Via @campograndenews | Tabeliã de Iguatemi, a 412 Km de Campo Grande, denunciou os desembargadores Alexandre Bastos, Sideni Soncini Pimentel e Vladimir Abreu ao CNJ (Conselho Nacional de Justiça) por suposto favorecimento à advogada Iolanda Michelsen Pereira, investigada por envolvimento em advocacia predatória, conforme a Operação Arnaque, do Gaeco (Grupo de Atuação Especial de Repressão ao Crime Organizado), em julho de 2023.
Os três foram alvo na semana passada da Operação Ultima Ratio da Polícia Federal, por supostos crimes de corrupção em vendas de decisões judiciais, lavagem de dinheiro, organização criminosa, extorsão e falsificação de escrituras públicas.
A denúncia ao CNJ é deste ano, mas o fato que a motivou é de 2021, quando a advogada acionou a Justiça contra a tabeliã por possível ato ilegal e abusivo. Consta que, em novembro daquele ano, Iolanda foi até o Serviço Registral de imóveis de Iguatemi para registrar uma casa que havia comprado. Entretanto, a cartorária rejeitou a averbação por entender haver irregularidade.
O imóvel comprado pela advogada tinha, na época, valor comercial de R$ 830 mil, mas o adquiriu pela metade do preço, R$ 440 mil, em negociação com o proprietário. Foram R$ 90 mil de entrada e R$ 350 mil financiados. Conforme a alegação da advogada, a oficial do tabelionato não aceitou o fato de que o imposto foi cobrado conforme o valor do contrato de financiamento e não sobre o valor de venda avaliado.
Assim, solicitou declarações por parte da assessoria jurídica da Prefeitura de Iguatemi, bem como pelo responsável pela emissão da cobrança do ITBI, que informassem a razão da cobrança a menor. Iolanda apresentou todos os documentos, ainda assim, eles foram rejeitados pela responsável pelo cartório de imóveis.
Com essa demora, a advogada correu o risco de não conseguir registrar seu imóvel, sendo que em primeiro grau, houve sentença favorável a ela para que, através de liminar, a tabeliã fizesse o registro do imóvel. O entendimento levou em conta decisão modelo do STJ (Superior Tribunal de Justiça) que definiu que cabe ao município e não aos notários “aferir, em cada caso, se o valor real da operação, ou seja, aquele indicado no contrato, coincide, ou não, com o valor de mercado (venal) do imóvel negociado”.
Viatura da PF durante Operação Ultima Ratio na semana passada. (Foto: Marcos Maluf)
De lá para cá, todas as decisões foram favoráveis à advogada, inclusive em segundo grau. Atualmente, o caso está nas mãos da vice-presidência do Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul, Dorival Renato Pavan, que após a Operação Ultima Ratio, na semana passada, assumiu a presidência da Corte.
Cofre apreendido na sede do TJ/MS durante operação da semana passada. (Foto: Henrique Kawaminami)
Outro lado
A tabeliã Perla Lilian Delgado se defende afirmando que “inexiste ato de ilegalidade ou abuso de poder”, porque é seu “dever fiscalizar de modo objetivo a documentação para ingresso de registro no sistema fólio, com base no disposto no art. 198 da Lei de Registros Públicos, emitiu nota de exigência para complementar o recolhimento do imposto apresentado (…) com manifesta discrepância do recolhido com o devido na proporção de aproximadamente 50% a menor”.
Ressalta que era necessário haver certeza do valor recolhido na transação para que não incorresse em responsabilização posterior, porque “a Guia de ITBI deixava claro o não recolhimento da edificação, e o contrato deixava claro que o valor da avaliação do imóvel era de R$ 830.000,00, faltando recolher sobre R$ 390.000,00”, e assim, emitiu as notas de exigência indicando a necessidade de recolhimento da diferença do imposto porque este “deve levar em conta o valor da avaliação no ato do registro, para evitar o risco de ser responsabilizado”.
Em manifestações anteriores, tanto o mp quanto a PGE (Procuradoria-Geral de Mato Grosso do Sul) entenderam que a alíquota havia sido cobrada a menor.
Polícia Federal também esteve no Fórum de Campo Grande para cumprir mandados contra juiz. (Foto: Bruna Marques)
CNJ
Ao CNJ, Delgado fez uma reclamação disciplinar alegando que tanto os desembargadores já citados quanto o juiz substituto de primeiro grau, porque seu nome foi encaminhado para a Corregedoria do Tribunal de Justiça “para se averiguar eventual irregularidade funcional praticada pela requerente, enquanto titular da Serventia dos Registros Públicos e Tabeliã de Protesto da comarca de Iguatemi/MS”.
Segundo ela, “tanto o Juiz Corregedor da Serventia Extrajudicial, quanto os Desembargadores atuaram em desconformidade com o código tributário do município, bem como de acordo com a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, ao apreciar a composição da base de cálculo do ITBI de imóvel lavrado na referida serventia”.
Afirma que houve inexatidão da base de cálculo pelo juiz de primeira instância, que “possui direito de ter o seu processo julgado por magistrado imparcial e que [os reclamados] agiram com fim de beneficiar a advogada impetrante Iolanda Michelsen Pereira, quando do trâmite se observa que ocorreu segundo os interesses da impetrante, ora (sic) acelerado”.
Por fim, pede ao CNJ medida liminar que não a obrigue a fazer o registro do contrato sem o devido recolhimento do imposto sobre a edificação e que o conselho “apure os fatos acima narrados, diante das supostas decisões teratológicas, instaurando-se o competente processo legal administrativo para aplicação da sanção disciplinar cabível e prevista em lei para a espécie”.
O pedido foi negado pelo ministro Mauro Campbell Marques, corregedor nacional de Justiça. Para ele, “mesmo invocações de erro de julgamento ou erro de procedimento não se prestam a desencadear a atividade correcional, salvo exceções pontualíssimas das quais se verifique de imediato, infringência aos deveres funcionais pela própria teratologia da decisão judicial ou pelo contexto em que proferida esta, o que também não se verifica na espécie”.
A reportagem entrou em contato com Perla através de sua advogada e no Cartório de Imóveis de Iguatemi, mas ela não foi encontrada.
Por Lucia Morel
Fonte: @campograndenews