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Música

Urias desafia o cenário musical com “Carranca”: inovação e autenticidade no pop brasileiro

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Urias acaba de abrir um novo capítulo na música pop brasileira com o lançamento de “CARRANCA”, seu álbum mais ambicioso e conceitual até aqui. Produzido por Gorky, Nave e Maffalda, o projeto marca uma virada estética e espiritual na carreira da artista mineira, costurando rap, R&B, jazz e referências afro-brasileiras em uma narrativa que atravessa fé, resistência e libertação.

Em entrevista ao POPline, Urias detalhou a construção do novo disco, destacou algumas canções, como “Águas de Um Mar Azul”, composição esquecida do grandioso Hyldon, e definiu qual é a “voz do Brasil” de hoje.

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Capa digital do álbum “CARRANCA”. Arte: Isaac Sales

O título do álbum parte de um símbolo profundamente enraizado na cultura popular. Carranca: a escultura que protege embarcações e afasta maus espíritos. É esse amuleto de força e mistério que Urias transforma em metáfora de um país em travessia:

“A carranca veio desse lugar de proteção, mas também de popularidade. É uma escultura que todo mundo conhece. A ideia era que o álbum tivesse esse mesmo apelo popular, que fosse uma proteção e, ao mesmo tempo, um espelho do Brasil”, contou a cantora.

Mais do que um novo som, “CARRANCA” representa um novo olhar. Depois de expandir os limites da música eletrônica em “Her Mind” (2022), Urias mergulha agora em uma pesquisa profunda sobre ancestralidade, tempo e identidade. O resultado é um álbum denso, de camadas e atmosferas múltiplas, em que cada faixa abre uma nova possibilidade estética.

Tudo isso sem receio de confrontar expectativas, como ela mesmo explicou:

“Eu não queria me repetir. Quis descobrir novas formas de dizer o que eu penso e sinto; e criar um som que ainda não existia dentro do pop brasileiro. Eu tenho me conectado muito mais espiritualmente comigo mesma e com as minhas raízes. Esse disco fala de coisas novas até pra mim. É um lugar de descoberta, de falar sobre o que eu mesma ainda estou aprendendo.”

Interlúdios que funcionam como bússola

O álbum foi construído com calma e liberdade criativa, em parceria com produtores que ajudaram a traduzir o conceito em som. “Foi um álbum feito sem pressa. A gente fez tudo com calma, com liberdade. Eu queria encontrar novas formas de me expressar”, diz Urias.

Entre batidas experimentais, harmonias e narrativas conduzidas por interlúdios com a voz de Marcinha do Corintho, “CARRANCA” propõe uma jornada não linear, onde passado, presente e futuro coexistem. “Os interludes funcionam como um grande norte pra história. A conversa do álbum começou por eles. Eles são a bússola que guia tudo o que vem depois”.

Esses momentos de fala e silêncio amarram o conceito central de “CARRANCA”: o tempo não é linear, mas circular. Urias explicou a origem desta ideia: “Muitas religiões de matriz africana tratam o tempo assim: tudo acontecendo ao mesmo tempo”.

Essa ideia também se manifesta na sonoridade do álbum, que mistura texturas antigas e contemporâneas:

“A gente tentou fazer uma linha do tempo musical e imagética que parecesse novidade, mas tivesse tom de nostalgia. É uma homenagem a várias etapas da música brasileira.”

Som em movimento

Se em “Her Mind” o centro era a pista, em “CARRANCA” o centro é o Brasil e suas tradições e contradições. Urias conduz o ouvinte por um território sonoro que vai do rap ao R&B, passando por eletrônica, jazz e groove. Cada faixa é uma nova camada da sua identidade artística e o mar é o que faz a música navegar.

“O mar está muito presente no álbum. Ele é símbolo de libertação, mas também de lembrança. As carrancas estavam nos navios, protegendo as viagens e isso conversa diretamente com o que eu queria dizer sobre ancestralidade e travessia”, disse.

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Foto: Mateus Aguiar

No meio de toda intensidade de “CARRANCA” surge “Etiópia”, uma das faixas mais fortes do projeto. O título faz referência ao único país africano que jamais foi colonizado (apesar da tentativa fascista) e, dentro do álbum, simboliza a reconquista da própria história. Urias transforma essa referência em uma canção sobre amor, ancestralidade e reencontro, onde a memória se torna ferramenta de resistência.

Com sonoridade elegante e produção que evoca o pop dos anos 80, a faixa ressignifica a ideia de refúgio: “A gente queria que ‘Etiópia’ fosse uma música de amor, de conforto, com groove, uma coisa dançante. Ela tem esse ar oitentista, um toque de nostalgia, mas é também sobre reencontro e pertencimento.”

Dentro do universo de CARRANCA”, “Etiópia” ainda funciona como ponto de passagem. Em outras faixas, o discurso se torna mais direto e mais terreno. Essa virada se materializa também em “Deus”, parceria com Criolo, que leva o álbum ao centro do conflito entre fé e poder. A canção revisita a música “Soca Pilão” e transforma essa herança afro-brasileira em manifesto.

“É uma música que parte de um tema tradicional, mas vira um grito sobre liberdade e apagamento religioso. A gente traz essa força ancestral pro agora”, explicou Urias. Com elementos de rock, ragga e camadas eletrônicas, “Deus” sintetiza o espírito do disco, que evoca divindade e humanidade com o mesmo fôlego.

Um presente de Hyldon

Em “CARRANCA”Urias foi presenteada com um sinal verde de Hyldon, um dos grandes nomes da soul music brasileira. Ela gravou uma música do artista dos anos 1970, mas que até aqui ainda não havia ganhado espaço no mundo. “Águas de Um Mar Azul” surgiu das pesquisas de Gorky, que foi em busca da aprovação de Hyldon para a regravação:

“O Gorky tinha acesso a essa música que o Hyldon nunca lançou. Quando ele ouviu o contexto do álbum, topou na hora. Foi um grande presente, uma confirmação de que eu estava no caminho certo”, conta Urias.

Força coletiva

Além da presença de Criolo e Hyldon nos créditos, “CARRANCA” ainda conta com outros grandes nomes: Don L, Major RD e Giovani Cidreira. “Foi um trabalho muito em conjunto. Todo mundo trouxe ideias, arranjos, solos, sons. Cada parceria somou com o universo que eu queria criar,” disse Urias.

O rapper cearense, que recentemente lançou o elogiado álbum “CARO Vapor II – qual a forma de pagamento ?”, foi citado pela cantora como uma grande referência para seu trabalho:

“O trabalho do Don L me toca de uma maneira incrível. Ele traz um apelo social de forma muito sutil e elegante. Eu queria muito trazer isso pro ‘CARRANCA’. O último álbum dele foi uma grande inspiração.”

Junto com ele e com Major RDUrias se entrega ao flow e ao rap, que agora vive um momento importante no Brasil, especialmente protagonizado por artistas femininas. Urias faz referência a elas: “Espero fazer jus às meninas do rap, porque as de hoje são muito bravas. Duquesa, Ebony, AJULIACOSTA, MC Luanna, Stefanie, Tássia Reis… Admiro e acompanho todas elas”.

A “Voz do Brasil”

A travessia de “CARRANCA” se encerra com “Voz do Brasil”, faixa que usa um sample da abertura com um dos programas mais antigos do rádio brasileiro. “A ideia de usar o sample da Voz do Brasil é muito simbólica. É um programa instaurado na ditadura, que até hoje está aí, todos os dias às sete da noite. Peguei isso pra mim e trouxe pra cá; é quase uma retomada de poder, sabe? Muitas camadas,” explicou Urias.

A canção, no entanto, também propõe uma reflexão: o que é, afinal, “a voz do Brasi” hoje? Ela responde: “Pra mim, a voz do Brasil é o movimento popular. Quando a gente entende quem é o inimigo e para de se odiar entre a gente, a gente percebe que os movimentos populares são a nossa grande salvação.”

“CARRANCA” ao vivo

No dia 20 de dezembro, Urias apresentará o show “CARRANCA” na Áudio, em São Paulo. Os ingressos já estão disponíveis em caráter de pré-venda. Além deste show, ela também será uma das atrações do BATEKOO Festival, que acontecerá no dia 15 de novembro no Sonora Garden, também em São Paulo.

Fonte: portalpopline

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