Apostar em gêneros que tem se destacado no mercado pode ser um belo atalho para o sucesso, mas o que muitos estúdios parecem ignorar é que conseguir um lugar de destaque entre títulos com milhões de jogadores não é uma tarefa fácil. E a descontinuação do Scavengers e do Crowfall reforça o risco de sermos fisgados por jogos exclusivamente online.
Com uma jogabilidade que colocava os jogadores contra outras pessoas, mas também contra personagens controlados pelo computador, no papel o Scavengers surgiu como uma promissora alternativa aos battle royales mais tradicionais. Nele um asteroide se chocou com a lua e seus destroços fizeram com que a Terra entrasse numa nova era do gelo.
Tendo como principal inspiração o modo Warzone do Halo 5: Guardians, desde o início o jogo da Midwinter Entertainment foi “vendido” com a ideia de ser mais que apenas um jogo de tiro ou um mero battle toyale. O estúdio formado por ex-funcionários da 343 Industries afirmava ter criado um “campo de batalha de sobrevivência estratégica”, mas agora sabemos que nem todo o marketing do mundo seria capaz de salvar o projeto.
Lançado no Steam e na Epic Games Store em 28 de abril de 2021, o Scavengers até recebeu elogios na época, mas não demorou para que o interesse do público esfriasse. Para piorar, a desenvolvedora não passava de uma subsidiária da Improbable Worlds Limited, que em maio deste ano optou por vender a Midwinter Entertainment para a Behaviour Interactive, que é mais conhecida pelo jogo Dead by Daylight.
Sem que o desempenho comercial almejado fosse alcançado e com aqueles que permaneceram com os direitos sobre a franquia passando a apostar suas fichas no metaverso, tudo indicava que o título não teria vida longa, o que foi confirmado com o anúncio que os servidores serão desligados em 16 de dezembro de 2022. Segundo a nota, a quantidade de jogadores caiu muito nos últimos meses e apesar da desenvolvedora ter “explorado muitas opções para revigorar a população dos servidores enquanto o jogo está em acesso antecipado, ficou claro que era insustentável continuar o desenvolvimento e as atualizações.”
A mensagem até fala sobre o orgulho que o estúdio tem do trabalho realizado na criação do Scavengers, mas como de costume, lamenta por terem que tomar a dura decisão de acabar com o jogo e agradece àqueles que se dispuseram a passar um tempo no seu mundo virtual.
“Desde o início do desenvolvimento queríamos criar uma experiência de tiro online estratégica que fosse única e focada em equipe que fosse construída com a comunidade,” diz o comunicado assinado pela Improbable. “A sua paixão, dedicação e apoio ao Scavengers foi nada menos do que extraordinário. Agradecemos por fazer essa jornada conosco.”
Embora a aquisição do jogo não seja mais possível na loja da Valve, ela ainda é possível na Epic Games e de acordo com os profissionais que continuavam trabalhando nele, as próximas semanas serão de celebração em Cascade Springs.
Mas além desse período que tem tudo para ficar marcado como um típico fim de festa, a Improbable Worlds tentará emplacar a SpatialOS, tecnologia que criou visando justamente os jogos multiplayer de grande escala. Além do Scavengers, vários outros títulos que a utilizavam não tiveram muita sorte, como o battle Royale para 400 pessoas, Mavericks: Proving Grounds; o Worlds Adrift, da Bossa Studio; ou o Ion, que estava sendo desenvolvido pelo criador do DayZ, Dean Hall.
A queda temporária (?) da coroa
Mas se o jogo idealizado pelo pessoal da Midwinter Entertainment está perto de virar apenas uma lembrança para os seus jogadores, o caso do Crowfall é no mínimo… curioso. Nascido através de uma campanha de financiamento coletivo que aconteceu em 2015 e em que conseguiu arrecadar mais de US$ 5,7 milhões (e outros US$ 30 milhões de investidores), esse MMO só seria lançado em julho de 2021.
O que talvez nem o mais pessimista jogador poderia esperar era que, pouco mais de um ano após o título ser finalmente disponibilizado, a ArtCraft anunciaria que tirará o jogo do ar. Mesmo com tão pouco tempo funcionando, essa não seria uma situação inédita, com o que chama a atenção é a promessa de que o Crowfall um dia voltará.
Sim, de acordo com o comunicado emitido pelo estúdio, um dos maiores desafios para eles tem sido “a quantidade de esforço de desenvolvimento necessário para criar campanhas e manter o jogo rodando diariamente.” Por isso eles optaram por cancelar o jogo temporariamente e redirecionar o foco das atualizações para o desenvolvimento.
“Estamos trabalhando para usar esse tempo para mapear o futuro do jogo,” garantem os criadores do Crowfall. “Nós ainda determinaremos como isso parecerá, mas estamos investindo nisso e repensando todas as partes do jogo — da tecnologia central e ferramentas à arte, design e jogabilidade. Nada está descartado.”
Atualmente produzido pela Monumental, que em dezembro de 2021 adquiriu o MMO, acho louvável que os novos responsáveis pelo título queiram mantê-lo vivo. Porém, como não ficar surpreso com a justificativa dada para que o Crowfall tenha sido tirado do ar? Será que essas pessoas não tinham ideia do trabalho hercúleo que seria manter um jogo do gênero atualizado enquanto seu desenvolvimento precisaria acontecer paralamente?
Como desconheço o tamanho da equipe envolvida no projeto e a quantidade de dinheiro disponível, tendo a crer que o problema estaria na estrutura que o cerca. Mesmo assim, soa como um amadorismo imensurável saber que um MMO deixará de funcionar porque o seu gerenciamento aparentemente foi terrivelmente mal organizado.
O que ajuda a reforçar essa sensação de os envolvidos não saberem muito bem como tocar o barco pode ser visto na comunicação do estúdio, ou melhor, na falta dela. Tirando o aviso que o jogo deixará de funcionar até só-Deus-sabe-quando, a última mensagem publicada pela Monumental havia sido publicada há seis meses e a situação nas redes sociais não é muito diferente.
Diante deste cenário, é difícil imaginar que o Crowfall não precise de mais dinheiro para se manter vivo. Mais difícil ainda é pensar que pessoas colocarão seu dinheiro num jogo que já foi desligado uma vez e isso vale tanto para investidores quanto para jogadores. É importante dizer que, apesar de atualmente o MMO ter um período de testes de dez dias, após esse prazo será preciso adquiri-lo por US$ 14,99.
Caso o jogo realmente volte a funcionar no futuro, distribuí-lo gratuitamente poderá ser uma solução para atrair o público, com o faturamento vindo das microtransações. Mesmo assim, com tão pouco tempo disponível e tantas ofertas no mercado, você dedicaria algumas horas da sua vida a algo com um passado tão turbulento?
Fonte: terra.com.br/gameon