agricultura (Mapa), Pesca e Aquicultura (MPA), Ciência e Tecnologia (MCTI) e Desenvolvimento Social (MDS) — renovaram contratos com a empresa, em um total de R$ 14,8 milhões.
Furtado argumenta que “a renovação de contratos com empresas inabilitadas pode ser considerada irregular e contrária aos princípios da administração pública”, e afirma que o caso oferece “risco de lesão aos cofres públicos”.
O MEC se limitou a dizer que a sanção teve efeitos imediatos a partir da publicação. Contudo, não explicou o motivo da omissão ao deixar de informar os cadastros oficiais do governo federal, o que teria permitido que os demais ministérios firmassem termos aditivos com a AC Segurança.
Em junho, o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (), autarquia vinculada ao MEC, aplicou à empresa multa no valor de R$ 60 mil por “inexecução total ou parcial do contrato”.
A justificativa registrada no Sicaf menciona que “foram identificadas infrações de natureza grave, passíveis de sanção Multa, que comprometem a regularidade da prestação dos serviços apuradas durante a execução do contrato”. A guia de recolhimento da penalidade confirma a multa aplicada e tem vencimento em agosto. O motivo registrado é “descumprimento contratual”.
Além da sanção do MEC, a empresa AC Segurança LTDA. também foi punida pela Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), que em fevereiro aplicou impedimento para licitar e contratar por dois anos. A razão também foi o “atraso no pagamento dos salários dos funcionários”.
Em nota técnica elaborada pelo próprio Inep, foi registrada preocupação com o envolvimento da empresa em investigações criminais: “urge a preocupação de possíveis impactos jurídicos, administrativos e operacionais na continuidade da prestação desses serviços no âmbito do Instituto”.
A empresa AC Segurança LTDA é uma das investigadas pela Polícia Federal na Operação Dissímulo, deflagrada em fevereiro, com apoio da Controladoria-Geral da União (CGU) e da Receita Federal.
A suspeita é de que a companhia integraria um grupo empresarial responsável por simular concorrência em licitações públicas e utilizar “laranjas” como sócios e declarações falsas para obter vantagens fiscais.
A investigação acredita que as empresas do grupo atuariam de forma coordenada para fraudar licitações bilionárias com o governo. No caso da AC Segurança, além das sanções administrativas, há histórico de atrasos salariais, descumprimento contratual e advertências anteriores.
Paralelamente à penalidade do MEC, o Inep também decidiu substituir a empresa em suas dependências e lançou licitação para contratação de nova empresa de vigilância. No entanto, a própria AC Segurança foi declarada vencedora do pregão, no valor de R$ 7,2 milhões.
Depois de questionamentos da imprensa e nova consulta ao Sicaf, o Inep reconheceu, em julho, que havia uma sanção com efeito nacional contra a empresa, e informou que “medidas cabíveis serão adotadas em total aderência à legislação vigente”.
Em maio, o MDS assinou para prorrogar contrato com a AC Segurança até agosto. A pasta alegou que, à época, “não foi identificado nenhum impedimento que inviabilizasse a continuidade da contratação com a Administração Pública direta”.
No mesmo mês, o MCTI também prorrogou o contrato com a empresa por mais 12 meses, ao custo de R$ 7,76 milhões. Segundo nota da pasta, o aditivo foi assinado antes da atualização do Sicaf e “as decisões administrativas são tomadas com base nas certidões e registros oficiais disponíveis no momento da assinatura”. O MPA, por sua vez, prorrogou o contrato em de julho, por mais um ano, ao custo de R$ 5 milhões aos cofres públicos.
De acordo com a legislação, os órgãos e entidades da Administração Pública devem comunicar, em até 15 dias úteis, a aplicação de sanções ao Ceis e ao Cadastro Nacional de Empresas Punidas (CNEP), com o objetivo de impedir novas contratações.
A lei determina ainda que, antes de qualquer nova contratação ou renovação contratual, a Administração Pública deve verificar a regularidade fiscal e consultar os cadastros nacionais de impedimentos.
Segundo Furtado, “empresas contratadas pela administração não possuem direito subjetivo à prorrogação de contratos, mas apenas uma expectativa de direito”. A ausência de impedimento formal nos sistemas eletrônicos, no entanto, permitiu a continuidade das contratações.
A representação do Ministério Público junto ao TCU pede a apuração tanto das renovações contratuais feitas com a empresa depois da sanção, quanto do atraso do MEC em registrar a penalidade. A investigação está em curso e poderá levar à responsabilização de gestores públicos envolvidos, caso se confirme o descumprimento das obrigações legais.
Fonte: revistaoeste