O Brasil está se tornando menos interessante para famílias de alta renda. Estudo da Henley & Partners, uma consultoria que ajuda milionários a se realocarem em outros países, estima que 1,2 mil pessoas com patrimônio pessoal acima de US$ 1 milhão planejam deixar o país neste ano.
O número é 50% superior ao registrado em 2024. Uma outra estimativa, do Instituto Millenium, indica que quase um quinto dos milionários deixou o país nos últimos dez anos.
Segundo o estudo da Henley & Partners, entre os países analisados, o Brasil é o sexto que mais deve perder milionários, atrás de Reino Unido (16,5 mil), China (7,8 mil), Índia (3,5 mil), Coreia do Sul (2,4 mil) e Rússia (1,5 mil). Caso de fato se mudem do Brasil, os milionários levarão consigo cerca de US$ 8,4 bilhões — ou R$ 46 bilhões, considerando o dólar a R$ 5,48 (cotação do dia 21 de agosto).
Mas o impacto econômico não é o único. Leonardo Chagas, especialista em investimentos e gestão de patrimônio e que contribuiu com o Instituto Millenium, afirma que a perda vai além do dinheiro, já que o país perde cérebros.
“Vão embora empresários, executivos e investidores com experiência para criar negócios e inovar. Essa ‘fuga de cérebros’ enfraquece o ecossistema de startups e a capacidade do país de competir globalmente”, afirma.
Além disso, na visão do especialista, a saída da elite envia uma mensagem péssima para o investidor estrangeiro. A lógica é simples: se os próprios brasileiros estão desistindo do país, por que alguém de fora deveria investir aqui? Desse modo, a fuga de milionários aumenta a percepção de risco e afasta o capital externo do país.
Chagas ainda comenta que a mentalidade de quem fica também é afetada. “Reforça-se uma cultura de aversão ao risco e de curto prazo. Em vez de investir no Brasil, a prioridade passa a ser proteger o patrimônio e enviar dinheiro para fora. O engajamento com os problemas do país diminui, inclusive as doações para projetos sociais, que já são baixas”, diz.
Violência é uma das principais razões para deixar o Brasil
Dentre as razões para sair do Brasil, a falta de segurança é uma das principais. Chagas afirma que a violência generalizada força essas famílias a viverem com medo, mesmo investindo em carros blindados e condomínios fechados.
“A preocupação com a segurança dos filhos costuma ser o gatilho final para a mudança”, afirma.
Outros fatores também contribuem, além da violência. Segundo a Henley & Partners, que também lista a segurança em primeiro lugar, preocupações financeiras, impostos, aposentadoria, oportunidades de trabalho e de educação para os filhos e padrão de vida influenciam nesta decisão.
Leonardo Chagas, do Millenium, ainda afirma que, no caso brasileiro, há uma forte percepção de que o “contrato social” foi rompido. “Pagam impostos altos [as pessoas de alta renda], mas não recebem bons serviços públicos em troca. Por isso, arcam com custos duplicados de saúde, educação e segurança”, afirma.
Outro ponto relevante é a instabilidade política e econômica do país. Nesse sentido, Chagas elenca as mudanças de regras a todo momento e a volatilidade da moeda, que geram um “cansaço profundo”. “No fim, a decisão é uma busca por paz, previsibilidade e um futuro mais estável para a próxima geração em países como Estados Unidos e Portugal”, afirma.
Brasil perdeu quase um quinto dos milionários na última década
Segundo o Instituto Millenium, entre 2014 e 2024, o Brasil perdeu 18% de seus milionários. No caso do Reino Unido, que lidera o ranking do êxodo de alta renda, a situação se deve a medidas do Partido Trabalhista, eleito em 2024.
As iniciativas inglesas para “taxar os ricos” incluem o fim da permissão para que residentes estrangeiros evitem impostos sobre rendimentos e ganhos no exterior, e o aumento de impostos sobre heranças e ganhos de capital.
“O resultado foi uma fuga acelerada de milionários, que buscam preservar seu patrimônio em países com maior segurança jurídica e liberdade econômica. Em vez de aumentar a arrecadação, as medidas já a derrubaram em 18%. Ou seja, não foi bom para ninguém”, afirma o Millenium em publicação nas suas redes sociais.
Êxodo de milionários drena a economia
Aqui não acontece de forma diferente. Segundo Leonardo Chagas, o movimento drena a economia e gera perda de capital. E não para por aí: o dinheiro que sai deixa de financiar novas empresas, gerar empregos ou movimentar o mercado imobiliário e de consumo. Como ocorre no Reino Unido, a arrecadação de impostos também cai.
“O governo perde contribuintes importantes e o dinheiro que eles gastariam em produtos e serviços. Esse rombo fiscal limita a capacidade do Estado de investir em melhorias, criando um ciclo vicioso”, explica Chagas.
Por fim, a saída dos milionários ainda enfraquece o mercado de luxo e os serviços qualificados, como arquitetura e gestão de patrimônio, o que também prejudica a manutenção e expansão desses setores.
Brasileiros têm buscado destinos alternativos
Apesar da estabilidade, nações como Estados Unidos, Portugal e Itália têm criado barreiras para dificultar a entrada de estrangeiros, mesmo famílias de alta renda. Desse modo, alguns brasileiros também têm buscado outros destinos.
Os Emirados Árabes Unidos, por exemplo, lideram o ranking da Henley & Partners de nações que recebem famílias de alta renda – eles devem receber um total de 9,8 mil milionários neste ano. De acordo com a empresa, o imposto de renda zero para pessoas físicas, a infraestrutura de classe mundial, a estabilidade política e a estrutura regulatória contribuem para a liderança.
Em seguida no ranking, estão Estados Unidos, Itália, Suíça, Arábia Saudita, Singapura, Portugal, Grécia, Canadá e Austrália.
Fonte: gazetadopovo