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O ‘Plano Trump’: o que ainda pode estar por vir na estratégia bolsonarista

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Nos Estados Unidos, pouco depois do fechamento das urnas em 3 de novembro de 2020, o então presidente Donald Trump deixou claro que não tinha intenção de conceder a eleição de 2020 a Joe Biden. Em vez disso, ele e seus aliados se engajaram em estratégias sobrepostas para tentar reverter os resultados da eleição, começando em novembro e persistindo mesmo depois que seus apoiadores invadiram o Capitólio de Washington, dois meses depois.

As estratégias tornaram-se cada vez mais radicais, à medida que os esforços para usar os tribunais ou procedimentos estaduais de recontagem para alterar o resultado das eleições falharam. Desde que Trump deixou o cargo, não houve mudanças legais significativas que impediriam um futuro presidente de tentar táticas semelhantes, e grande parte do Partido Republicano abraçou as falsidades de Trump sobre o que aconteceu em 2020 – reproduzir a narrativa tem sido método de campanha eleitoral favorito da ala radical republicana para as eleições de meio de mandato nos Estados Unidos, que acontecem na semana que vem.

No Brasil, onde o presidente Jair Bolsonaro (PL) copiou grande parte do manual de fraude eleitoral de Trump, estratégias como questionar a credibilidade das urnas eletrônicas e alegar que já houve fraude eleitoral generalizada em pleitos anteriores foram utilizadas descaradamente ao longo da campanha presidencial. Após a vitória de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) nas urnas, confirmada pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE), o “Plano de Trump” pode dar indícios sobre o que ainda está por vir na estratégia bolsonarista.

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Como Bolsonaro já imitou Trump

1. Alegar, sem evidências, que já houve fraude eleitoral

Ainda em 2016, quando venceu a eleição contra a democrata Hillary Clinton, Trump insistiu que teria vencido o voto popular, além do voto por Colégio Eleitoral (nos Estados Unidos, o presidente é escolhido pela quantidade de estados onde o candidato vence), “se você descontar os milhões de pessoas que votaram ilegalmente”.

O ex-mandatário repetiu a mentira por anos e até alegou falsamente em uma entrevista, em junho de 2019, que a Califórnia “admitiu” ter contado “um milhão” de votos ilegais. Isso acabou sendo um ensaio geral para 2020. Na noite das eleições, Trump passou a fazer acusações quase idênticas sobre as cédulas atrasadas (ou apenas contadas tardiamente).

Enquanto isso, no Brasil, Bolsonaro também denunciou uma suposta fraude eleitoral em 2018, ano em que venceu o pleito, alegando que ele teria conquistado a Presidência no primeiro turno sem as irregularidades. Ao longo da campanha neste ano, o líder brasileiro voltou a falar diversas vezes em fraude, sem nunca apresentar evidências.

2. Questionar o sistema eleitoral

Se do lado de lá Trump tentou desacreditar os órgãos responsáveis pela contagem dos votos e questionou a credibilidade do voto por correspondência – método amplamente utilizado nos Estados Unidos –, do lado de cá, Bolsonaro lançou uma série de ataques às urnas eletrônicas, alegando que são suscetíveis a hacks e deviam ser substituídas pela cédula física, bem como aos principais órgãos ligados à eleição, como o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e seu líder, o ministro Alexandre de Moraes.

Nos Estados Unidos, à medida que a pandemia de Covid-19 avançava em 2020, os estados começaram a ampliar as oportunidades de votar pelo correio. O objetivo de Trump parecia claro: ao afirmar que a modalidade equivale a fraude eleitoral, ele estava criando uma justificativa falsa para contestar os resultados das eleições em qualquer estado que perdesse. Já no Brasil, a ideia de urnas sujeitas a hacks serviriam de justificativa falsa.

3. Após o pleito, não conceder

O ex-presidente dos Estados Unidos foi inflexível em não admitir a própria derrota. Na verdade, quando ainda estava à frente de Biden na apuração, ele declarou vitória na madrugada do dia 4 de novembro.

“Isso é uma fraude para o público americano. Isso é uma vergonha para o nosso país. Estávamos nos preparando para ganhar esta eleição. Francamente, nós ganhamos esta eleição. Nós ganhamos essa eleição. Portanto, nosso objetivo agora é garantir a integridade para o bem desta nação”, disse. “Então, vamos à Suprema Corte dos Estados Unidos. Queremos que todas as votações parem. No que me diz respeito, já vencemos.”

O Trump dos Trópicos foi menos enfático. Em seu primeiro discurso após as eleições, após mais de dois dias de silêncio, Bolsonaro agradeceu pelos 58 milhões de votos que recebeu e disse que obedeceria a Constituição. Contudo, muito mais do que não parabenizar o concorrente Lula, ele não reconheceu o resultado do pleito e ainda manteve dúvidas sobre a transparência do processo eleitoral.

Desde então, o presidente em exercício deu início ao processo de transição em conjunto com a equipe de Lula, mas não chegou a admitir derrota, mantendo suas opções abertas.

O que ainda pode estar por vir

1. Contestar o resultado da eleição em tribunais

Os advogados de campanha de Trump, liderados por Rudy Giuliani e Sidney Powell, acionaram 62 processos federais e estaduais contestando muitos aspectos dos resultados das eleições. A maioria era sobre detalhes frívolos e 61 foram rejeitadas por motivos muito variados. A que deu certo, na Pensilvânia, envolveu um pequeno número de cédulas com erros técnicos que um juiz local permitiu que os eleitores “curassem” após um prazo legal. A Suprema Corte rejeitou dois processos.

As batalhas legais da campanha de Trump depois se tornaram uma farsa completa, como ficou óbvio em 19 de novembro, quando Giuliani e Powell realizaram uma coletiva de imprensa apresentando teorias da conspiração bizarras – falando até em comunistas que manipularam as máquinas de votação. O procurador-geral, William Barr, disse que a equipe de advogados do ex-presidente era um “show de palhaços”.

Um memorando interno, revelado muito mais tarde, também mostrou que a campanha de Trump sabia que a maioria das alegações feitas nos processos eram falsas.

2. Recrutar aliados regionais

A tentativa mais séria de Trump roubar a eleição envolveu apelos aos legisladores republicanos nos principais estados vencidos por Biden, para contestar os resultados antes que eles pudessem ser certificados (o passo antes da concessão formal de votos eleitorais).

As legislaturas lideradas por republicanos nos estados que Biden venceu precisariam derrubar o voto popular de seu estado e nomear uma lista de eleitores de Trump, para apresentá-la na reunião do Colégio Eleitoral. Mas todos os 50 estados e o Distrito de Columbia certificaram seus resultados eleitorais e os eleitores presidenciais do Colégio Eleitoral votaram para tornar Biden o presidente eleito em dezembro de 2020.

3. Incitar uma manifestação “selvagem”

Logo depois da certificação do Colégio Eleitoral, Trump publicou em sua conta no Twitter um pedido para seus apoiadores realizarem uma grande demonstração em Washington, contra a certificação dos resultados pelo Congresso americano. “Esteja lá, será selvagem!”, afirmou.

A mensagem é vista como fundamental para atrair as multidões que participaram de um comício pró-Trump na Ellipse, em 6 de janeiro, e depois marcharam para o Capitólio, invadindo a sede do Congresso e deixando um rastro de destruição que incluiu quatro mortos. Grupos radicais de extrema direita, como os Proud Boys e os Oathkeepers, que nunca haviam trabalhado juntos antes, planejaram o evento.

No dia do incidente, Trump disse no comício: “Todos nós aqui hoje não queremos ver nossa vitória eleitoral roubada por democratas de esquerda radical, que é o que eles estão fazendo. E roubado pela imprensa das fake news. Nunca vamos desistir, nunca vamos ceder. Isso não acontece. Você não concede quando há roubo envolvido.”

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4. Continuar espalhando mentiras sobre fraude eleitoral

Após deixar a presidência, Trump se deparou com uma série de problemas legais, que incluem uma investigação criminal sobre a tentativa de reverter os resultados eleitorais de 2020 na Geórgia, um inquérito federal sobre documentos confidenciais que foram levados à sua residência pessoal na Flórida e uma ação civil contra sua empresa, a Trump Organization, em Nova York.

Mesmo assim, ele nunca deixou os holofotes e mantém viva sua narrativa de fraude, com a qual espera impulsionar candidatos escolhidos a dedo por ele nas eleições de meio de mandato do país, marcadas para o dia 8 de novembro, na semana que vem. O dano que o ex-presidente está causando à credibilidade das instituições democráticas entre os eleitores republicanos está se agravando diariamente.

Enquanto isso, ele preserva seu status de líder do Partido Republicano e político-estrela, pronto para lançar uma nova candidatura para 2024. Tanto para Trump quanto para Bolsonaro, no jogo de surrupiar a presidência, a derrota pode ser só temporária.

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Fonte: Veja

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