📝RESUMO DA MATÉRIA

  • Benzodiazepínicos, usados para tratar a ansiedade, podem causar efeitos colaterais prejudiciais quando tomados a longo prazo. O documentário “Medicando o Normal” explora como os medicamentos psicotrópicos podem piorar as condições dos pacientes ao longo do tempo.
  • O uso prolongado de benzodiazepínicos pode causar comprometimento do pensamento, confusão, desorientação e efeitos negativos na inteligência fluida. Até mesmo os adolescentes recebem cada vez mais prescrição de medicamentos psicotrópicos para problemas de saúde mental.
  • A indústria farmacêutica redefiniu o “normal” para equiparar o desconforto à anormalidade, levando à prescrição excessiva. Esta abordagem prioriza o lucro em vez de abordar as causas raízes dos problemas de saúde mental.
  • A polifarmácia, o uso simultâneo de múltiplos medicamentos, é um problema crescente na América. Isso afeta vários grupos, em especial os idosos, e pode levar a inúmeras complicações de saúde.
  • Para reduzir a dependência de medicamentos, liste todos os medicamentos, use uma única farmácia, analise com cuidado as novas prescrições e considere mudanças saudáveis no estilo de vida. As revisões regulares da medicação com os profissionais de saúde também são cruciais.

🩺Por Dr. Mercola

Os benzodiazepínicos são uma classe de medicamentos psicotrópicos usados para tratar transtornos de ansiedade. Eles funcionam promovendo a liberação do ácido gama-aminobutírico (GABA), um neurotransmissor, desacelerando assim o sistema nervoso. No entanto, eles são propensos ao abuso e, quando tomados por anos, podem causar efeitos colaterais prejudiciais. Muitos dos quais ainda não foram totalmente identificados e estudados.

O documentário “Medicando o Normal”, produzido e dirigido pela dupla de cineastas Lynn Cunningham e Wendy Ractliffe, lança luz sobre esse problema. O filme foi inspirado por um parente de Cunningham que, em determinado momento, tomava 10 comprimidos por dia e queria conscientizar as pessoas sobre isso. Aqui está a declaração deles, no site oficial do filme:

“Estima-se que de 1 em cada 5 americanos que tomam esses medicamentos, 30% a 35% são prejudicados de forma grave pelo próprio tratamento que deveria ajudá-los. ‘Medicando o Normal’ foca na situação difícil desse grupo. Indivíduos que enfrentam traumas e estresse, que são medicados sem necessidade e ficam mais doentes como resultado…

Nossa esperança é que o ‘Medicando o Normal’ apresente uma história muito importante e em grande parte não contada, para que, como sociedade, possamos iniciar uma discussão nacional significativa e informada sobre o que significa ser humano e com a mente saudável”.

Medicamentos psicotrópicos podem piorar a condição do paciente

O filme acompanha diversas pessoas ao longo de três anos, fazendo uma análise profunda e íntima de como o abuso prolongado de medicamentos psicotrópicos afetou suas vidas. O filme começa com a história de Dave Cope, um ex-oficial da Marinha dos EUA que foi forçado a se aposentar devido ao uso crônico de Ativan (lorazepam), um tipo de benzodiazepínico, durante sua pós-graduação. Durante esse período, ele também foi diagnosticado com TDAH e recebeu prescrição de anfetaminas.

Embora Cope tenha notado que esses medicamentos ajudaram nos primeiros meses, eles acabaram criando efeitos colaterais preocupantes. Em um exemplo, ele sofreu um bloqueio cognitivo a ponto de ter dificuldade para lembrar onde morava. Além disso, ele desenvolveu um sentimento de apatia, incapaz de ficar animado para seu casamento que se aproximava.

A veterana do Exército dos EUA, Angie Peacock, teve uma experiência semelhante. No filme, ela narra como lhe foi prescrito Klonopin (clonazepam), outro benzodiazepínico, para controlar a sua saúde mental depois de voltar para casa. Em uma entrevista para a Mad in America, ela descreveu como as drogas que tomou levaram a graves problemas de saúde física e mental:

“Lembro que logo comecei a ter esses problemas. Eu tinha febre baixa, problemas gastrointestinais, dores de cabeça e frequência cardíaca alta. Dentro de duas semanas, eu não conseguia dormir. Toda vez que eu ouvia um barulho, eu pulava. Eu lembro de ter medo de ficar do lado de fora, fiquei com agorafobia”.

Os benzodiazepínicos atuam desacelerando o sistema nervoso central, reduzindo a ansiedade, convulsões e espasmos musculares. No entanto, o uso a longo prazo, como fica evidente nas experiências de Cope e Peacock, pode causar problemas psicológicos. De acordo com um estudo publicado no The Ochsner Journal, os efeitos a longo prazo do uso de benzodiazepínicos incluem comprometimento do pensamento, confusão e desorientação. Aumento da tolerância e dependência também são observados.

Em outro estudo publicado em 2021, observou-se que o uso prolongado de benzodiazepínicos teve um efeito negativo na inteligência fluida, que é a capacidade do cérebro de interpretar dados e encontrar soluções para quebra-cabeças ou problemas abstratos.

Adolescentes também recebem prescrição de medicamentos psicotrópicos

Nem mesmo os adolescentes conseguem escapar das garras da Big Pharma, como no caso da estudante universitária Rebecka Green. No filme, ela explica que desenvolveu ansiedade durante o ensino médio, o que a fez perder peso. Depois, seus pais marcaram uma consulta com um terapeuta para ajudá-la. Não é de surpreender que, de imediato, Rebecka tenha recebido uma prescrição de Zoloft, um medicamento antidepressivo.

Depois de algum tempo, Rebecka começou a ter alucinações sobre pessoas que não estavam ali. Ela também foi hospitalizada várias vezes e recebeu prescrição de mais medicamentos para tratar os efeitos colaterais dos outros medicamentos que ela estava tomando. Ela relata sua experiência, dizendo: “Acho que em determinado momento, tomei 6 ou 7 [medicamentos] ao mesmo tempo”.

O uso de medicamentos para aliviar os sintomas sem tratar a causa raiz é agora um problema crescente entre os . Em um relatório de 2022 do The New York Times, o número de consultas de adolescentes (menores de 20 anos) a psiquiatras aumentou de 200.000 em 1993 para 1,2 milhão em 2002. Além disso, uma pesquisa do Medicaid observou que 85% das crianças matriculadas no programa, que estavam tomando um medicamento antipsicótico também tinham um segundo medicamento.

Como você pode imaginar, esses medicamentos não funcionam, mesmo para os jovens. De acordo com o Dr. Joshua Gordon, ex-diretor do Instituto Nacional de Saúde Mental dos EUA, a falta de dados mostrando qual combinação de medicamentos pode ajudar uma criança, pode em última instância, levar ao uso de múltiplos medicamentos:

“O motivo pelo qual as crianças acabam tomando vários medicamentos é que não temos os medicamentos que de fato funcionem para elas. Tudo isso sugere que precisamos de mais pesquisas”, Gordon acrescenta.

A Big Pharma distorceu o que significa ser “normal”

De acordo com a psicóloga da Marinha dos EUA, Mary Neal Vieten, Ph.D., grande parte do problema da prescrição excessiva decorre de como os profissionais de marketing de medicamentos cooptaram a noção de “normalidade”. Ela observou que eles confundiram, de forma deliberada, “normal” com estar confortável. Portanto, se você estiver se sentindo desconfortável, você está automaticamente “anormal” e deve tomar um comprimido. O Dr. Allen Frances, ex-presidente de psiquiatria da Universidade Duke, aprofunda ainda mais esse argumento:

“O normal está em perigo. As definições usadas em psiquiatria e, ainda mais, a maneira como são aplicadas, tornaram-se tão amplas que uma porcentagem excessiva da população seria definida como tendo um transtorno mental…

Mas a maioria das pessoas que vão ao clínico geral por ansiedade tem um fator estressante de curto prazo que as faz se sentir mal. A maioria dos sintomas desaparece na maioria das pessoas dentro de algumas semanas ou um mês. Não devemos confundir tristeza normal e ansiedade normal com transtornos mentais, e essa linha tênue se tornou bastante confusa”.

A única razão que faz sentido para que esse sofrimento tenha prosperado por tanto tempo é a busca pelo lucro. Robert Whitaker, um renomado jornalista crítico da indústria psiquiátrica, observou que a obsessão em tomar remédios para todos os tipos de problemas de saúde vem de uma cultura que busca soluções mágicas. Como era de se esperar, a Big Pharma tirou disso.

Na década de 1970, os psiquiatras americanos competiam com terapeutas, assistentes sociais e profissionais de aconselhamento, por pacientes. Para atrair mais pacientes, eles vestiam um jaleco branco e se apresentavam como médicos.

Por fim, eles adotaram um modelo de doença para abordar problemas de saúde mental, com o objetivo de prescrever medicamentos para aliviar os sintomas. Isso deixou a Big Pharma animada, pois por fim, eles conseguiram explorar um mercado bastante lucrativo que antes era inacessível.

Com o passar das décadas, a influência da Big Pharma na criação de políticas governamentais cresceu a tal ponto que a segurança do paciente não era mais importante. No filme, David Cope foi visto participando de uma audiência pública em 2017 sobre o Projeto de Lei H4062 dos EUA, uma lei que visa exigir consentimento informado para o uso de benzodiazepínicos.

No entanto, o Projeto de Lei H4062 foi bloqueado porque os médicos reclamaram que fornecer um consentimento informado completo sobre os potenciais efeitos adversos poderia desencorajar pacientes que poderiam “se beneficiar” do uso desses medicamentos.

A última atualização sobre esse projeto de lei foi um rascunho atualizado em 2022. Ele ainda está em um impasse. O melhor que o governo dos EUA conseguiu fazer, por enquanto, foi exigir que a Big Pharma atualizasse o aviso da caixa preta sobre benzodiazepínicos “sobre seu potencial de dependência fisiológica, abstinência e outros riscos graves”.

O crescente problema da polifarmácia não pode ser ignorado

Um tema recorrente em “Medicando o Normal” é a questão da polifarmácia, que é definida como o uso simultâneo de vários medicamentos. No filme, os participantes começaram com apenas um medicamento prescrito, mas acabaram tomando vários outros. E suas histórias trazem à tona o que milhões de outros americanos estão vivenciando agora. A Health Affairs, uma revista focada em políticas de saúde, chamou a polifarmácia de “outro problema de drogas nos Estados Unidos”.

De acordo com as últimas estatísticas do CDC, 48,6% dos americanos tomaram pelo menos um medicamento prescrito nos últimos 30 dias. No mesmo período, 24% da população usou três ou mais, e 12,8% usou cinco ou mais.

Quais grupos são os mais afetados pela polifarmácia? De acordo com um estudo de 2023 publicado na Global Health Research and Policy, a polifarmácia é prevalente entre idosos, pessoas afetadas por doenças cardíacas e diabéticos.

Agora, o que acontece com a sua saúde quando você toma mais de um medicamento ao mesmo tempo? Uma combinação de sintomas pode se manifestar, como a redução do estado de , perda de apetite, erupções cutâneas, depressão, problemas cognitivos e acidentes. Além disso, tomar vários medicamentos pode aumentar o risco de interações entre fármacos.

Você está tomando muitos medicamentos prescritos?

De acordo com a Peter G. Peterson Foundation, os americanos gastam mais dinheiro em medicamentos prescritos em comparação a outras nações. Em junho de 2024, o custo médio anual do uso de medicamentos prescritos era de US$ 1.400 por americano. Em segundo lugar estão os alemães com US$ 1.000, e em terceiro estão os canadenses com US$ 865.

Se seus gastos estão se aproximando da média relatada, é hora de fazer uma reavaliação séria sobre quais medicamentos você está tomando e por quê. Dessa forma, você não só economiza dinheiro que pode ser destinado a outras despesas importantes, mas também verifica se está tomando medicamentos em excesso. Considere os seguintes sinais que podem indicar que você está sob o feitiço da polifarmácia:

Você visita vários médicos — Você pode pensar que todos os diferentes especialistas que você consulta se comunicam entre si e trocam informações sobre como ajudá-lo a resolver seus problemas de saúde. Contudo, isso não acontece.

Se você consulta um especialista para um problema específico e outro especialista para um problema diferente, um médico não sabe o que o outro prescreveu.

Novas condições de saúde aparecem — Se você estiver tomando vários medicamentos, novos problemas de saúde e sintomas podem surgir devido às possíveis interações. Antes de começar uma nova receita do seu médico, sempre faça sua lição de casa e pergunte sobre as possíveis interações e efeitos colaterais.

Você pertence a um grupo de alto risco — Se você tem mais de 65 anos, pode estar mais propenso a receber prescrições excessivas de medicamentos. De acordo com a Canadian Deprescribing Network, as mulheres também correm maior risco porque têm uma expectativa de vida mais longa e sua fisiologia aumenta o risco de eventos adversos relacionados a medicamentos.

Você tem acesso a bons cuidados de saúde — Pessoas com um bom seguro de saúde podem ter maior risco de polifarmácia. Não é incomum que pessoas nessa situação consultem vários médicos que desconhecem os medicamentos que estão sendo prescritos.

Você tem dificuldade em manter a sua medicação em dia — Quando você toma muitos medicamentos prescritos, pode começar a ter problemas para manter a frequência e o horário. Isso pode significar que você está tomando muitos medicamentos e que é necessária uma visita ao seu médico de atenção primária.

Pressão financeira — Um possível sinal de que você pode estar tomando mais medicamentos do que o necessário é a pressão financeira adicional em seu orçamento.

Estratégias para ajudar a reduzir sua dependência de medicamentos

Você pode tomar várias medidas simples para ajudar a reduzir a quantidade de medicamentos que você ou um ente querido está tomando, diminuindo assim o potencial de um evento adverso relacionado ao medicamento:

• Liste todos os medicamentos que você está tomando — Comece listando os medicamentos prescritos e os medicamentos de venda livre que você costuma tomar. Revise com seu médico todos os medicamentos prescritos por outros especialistas e veja o que você pode substituir por meio de mudanças saudáveis no estilo de vida.

Seria sensato repetir esse processo com seu médico de atenção primária pelo menos uma vez por ano. Faça isso também após receber alta do hospital devido a uma cirurgia recente. Não é incomum receber uma receita que continua em casa após sua internação no hospital.

Crie uma tabela de todos os medicamentos e apresente-a ao seu médico de atenção primária durante a revisão da medicação. O contexto é importante, então liste o motivo pelo qual você está tomando os medicamentos, quem os prescreveu, quando eles foram iniciados e os efeitos colaterais que você pode estar sentindo. Isso ajuda seu médico a ter uma visão geral.

Se você estiver consultando outros especialistas, leve a tabela com você para cada uma das consultas. Isso mantém todos os seus profissionais de saúde atualizados sobre seu plano de tratamento e todos os medicamentos que você está tomando, tanto os prescritos quanto os de venda livre (MPI).

• Use uma farmácia para todos os medicamentos prescritos — Um único farmacêutico analisando todos os seus medicamentos pode determinar possíveis interações entre suas prescrições de diferentes médicos, além de responder a quaisquer perguntas que você tenha sobre medicamentos de venda livre e suplementos.

• Preste atenção sempre que um novo medicamento for prescrito — Leia o rótulo do produto com atenção e dedique tempo para pesquisar online. Se encontrar informações que te preocupem, consulte seu médico de atenção primária. Ele pode te ajudar a elaborar uma que pode ajudar a evitar o uso de medicamentos.

No final das contas, é importante fazer um balanço de todos os seus medicamentos, pois você pode não precisar de todos eles. Conforme visto em “Medicando o Normal” e estudos publicados, a polifarmácia pode não resolver o problema. E pode até fazer você se sentir pior. Além disso, entenda que não existe uma pílula mágica que resolva todos os seus problemas de saúde de maneira instantânea. No entanto, existem escolhas de estilo de vida que contribuem muito para alcançar seus objetivos.

Se você está lidando com ansiedade e outros problemas de saúde mental, recomendo criar uma base sólida para o seu corpo e mente. Tenha uma quantidade adequada de sono de alta qualidade e incorpore uma rotina de exercícios. O exercício tem demonstrado ter melhor desempenho do que os medicamentos para a saúde mental.