“Finalmente estamos voltando”. Após 15 anos longe do Brasil, os Buzzcocks preparam seu retorno com uma turnê que celebra cinco décadas de história e também abre caminho para o novo. Em entrevista exclusiva para o ROCKline, o guitarrista e vocalista Steve Diggle celebrou esse reencontro com os fãs, o impacto da banda no punk e os desafios de seguir em frente sem seu parceiro criativo, Pete Shelley.
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Foto: Instagram @the_official_buzzcocks
Os Buzzcocks desembarcam no Brasil no próximo mês para três shows no país, com paradas em São Paulo, Curitiba e Porto Alegre. O retorno, é claro, vem carregado de expectativas e saudade, como confirmou Steve: “Estamos tocando em todos os lugares, e ir ao Brasil agora vai ser maravilhoso. Eu adoro o público daí, são tão entusiasmados. Precisamos de alguma inspiração neste mundo, e estar juntos num mesmo lugar novamente vai ser especial.”
A volta do grupo britânico ao nosso país acontecerá em um momento especial. Os Buzzcockscomemoram 50 anos de banda em 2025 – um feito raro no mundo da música, especialmente no universo punk. Mesmo com a longa estrada no currículo e quase 70 anos de idade, Steve garante que fazer shows ainda lhe traz uma energia sem igual e cada apresentação é diferente.

Foto: Instagram @stevediggleofficial
Para ele, as músicas do Buzzcocks atravessaram o tempo muito bem, afinal de contas eles cantam sobre a condição humana:
“Eu tinha 20 anos quando começamos — agora estou ficando velho. Mas o mais bonito é ver como as músicas ainda passam no teste do tempo. Algumas parecem que foram feitas ontem. Acho que o que sempre fez (a banda) funcionar foi que cantamos sobre a condição humana. Isso nunca fica velho. Às vezes é até mais difícil ser simples do que ser complicado. Mas a simplicidade funciona e é isso que conecta as pessoas,” disse Steve.
50 anos de banda não é para qualquer um. O resultado dessa longa trajetória é uma base de fãs sólida, mas que se renova e ganha força das formas mais distintas possíveis. Desde outros artistas que já confirmam a inspiração no Buzzcocks, como Green Day, Nirvana, U2, PearlJam e R.E.M., até um grande clássico dos caras que foi parar na trilha sonora de um filme infantil – no caso, “Shrek”.
“Nunca pensamos que íamos inspirar ninguém. Era só o nosso som. Mas com o tempo vimos o quanto influenciamos. Nirvana, Pearl Jam, U2, R.E.M… é inacreditável. A classe inteira nos amava, e só percebi isso muito depois. Você ouve um disco do Green Day e pensa: é Buzzcocks ali. Mas isso não se fabrica. Se acontecer, é um bônus,” comentou Steve.
Já sobre a conexão com novas gerações, ele afirma que é “mágico”:
“É engraçado pensar que ‘Ever Fallen in Love’ está num filme infantil como o ‘Shrek’. Eu nunca imaginei isso e pra ser sincero, eu nem vi o filme até hoje! Mas é incrível. Muita gente mais jovem nos descobriu por isso. […] Nossa música também esteve em outros filmes, como ‘Why Can’t I Touch It?’ (em português ‘Mulheres do Século 20’) – cantei esse refrão na rua recentemente, com caras cantando comigo. Esse tipo de coisa conecta as pessoas. É mágico.”
Os Buzzcocks fizeram e ainda fazem história no punk, desde o surgimento da banda na cena britânica no final dos anos 1970. Questionado sobre fazer música em 2025 e manter o punk cru – tal qual ele é -, enquanto uma gama de artistas utilizam de ferramentas de tecnologia, como algoritmos e inteligência artificial, Steve disse:
“Hoje em dia todo mundo grava no computador. Pode soar bem, mas falta alma. Você nunca ouviu um computador cantar para você de verdade, ou cantar ‘Ever Fallen In Love’. Nós não somos máquinas. O público também não é. É por isso que as emoções têm que estar ali — até os erros contam. Isso é o que torna tudo real.”
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Steve continuou:
“O punk hoje é diferente, claro. Em 1976 e 1977, tínhamos uma identidade muito forte. Os Sex Pistols, The Clash, The Jam, The Damned, nós… cada banda tinha sua própria voz. A gente escreveu o script, e agora os outros estão jogando o jogo. O problema é que hoje muitas bandas parecem copiar esse molde sem trazer algo novo. Não quero soar arrogante, mas ainda não ouvi nada que seja melhor do que aquelas bandas do núcleo. A essência está lá, mas falta aquele choque, aquele espírito rebelde.”
Mesmo com as divergências em relação ao presente e o passado, Steve Diggle vê uma cena promissora se formando na Inglaterra: “Vejo uma nova onda de bandas de guitarra surgindo, e isso é promissor. Talvez estejamos voltando ao espírito de 1976, quando ninguém queria assinar bandas como a nossa, mas a gente fazia mesmo assim.”
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Desde a perda de Pete Shelley, que morreu em dezembro de 2018, Steve Diggle assumiu o comando criativo do Buzzcocks com o álbum “Sonics in the Soul”(2022) e confessou que já trabalha em um novo disco com 14 faixas compostas em três semanas. Para ele, é essencial seguir criando.
“Com o Pete, a gente escrevia juntos, dividíamos ideias. Quando ele se foi, eu pensei: e agora? Mas eu sabia que precisava continuar. Em ‘Sonics in the Soul’, escrevi músicas pensando nele — coloquei um pouco de Pete ali. Foi quase um processo de luto criativo. Mas também tive que me encontrar como artista. Manter os ingredientes do Buzzcocks, mas explorar outras avenidas,” contou.
Já sobre o novo álbum, que segundo ele será finalizado nos próximos meses, Steve disse:
“Escrevi o disco como um livro. Um capítulo por vez. Não são apenas músicas reunidas, mas uma experiência que precisa ser ouvida do começo ao fim. Porque hoje em dia as pessoas só pegam a faixa do Spotify e pronto. Eu quis dar uma jornada completa. […] Escrevi tudo em três semanas. Eu estava em turnê direto, mais de 90 shows no ano, mas sabia que precisava criar. Reuni a banda no estúdio por alguns dias, gravei todas as guitarras, todas as faixas, e agora estamos na fase de mixagem.”
Mesmo após cinco décadas de história, os Buzzcocks seguem olhando para frente. Ícones de uma geração que ajudou a moldar o rock moderno, Steve Diggle e seus companheiros provam que relevância não se limita ao passado.
Mesclando clássicos atemporais com novas composições cheias de energia, a banda reafirma seu status de lenda viva e em constante movimento. A promessa de continuidade vem do próprio líder: “Enquanto estiver vivo, vou continuar fazendo isso.”
Fonte: portalpopline