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30 anos após o Genocídio em Ruanda: Valas comuns ainda são encontradas no país

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No próximo dia 7 de abril, terão início as cerimônias oficiais que lembrarão o genocídio de 1994 perpetrado contra os tútsis em Ruanda, na África.

Segundo a Organização das Nações Unidas (ONU), mais de 1 milhão de pessoas, a maioria de tútsis, mas também alguns hutus, foram assassinados no país em cerca de três meses. As celebrações terão a duração de cem dias, o mesmo período que duraram os massacres.

A tragédia teve início no dia 6 de abril daquele ano, com a morte dos presidentes de Ruanda, Juvenal Habyarimana, e do Burundi, Cyprien Ntaryamira, ambos hutus. O avião em que eles viajavam foi derrubado.

Os hutus, predominantes nos dois países, culparam a Frente Patriótica Ruandesa (RPF), dos tútsis, que, desde 1990, lutavam para retomar o poder, deles retirado em 1959. A RPF afirmou que a acusação foi um pretexto para o genocídio.

Um acordo de paz foi estabelecido em 1993, mas a iniciativa de nada adiantou, porque as desavenças, que se mantiveram intensas, explodiram a partir da morte dos presidentes.

Conforme contou a BBC, o governo já tinha listas de opositores e as entregou de pronto às milícias, que disseminaram a violência rapidamente. Moradores matavam seus vizinhos e até maridos assassinaram suas mulheres de origem tútsi, com o argumento de que morreriam caso não o fizessem.

Nas carteiras de identidade, a etnia de cada um era informada. Barreiras foram constituídas nas estradas, e, em um verdadeiro regime de exceção, cidadãos tútsis eram separados e assassinados por forças clandestinas e até oficiais. A cultura tribal fez dos facões, muito utilizados por ruandeses, um instrumento de morte.

Em 2012, o ex-secretário-geral da ONU, Kofi Annan (1938-2018), pediu desculpa por não ter tomado iniciativas mais contundentes para impedir a matança.

Ele comandou a entidade entre 1997 e 2006. Então como representante das Nações Unidas na África, Annan afirmou que ele, já um diplomata de prestígio na ocasião, e a comunidade internacional deveriam ter feito mais para evitar as atrocidades.

Reportagem da Rádio França Internacional (RFI) conta que, 30 anos depois do massacre, mais da metade da população nascida depois desses episódios ainda sente efeitos da violência.

Muitos dos sobreviventes, traumatizados, ainda não sabem onde estão os restos mortais de seus entes queridos. Em cidades como Ngoma, próxima a Huyê, antiga Butare, prosseguem as exumações de vítimas.

“Esta é a casa de Hishamunda. Hishamunda era o pai da família”, conta à RFI, Théodate Siboyintore, que observa com tristeza o terreno devastado. Ele é representante distrital da associação de sobreviventes de Ibuka.

Mostra, então, para o repórter o local da casa da filha de um dos genocidas que participaram do massacre. Há seis meses, foram descobertos ossos embaixo dessa casa.

“Como os corpos foram encontrados aqui? Isso ocorreu quando a filha quis construir uma cerca depois de construir uma casa em 2007”, conta ele. “E, enquanto cavavam, onde poderiam colocar as fundações, os pedreiros encontraram os corpos.”

A partir de então, uma grande quantidade de corpos escondidos foi encontrada no local. Primeiro, 40 de uma só vez. Na sequência, dezenas de outros, até chegar a cerca de mil, e a casa ser destruída totalmente.

Busca por vestígios de parentes

Genocídio Ruanda
População Busca Vestígios De Vítimas De Genocídio | Foto: Reprodução/Youtube/Al Jazeera

Foram 30 anos de silêncio por parte dos proprietários do terreno. “Ah, nós nos perguntamos muitas coisas”, acrescenta o representante da associação.

“Será que vivemos com pessoas que continuam assim? Depois de 30 anos, as pessoas não querem mudar? As pessoas ainda têm essa ideia de sempre ameaçar, sempre colocar os sobreviventes em perigo, com raiva.”

Em um prédio administrativo próximo ao local, ossos e as roupas das vítimas são armazenados e lavados em bacias por jovens.

São então colocados pela ruandesa Consolée Mukamana, com cuidado, em grandes lonas no chão de cimento. Em 1994, ela tinha 14 anos; hoje tem 44. Como mãe de cinco filhos, ela acha difícil dizer o que aconteceu com os avós deles. Continua em busca dos vestígios de sua mãe.

“As roupas são muito importantes para nós. Quando perdemos alguém e nos lembramos das roupas que essa pessoa usava quando foi morta, procuramos essas roupas”, explica Mukamana. “Minha mãe usava um vestido de tanga verde. Toda vez que separamos as roupas, eu procuro esse vestido”, lembra.

As roupas lavadas são dobradas por um homem. Uma camiseta amarela, um vestido infantil listrado, um tecido florido. O processo é coordenado por Alice Nyirabagina, de 41 anos.

Ela, que tinha 11 anos na ocasião, se diz chocada com o fato de as pessoas poderem ter permanecido por anos convivendo em uma vala comum.

“Quando você descobre que as pessoas dormem, comem e se lavam em valas comuns, é muito triste”, diz a coordenadora. “E mesmo hoje, eles não querem falar sobre o que aconteceu quando estavam lá, eles sabiam de tudo”, relata a ruandesa.

A proprietária da casa e seu pai, acusados de estarem ligados ao genocídio, foram presos e serão julgados. Os corpos e as roupas serão enterrados no . Antes, diz a RFI, haverá uma cerimônia organizada dentro das celebrações de 30 anos do genocídio. Será apenas a primeira.

Fonte: revistaoeste

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