Aurora aos 25 anos de idade estava graduada em Letras, sua segunda faculdade. Antes havia cursado história. Recentemente, havia conseguido o emprego como professora de língua inglesa num colégio particular de renome da capital. Namorou um rapaz, também professor da mesma escola, que a convidou a participar de um jogo de cartas, com apostas em dinheiro, num local clandestino nos fundos de uma residência, situada no centro da cidade. De início, Aurora não aceitou o convite do namorado, mas, com alguma insistência, ele conseguiu levá-la à casa em que se reunia com outras pessoas, duas ou três vezes por semana.
Assim como o namorado, Aurora passou a jogar com frequência e ambos, que pretendiam noivar e começar a aquisição juntos de móveis para o futuro casamento, já estavam descapitalizados e devendo dinheiro na praça. Logo, por causa das dívidas e frequentes desentendimentos por falta de dinheiro, o relacionamento terminou e Aurora dirigiu-se a outra casa de apostas, que foi informada por um colega de jogo, pois não queria ficar no mesmo local que o ex-namorado frequentava há mais tempo.
Aurora continuou os jogos e parecia ser conduzida automaticamente ao local de jogatina, perdendo cada vez mais e endividando-se dia a dia. Vendeu seis pares de sapatos dos sete que possuía, vendeu seu carro, fez empréstimos bancários, solicitou antecipações de parte de seu salário todos os meses.
Não conseguia mais cuidar de si, faltava ao serviço ou chegava visivelmente cansada, devido às noites em claro no ambiente de jogo. Tudo que ganhava se destinava a novos jogos e um pouco ao pagamento parcial de suas dívidas.
Seus pais moravam no interior e as visitas da filha a eles estavam cada vez mais escassas e já viam sua aparência modificada, até que procuraram insistentemente saber o que estava acontecendo com ela, quando descobriram que Aurora devia na praça o equivalente a um carro popular. Foi quando a levaram a um atendimento religioso, onde houve a indicação de procura profissional. Foi conduzida a um psiquiatra, medicada e encaminhada à psicoterapia para um tratamento integrado psiquiátrico e psicológico. Foi também orientada a procurar um grupo de apoio a jogadores.
Aurora estava sofrendo de Jogo Patológico, que é um transtorno psiquiátrico relacionado ao vício em jogar de forma persistente, em que o doente lança mão de parte ou de todo seu dinheiro ou de seu patrimônio, ignorando as consequências por seus atos, tornando-se incapacitado para gerir sua vida e seus bens. A pessoa com esse sofrimento não consegue usar o dinheiro que ganha para outra coisa que não seja o jogo, negligencia sua própria alimentação, saúde e aparência pessoal.
O jogo patológico, apesar de não ser uma dependência química, age como se fosse, com a sensação de prazer momentâneo durante o jogo, mesmo com as perdas. Há necessidade de jogar cada vez mais, com o objetivo de recuperar o dinheiro perdido ou apenas pelo prazer sentido no ato de jogar.
O jogador está sempre preocupado com o jogo, esperando-o ansiosamente e indo até ele, mesmo que tente controlar-se para não jogar ou para interromper um jogo iniciado. Irrita-se com facilidade, quando não consegue ir ao jogo e mente frequentemente sobre suas perdas financeiras. É muito comum a separação de relacionamentos estáveis por causa do comportamento impróprio e irresponsável do jogador, com dívidas e falta de recursos para sustentar a família.
O tratamento deve ser feito de forma integrada pela psiquiatria e pela psicologia, com grandes chances de recuperação. Mas, para isso, há necessidade de que esses profissionais sejam procurados pelos jogadores, voluntariamente, ou que estes sejam estimulados a essa procura.
Hoje, Aurora continua dando aula de inglês, agora como concursada do município. Evita jogos, mesmo por simples brincadeira com amigos. Conta seu caso aos mais chegados e para os outros diz apenas que não sabe jogar ou que não gosta de tal diversão. Está com casamento marcado com André, que tem como vício apenas o futebol, isso quando é seu time que entra em campo.
Fonte: primeirapagina