Um novo estudo sugere que um medicamento conhecido como nitisinona pode tornar o sangue humano tão tóxico para os mosquitos que eles morrem poucas horas após se alimentarem. Para a equipe responsável pela pesquisa, essa pode ser uma futura solução para a malária.
No experimento, os mosquitos morreram mesmo após consumir amostras de pacientes que receberam doses relativamente baixas do fármaco.
A nitisinona, originalmente desenvolvida par ser um herbicida, é usada para tratar alguns transtornos metabólicos hereditários raros, como a tirosinemia tipo I. Ela funciona inibindo uma enzima específica, chamada HPPD, tanto em humanos quanto nos mosquitos. Sem essa enzima, porém, o mosquito não consegue digerir a sua refeição de sangue e morre.
A malária é uma doença infecciosa causada por parasitas do gênero Plasmodium, transmitidos pela picada do mosquito Anopheles. Os principais sintomas são febre, calafrios, dor de cabeça e fadiga. Se não tratada, pode ser fatal.
Todos os anos, mais de 600 mil pessoas morrem pela doença. É uma das doenças tropicais mais conhecidas e continua sendo um sério problema de saúde pública em várias partes do mundo, especialmente na África Subsaariana, Ásia e América do Sul. De acordo com a Organização Mundial de Saúde (OMS), 95% das mortes por malária em 2023 ocorreram na Região Africana e 76% das mortes por malária nessa região foram de crianças menores de 5 anos.
Sua transmissão ocorre pela picada da fêmea do mosquito Anopheles infectada com o parasita Plasmodium. Ao picar uma pessoa, o mosquito injeta os parasitas na corrente sanguínea, iniciando a infecção. Também pode ser transmitida, mais raramente, por transfusão de sangue contaminado, compartilhamento de seringas ou de mãe para filho durante a gravidez. Há medicamentos para tratar a doença, mas nem sempre bastam – em algumas regiões, o parasita desenvolveu resistência.
Em um estudo publicado na revista Science Translational Medicine, cientistas propõem o uso de nitisinona para afetar a cadeia reprodutiva dos mosquitos transmissores da malária.
A nitisinona não impede a infecção por malária nem trata a doença, mas poderia ajudar a controlar surtos ao matar mosquitos após eles picarem pessoas que tomaram o remédio, evitando a reprodução do Anopheles. Usada em combinação com outras medidas, poderia ser eficaz onde os parasitas desenvolveram resistência aos tratamentos comuns. No corpo humano, o medicamento permanece eficaz por até 16 dias após a dosagem inicial, ou seja, durante esse período inteiro funcionaria como um tipo de veneno para mosquitos.
Além disso, por ser um medicamente aprovado para uso, a nitisinona já passou por testes de segurança, e por isso seu hipotético uso contra doenças transmitidas por mosquitos exigiria menos aprovações e etapas regulatórias. O fármaco é autorizado inclusive para recém-nascidos e crianças pequenas, e não há registros de efeitos adversos em gestantes.
Porém, existem problemas com essa ideia. Um deles tem a ver com o custo da medida. À National Geographic, George Dimopoulos, biólogo molecular especializado em doenças transmitidas por mosquitos na Escola de Saúde Pública Johns Hopkins Bloomberg lembra que “qualquer coisa que se torne cara e custosa não vai funcionar, especialmente para um método de intervenção como esse, em que você não protege o indivíduo da malária, mas protege a população como um todo.”
Isso porque a raridade das doenças que a nitisinona trata significa que o medicamento ainda é muito caro para ampla implantação – principalmente para países africanos com poucos recursos.
No futuro, a nitisinona pode ser combinada com medicamentos antimaláricos ou aplicada em animais, que funcionariam como iscas para mosquitos. Outra possibilidade é usá-la em néctar envenenado, uma técnica que atrai mosquitos sem afetar outros polinizadores. Assim, o medicamento poderia agir sem precisar ser administrado diretamente em humanos.
De qualquer forma, são apenas ideias, por enquanto. A malária segue sendo um problema de saúde sem uma solução única.
Fonte: abril