Na última semana, o ministro Luís Roberto Barroso, presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), entrou para o rol dos pretensos civilizadores da nação brasileira ao dizer que pretende . Em uma tacada só, sua frase pressupõe que ele seja civilizado, e nós não, que ele saiba o que é melhor para nós, e nós não.
A pretensão de civilizar o outro geralmente faz parte daquelas ambições que expõem mais quem quer civilizar do que o objeto da varinha mágica civilizatória. No melhor estilo “quando Pedro me fala de João, sei mais de Pedro que de João”.
“A pretensão civilizatória, nesse sentido, é narcísica e egoica”
Andre Marsiglia
Diversos capítulos da nossa história foram cruéis e violentos em nome da pretensão de civilizar o outro, em nome da ambição dos que se julgam a última bolacha do pacote e querem ver no outro o espelhamento de si. A pretensão civilizatória, nesse sentido, é narcísica e egoica.
E caso o civilizador, além de narcisismo, possuir também poder, o resultado de seu desejo pode ser trágico. A diferença entre Napoleões de manicômios e o imperador da é muitas vezes o poder dado a um e a outros não. Ter poder é muitas vezes o que faz um ser levado a sério e outros serem levados a uma sessão de terapia.
A pretensão barroseana não se destina, naturalmente, às salas de aula, livros ou debates públicos. Por se tratar do legado de uma Corte com muito — talvez todo — poder, a coisa pode acabar ainda muito pior do que está hoje.
Nossos ministros do STF, decerto cientes disso, pretendem o quê? Ver o Brasil queimar em uma indesejável guerra como a promovida pelo Estado contra o arraial de Canudos, desta vez, um arraial virtual, que responde pelo nome de Twitter/X, e seus novos Antônios Conselheiros? Não percebem os danos e o ridículo histórico que pretensões como essa impuseram à nação? Não percebem que declarações como essa desestabilizam o país?
“Juízes que contribuíram com a civilização do país civilizaram, antes, a si mesmos e a seus colegas”
Andre Marsiglia
Os grandes juízes que o Brasil já teve foram grandes por não se preocuparem com legados, por entrarem e saírem satisfeitos de terem cumprido sua função de forma discreta, sem sua assinatura ou grife terem sido mais relevantes que o conteúdo de seus votos. Juízes que contribuíram com a civilização do país civilizaram, antes, a si mesmos e a seus colegas, curando as ambições narcísicas com que o poder lhes acenou.
é advogado constitucionalista especialista em liberdade de expressão. Professor de Direito Constitucional e doutorando pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Especialista do
Fonte: revistaoeste