Não é recente o descontentamento dos ministros do com o que veem como insubordinação dos desembargadores do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) no cumprimento de precedentes, especialmente em matéria penal.
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Foi nesse contexto que o ministro JesuĂno Rissato, do STJ, repreendeu os desembargadores paulistas em decisĂŁo no Ășltimo dia 10. âĂ flagrante o desrespeito pelo tribunal de origem da jurisprudĂȘncia desta Corte Superiorâ, escreveu, ao cassar um acĂłrdĂŁo da Seção de Direito Criminal.
O ministro terminou a decisĂŁo com um alerta: âPor fim, advirto ao tribunal estadual que os citados precedentes qualificados e jurisprudĂȘncia do STJ â principalmente o Tema 1139 âestĂŁo sendo descumpridos por aquela corte, o que prejudica a prestação jurisdicional, que deve ser justa e igual para todos os jurisdicionadosâ.
O precedente mencionado na decisĂŁo de JesuĂno Rissato trata das hipĂłteses de redução da pena por trĂĄfico de drogas. Ă consenso no STJ que inquĂ©ritos e açÔes penais em curso nĂŁo podem ser usados para impedir que rĂ©us primĂĄrios e com bons antecedentes tenham a pena reduzida.
O Tribunal de Justiça de SĂŁo Paulo, o maior do paĂs, Ă© conhecido pelas penas mais pesadas aos criminosos. NĂŁo sĂŁo raras as vezes em que a Corte toma decisĂ”es de mĂ©rito que provocam embates com o STJ.
Além disso, desembargadores paulistas costumam ignorar as recentes e frequentes decisÔes do STJ que mandam anular revistas policiais e, consequentemente todas as provas, feitas supostamente sem a observùncia da legislação.
Parte dos magistrados do Tribunal de Justiça de SP tambĂ©m entende que o trĂĄfico de drogas, por exemplo, Ă© um crime grave, que envolve necessariamente violĂȘncia e grave ameaça.

A advertĂȘncia gerou mal-estar entre os desembargadores. O presidente da Seção de Direito Criminal, Adalberto JosĂ© Camargo Aranha Filho, , divulgada no site institucional do Tribunal de Justiça, em que rebate o ministro.
O desembargador afirma que, ârespeitosamenteâ, discorda da constatação. Diz ainda que o sistema de precedentes ânĂŁo pode pretender padronizar decisĂ”es judiciais e, indevidamente, submetĂȘ-las Ă lĂłgica do tudo ou nadaâ.
A nota defende tambĂ©m a ideia de que cada magistrado teve ter autonomia para decidir âde acordo com sua livre convicção motivada a partir dos elementos circundantes do casoâ, conforme consta expressamente do CĂłdigo de Processo Civil.
âAs multifacetadas situaçÔes do processo demandam soluçÔes especialmente adequadas Ă s vicissitudes fĂĄtico-jurĂdicas de cada casoâ, diz o texto. âO necessĂĄrio e crescente aperfeiçoamento de um sistema de precedentes nĂŁo pode servir, em absoluto, ao confisco da atividade hermenĂȘutico-concretizadora jurisdicional.â
Ă vista da observação recentemente lançada pelo Eminente Ministro JesuĂno Rissato, Desembargador convocado, por ocasiĂŁo de decisĂŁo monocrĂĄtica no Habeas Corpus 913210-SP, proferida no Ășltimo dia 10 de junho, nos advertindo que os precedentes qualificados e a jurisprudĂȘncia do Colendo Superior Tribunal de Justiça estĂŁo sendo descumpridos por este EgrĂ©gio Tribunal de Justiça, a PresidĂȘncia desta Seção de Direito Criminal, respeitosamente, discorda dessa constatação que deve ser examinada com cautela.
Ă evidĂȘncia, nĂŁo se ignora a necessidade de observĂąncia Ă s posiçÔes jurisprudenciais consolidadas, em atenção aos princĂpios da isonomia e da segurança jurĂdica, importantĂssimas ferramentas de nosso Estado DemocrĂĄtico de Direito, como tem sido reconhecido no plano constitucional, desde a Emenda 45/2004, com a criação das sĂșmulas vinculantes, bem como na esfera legislativa, com significativas alteraçÔes na legislação processual, com o escopo de reduzir os nĂveis de uma indesejada insegurança jurĂdica.
Entretanto, nĂŁo se pode perder de vista que a formação de um sistema brasileiro de precedentes nĂŁo pode pretender padronizar decisĂ”es judiciais e, indevidamente, submetĂȘ-las Ă lĂłgica do tudo ou nada, porque nĂŁo raras as vezes, as multifacetadas situaçÔes do processo demandam soluçÔes especialmente adequadas Ă s vicissitudes fĂĄtico-jurĂdicas de cada caso.
A intangibilidade do espaço de liberdade atribuĂdo a cada Magistrado de decidir de acordo com sua livre convicção motivada a partir dos elementos circundantes do caso deve ser observada, nĂŁo apenas como garantia de sua independĂȘncia funcional, mas sobretudo como valioso instrumento de salvaguarda dos direitos e garantias fundamentais.
O necessĂĄrio e crescente aperfeiçoamento de um sistema de precedentes nĂŁo pode servir, em absoluto, ao confisco da atividade hermenĂȘutico-concretizadora jurisdicional.
Adalberto José Queiroz Telles de Camargo Aranha Filho, presidente da Seção de Direito Criminal
Redação , com informaçÔes da AgĂȘncia Estado
Fonte: revistaoeste