Existe uma parte irracional que fala mais alto toda vez em que entramos no mar: “e se um tubarão aparecesse aqui?” Essa voz se intensifica toda vez em que um novo filme chega, inspirado em Jaws. A boa notícia é que, segundo um novo estudo, a solução para o medo parece simples: os moluscos chocos.
Os Sepia officinalis, conhecidos como chocos, sépias ou sibas, são moluscos marinhos cefalópodes. Assim como seus primos polvos, eles também soltam uma tinta turva para confundir predadores na perseguição.
Além disso, esse bichinho é conhecido por suas mudanças de cores para se esconder, caçar, se comunicar e, segundo cientistas, quando sonham.
Agora, pesquisadores da University College Dublin analisaram a substância e descobriram que a tinta desses bichinhos pode causar desconforto aos tubarões e seu senso de olfato sensível, funcionando como um “repelente químico”.
A hipótese dos autores do estudo, publicado no jornal científico G3: Genes, Genomes, Genetics, é que a tinta pode ser usada como um impedidor de tubarões em áreas de natação de banhistas.
Claro, tubarão não é bobeira. Esses animais são o topo de várias cadeias alimentares por um motivo, são poucos – às vezes nenhum – os animais que conseguem predar esses bichanos.
Isso porque, além do tamanho, eles têm seis sentidos altamente refinados: eletromagnetismo, visão, tato, paladar, audição e olfato.
Os filmes de tubarão não mentiram quando disseram que os animais sentem cheiro de sangue a quase 500 metros de distância. O nariz de muitos tubarões é seu grande superpoder.
Mas um nariz aguçado desse jeito também tem seus lados negativos e pode ser o calcanhar de Aquiles.
No estudo publicado no G3, o time de especialistas recriou o sistema olfativo de um tubarão-gato-nebuloso (Scyliorhinus torazame) e de um tubarão-branco (Carcharodon carcharias) em laboratório e, quando os modelos foram testados contra a tinta de choco, descobriram que a melanina (principal componente da substância) tem uma estrutura molecular que permite com que ela se prenda aos receptores de olfato.
Assim, ela interrompe a percepção sensorial dos tubarões, o que significa que eles podem ser encorajados a evitar qualquer água na qual o produto químico tenha sido disperso.
Como a maioria dos tubarões têm sistemas respiratórios parecidos, o estudo deve refletir entre todas as espécies.
“Compreender como espécies de presas, como a sépia, evoluíram para explorar vulnerabilidades específicas em predadores enriquece não só a nossa compreensão dos ecossistemas marinhos, mas também fornece inspiração para ferramentas de conservação enraizadas em processos naturais”, disse o biólogo autor do estudo, Colleen Lawless, em comunicado.
Coexistência de humanos e tubarões
O Museu de História Natural da Flórida é responsável por manter o Arquivo Internacional de Ataques de Tubarão (ISAF, da sigla em inglês) atualizado. Em 2024, a organização confirmou 47 mordidas sem provocação em humanos e 24 provocadas.
De acordo com o site da ISAF, as “mordidas sem provocação” são aquelas em que uma mordida em um humano vivo ocorre no habitat natural do tubarão sem nenhuma provocação da pessoa ao tubarão.
Já as “provocadas”, são aquelas em que um humano inicia a interação com um tubarão de alguma forma. “Isso inclui casos em que mergulhadores são mordidos após tentar tocar em tubarões, mordidas em pescadores submarinos, mordidas em pessoas tentando alimentar tubarões, mordidas ocorrendo ao desengatar ou remover um tubarão de uma rede de pesca e assim por diante”, explica o site.
No ano passado, foram confirmadas sete mortes por mordida de tubarão, quatro foram casos em que não existiu provocação. Entre 1931 e agora, 114 ataques sem provocação foram confirmados no Brasil.
Segundo os pesquisadores, o uso da tinta de sépias poderia reduzir esse número de maneira orgânica. “Os métodos não letais atuais para manter os tubarões longe das praias incluem redes de emalhar e redes de pesca de tambor, que são invasivas, capturando grandes tubarões, mas também capturando tubarões inofensivos, arraias, tartarugas, golfinhos e até baleias”, escrevem em comunicado.
Garantindo tanto a segurança de banhistas, como a dos tubarões, “a tinta de choco poderia ser usada para manter os tubarões longe de regiões perigosas, como águas poluídas de áreas com intensa atividade pesqueira, melhorando assim a sua sobrevivência, uma vez que muitas espécies de tubarões são classificadas como ameaçadas de extinção”, concluiu Lawless.
Fonte: abril