Quando apoiadores do ex-presidente Jair Bolsonaro invadiram primeiro o Congresso Nacional, e depois o Palácio da Alvorada e o Supremo Tribunal Federal (STF), no domingo 8, autoridades de todo o mundo iniciaram quase imediatamente comparações com o ataque ao Capitólio dos Estados Unidos, em washington, DC, no dia 6 de janeiro de 2021.
Na ocasião, uma turba de partidários do então presidente Donald Trump, do Partido Republicano, forçou sua entrada na sede do Congresso americano após um comício do líder, na tentativa de impedir a certificação dos resultados da eleição – que ele perdeu – pelo legislativo.
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A aproximação não é à toa. Em ambos os casos, no centro dos acontecimentos está um presidente derrotado que afirma, falsamente, que a eleição a que concorre será fraudada (em caso, é claro, de sua derrota). Após meses de alegações infundadas de fraude, uma multidão enfurecida de seus apoiadores invade instituições do governo. A turba, então, consegue avançar pela polícia e vandalizar a sede do governo, ameaçando democracia do país.
Bolsonaro, durante meses, tentou minar os resultados de uma eleição que ele perdeu, da mesma maneira que Trump fez após sua derrota nas eleições presidenciais de 2020. Os aliados de Trump, que ajudaram a espalhar informações falsas sobre as eleições de 2020, também trabalharam para semear dúvidas nos resultados das eleições presidenciais do Brasil em outubro.
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Esses esforços culminaram, no domingo, em uma tentativa de seus apoiadores anularem, por meio da invasão da Praça dos Três Poderes, os resultados da eleição do Brasil e devolver o ex-presidente ao poder. Da mesma forma que ocorreu nos Estados Unidos em 6 de janeiro de 2021, a multidão em Brasília conseguiu avançar sobre a polícia no perímetro do prédio que abriga o Congresso e invadiu os corredores do poder, quebrando janelas, roubando itens valiosos e posando para fotos nas câmaras vazias do legislativo.
O estado de espírito dos invasores em ambos os casos parecia ser semelhante. Devido a inúmeras postagens de fotos, vídeos e transmissões ao vivo nas redes sociais feitas dentro e fora das sedes do governo, ficou claro seu desejo de aparecer na mídia, incorporando um ato de suposto heroísmo e patriotismo.
Além disso, as duas invasões se assemelham na forma como foram planejadas – e repetidamente anunciadas – nas redes sociais e plataformas online de mensagens, como WhatsApp e Telegram.
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A complacência das forças de segurança é outro ponto em comum, embora as razões sejam um pouco diferentes. A segurança do Distrito Federal estava a cargo de Anderson Torres, ministro da Justiça de Bolsonaro, e policiais militares indiretamente subordinados a ele não só permitiram as invasões, como foram flagrados filmando os atentados. Em Washington, as forças de segurança não protegeram o prédio do Congresso, mas a cidade era — e continua sendo — administrada por uma democrata, Muriel Bowser. Por essa razão, a polícia local sentiu constrangimento em cercar o Capitólio antes do novo presidente, também um democrata, assumir.
Os dois ataques, no entanto, não se alinham completamente. Enquanto a turba americana estava tentando impedir a certificação oficial dos resultados da eleição de 2020, uma etapa final e cerimonial antes da posse do novo presidente, Joe Biden, no Brasil, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) já havia assumido o cargo há mais de uma semana.
Os resultados da eleição brasileira são certificados pelo Supremo Tribunal Eleitoral (STE), não pelo Congresso, e não houve tentativa oficial para interromper qualquer procedimento no domingo – os deputados e senadores sequer estavam em sessão.
Se os atentados em Brasília produziram o triplo de estrago da invasão do Capitólio há dois anos – não só material, mas em risco para segurança nacional devido à possibilidade de acesso a documentos importantes –, o que ocorreu nos Estados Unidos foi mais grave do ponto de vista político e institucional.
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Outra diferença é que Bolsonaro, apelidado pela mídia internacional de “Trump dos Trópicos”, não seguiu à risca o manual do colega e não estava em Brasília, como Trump estava em Washington, durante o ataque. O ex-presidente brasileiro fixou residência na Flórida, a cerca de 240 quilômetros da residência do republicano em Palm Beach. Fora do cargo há uma semana, ele não fez uma convocação pública explícita para os ataques deste domingo, ao contrário do ex-presidente americano.
Em um último eco do ataque de 6 de janeiro, horas após o início da invasão em Brasília, Bolsonaro postou uma mensagem nas redes sociais pedindo paz, da mesma forma que Trump fez. As autoridades já haviam anunciado que tinham a situação sob controle.
Na noite de domingo, Bolsonaro disse que “manifestações pacíficas” fazem parte da democracia, mas “depredações e invasões de prédios públicos como ocorridos no dia de hoje, assim como os praticados pela esquerda em 2013 e 2017, fogem à regra”.
Fonte: Veja