O governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) usou o apagão prolongado que atingiu , em outubro, para intensificar a campanha contra as agências reguladoras. Esse discurso de desqualificação, no entanto, ocorre enquanto o Executivo promove um desmonte operacional. Entre as ações, estão as limitações orçamentárias e de pessoal, que dificultam o trabalho dessas instituições.
A (Aneel) é a principal atingida, mas a Agência Nacional de Mineração (ANM) e a Agência Nacional do Petróleo, Gás e Biocombustíveis (ANP), ambas ligadas ao Ministério de Minas e Energia (MME), também enfrentam problemas semelhantes.
Desde o início do terceiro mandato de Lula, a restrição de recursos aumentou. Isso afetou diretamente funções essenciais, como a fiscalização. Embora essas agências possuam fontes próprias de receita para financiar suas atividades, o governo retém uma parte significativa dos recursos.
A Aneel, por exemplo, tem o direito de arrecadar por meio da Taxa de Fiscalização de Serviços de Energia Elétrica (TFSEE), que incide sobre toda a cadeia do setor elétrico, incluindo geradores, transmissores e distribuidores. Em 2024, a agência esperava arrecadar cerca de R$ 1,2 bilhão, mas enfrentou um corte de aproximadamente R$ 865 milhões. Isso representa 72% do montante que não será destinado à agência.
A legislação não define uma parte exata dos recursos que devem ser repassados à Aneel. No entanto, um levantamento realizado pela própria agência revelou que a discrepância entre a arrecadação e o repasse nunca foi tão grande quanto na atual gestão de Lula.
Como resultado, a atuação diária da agência foi prejudicada. Um exemplo disso é a redução no atendimento ao público. O call center, que antes funcionava das 6h20 à meia-noite, passou a operar das 8h às 20h. Além disso, o orçamento para a fiscalização foi reduzido em 50%, de R$ 33,6 milhões para R$ 16,55 milhões. Convênios com agências estaduais também sofreram cortes, prejudicando a fiscalização local.
A situação na ANM também é crítica. A agência, responsável pela supervisão das mineradoras, especialmente no que diz respeito à segurança de barragens, enfrenta sérios desafios financeiros.
A legislação determina que 7% dos royalties da mineração, conhecidos como Cfem, sejam destinados à ANM. Porém, na prática, os repasses nunca ultrapassaram 1,5%. Em 2023, o valor previsto para a agência foi de R$ 483 milhões, mas menos de R$ 15 milhões foram efetivamente repassados.
Como resultado, a ANM teve que adiar vistorias essenciais em barragens de . Isso ocorreu em razão de um corte de R$ 500 mil no orçamento destinado à segurança das barragens.
O governo financia a ANP por meio de bônus de assinatura de áreas exploratórias e taxas sobre a retenção de áreas de petróleo. Embora essas receitas tenham crescido desde a criação da agência, o montante liberado para sua operação tem diminuído.
Em 2023, o governo de Lula alocou uma grande parte dos recursos como reserva de contingência, o que prejudicou a capacidade de operação da agência. Como consequência, a ANP precisou reduzir a abrangência de sua pesquisa de preços de combustíveis. Essa pesquisa é essencial para investigações sobre abusos de mercado. Além disso, a agência suspendeu o monitoramento da qualidade dos combustíveis no país.
Vinícius Benevides, presidente da Associação Brasileira de Agências Reguladoras (Abar), ressaltou em entrevista à Folha de S.Paulo, que essas restrições orçamentárias geraram grande insegurança nas agências.
“Essa situação deixa as agências numa insegurança muito grande, precisando cortar coisas que são fundamentais”, disse Benevides.
Ele também destacou que, além dos problemas financeiros, as agências enfrentam um déficit de pessoal. A falta de contratações e a má gestão dos diretores, indicados por interesses políticos, agravaram a situação.
“As agências precisam contratar consultorias para estudos, investir em softwares, inteligência artificial, equipamentos para fiscalizar setores que têm recursos”, reiterou o presidente da Abar. “O regulador não pode ficar para trás daquele ente que ele regula.”
A Aneel, por exemplo, enfrenta uma falta de 248 servidores. Isso representa quase 30% a menos do que o previsto em lei. No caso da ANM, um relatório do Tribunal de Contas da União (TCU) apontou que a agência opera com sistemas obsoletos e uma equipe reduzida.
Apenas cinco servidores são responsáveis pela fiscalização dos royalties em todo o país. A ANP também enfrenta escassez de pessoal, com o número de servidores efetivos reduzido ao menor patamar desde 2013.
O Ministério de Minas e Energia (MME) respondeu ao questionamento sobre os impactos desses cortes, afirmando que o assunto é responsabilidade do Ministério do Planejamento. Para o especialista em contas públicas, Marcos Mendes, embora o contingenciamento seja uma prática legítima, ele prejudica a capacidade operacional das agências. Essas agências são essenciais para garantir a eficiência e a segurança do setor.
Fonte: revistaoeste