Baleias e golfinhos pertencem a um grupo de mamíferos aquáticos chamado cetáceos. Eles são divididos em Odontoceti (aqueles que possuem dentes) e Mysticeti (os que têm estruturas de queratina no maxilar). Agora, um estudo (1) da Unicamp mostrou que há outra maneira de dividir esses mamíferos: em animais maiores e menores de 10 metros.
Eles possuem padrões diferentes de expressão do gene NCAPG, que é mais ativado nos cetáceos maiores, levando ao crescimento corporal, e inibido nos animais menores. Mas o ponto mais interessante é que os mecanismos de controle do tamanho podem estar relacionados à incidência de câncer. Felipe Silva, autor do estudo, explica essa relação.
A ativação e a inibição do gene estão presentes tanto nos Odontoceti quanto nos Mysticeti. Como isso aconteceu?
Os dois grupos se separaram evolutivamente por volta de 35 milhões de anos atrás. É possível que seja uma evolução convergente – ou seja, uma característica similar que não foi herdada de um ancestral comum, mas evoluiu independentemente, em resposta a pressões seletivas semelhantes.
O que o tamanho dos cetáceos tem a ver com a incidência de câncer?
O câncer nada mais é do que o crescimento desordenado de células. Estatisticamente falando, é esperado que, quanto mais células o indivíduo tenha, mais chances de algumas delas apresentarem um problema celular e originarem tumores.
Devido ao grande tamanho, os cetáceos estariam mais propensos a ter câncer. Porém, observações científicas notaram justamente o oposto: animais gigantes têm menor risco de câncer quando comparados aos menores. Essa discrepância entre o teórico e o observado é chamada de Paradoxo de Peto.
E como isso se traduz no genoma?
O gene NCAPG em si não está relacionado diretamente com o surgimento de tumores ou câncer. Mas, em uma pesquisa anterior, vimos que os genes GHSR e IGFBP7, além de promover o crescimento, também atuam na supressão de tumores, através do controle de divisão celular, migração e do ciclo celular.
O IGFBP7 também tem um padrão diferente para cetáceos gigantes e não-gigantes. Isso indica que ele pode ser mais expressado nos animais maiores, atuando tanto no crescimento quanto na contenção de tumores.
No geral, o nosso estudo pode ajudar apontando genes para análise em futuras pesquisas, além de fornecer pistas dos mecanismos pelos quais o câncer é combatido na natureza – que podemos tentar copiar para a nossa realidade.
Fonte 1. Patterns of enrichment and acceleration in evolutionary rates of promoters suggest a role of regulatory regions in cetacean gigantism. F Silva e outros, 2023.
Fonte: abril