Combate ao Mosquito
Ciência & Saúde

Macacos-prego de Minas Gerais atingem estágio evolutivo da Pedra Lascada: descoberta revela avanço surpreendente

2025 word2
Grupo do Whatsapp Cuiabá

Há 3,3 milhões de anos, a humanidade entrava no período Paleolítico, ou período da Pedra Lascada. Nessa época, muito antes dos Homo sapiens surgirem, os hominídeos moldavam pedras para a produção de ferramentas que ajudavam na sua sobrevivência.

Agora, um novo estudo descobriu que um grupo de macacos-prego de Montes Claros, Minas Gerais, alcançou esse mesmo estágio evolutivo. O mesmo artigo, porém, levanta dúvidas sobre o que sabemos da nossa própria evolução.

A notícia não é exatamente novidade. Há mais de 10 anos, cientistas estudam o comportamento de símios que encontraram alternativas criativas para abrir frutos e sementes. Alguns pesquisadores acreditam que os chimpanzés, por exemplo, já estão na fase da pedra lascada há mais de quatro mil anos. Os macacos-de-rabo-longo (Macaca fasciularis), da Tailândia, usam a mesma técnica.

Muitos outros primatas fazem algo parecido, usando ocasionalmente pedras, mas também galhos, caules e outros materiais. Esse é o caso dos nossos primos na escala evolutiva, os gorilas, bonobos e orangotangos. 

Mas há um detalhe importante nessa história: os macacos-prego mineiros não fazem suas ferramentas lascadas intencionalmente. Por isso, pesquisadores questionam se o que até então era visto como o marco na sofisticação cognitiva dos hominídeos pode ter sido também não intencional. 

“O que o nosso estudo está mostrando é que, na verdade, as lascas são formadas por acaso quando os animais quebram os frutos”, conta Waldney Pereira Martins, professor da Universidade Estadual de Montes Claros (Unimontes), que participou da pesquisa publicada no site científico PNAS. A brasileira Paula Medeiros também colaborou no artigo. 

Os macaquinhos mineiros, Sapajus xanthosternos (macaco-prego-do-peito-amarelo), estão longe dos Homo sapiens na linhagem evolutiva.

Justamente por essa distância, a descoberta abala o conhecimento sobre nossos ancestrais da Idade da Pedra: os materiais encontrados pela equipe em Montes Claros se equiparam com os artefatos recolhidos em sítios arqueológicos na África, consideradas as ferramentas mais antigas feitas por hominídeos primitivos.  

Macacos artesões?

O estudo descreve um comportamento comum por parte dos bichinhos. “Eles apoiam a fruta em uma pedra maior, que chamamos de ‘bigorna’, e usam uma pedra menor, que eles levantam e batem no fruto para quebrá-lo – esse é o ‘martelo’”. Acontece que, da mesma forma que é difícil mirar sempre na cabeça de um parafuso com um martelo, para esses animais também é. “Às vezes, a ferramenta golpeia a bigorna e formam as lascas – tudo de maneira não intencional”, diz Martins.

“Nossa análise desses registros [feito pelos macacos-prego] demonstra muitas das características arqueológicas que são associadas à produção intencional de lascas”, escrevem Tomos Proffitt e Lydia Luncz, do Instituto Max Planck de Antropologia Evolutiva, principais autores do estudo. “Isso inclui as pedras ‘martelo’ com dano substancial em virtude do impacto e uma série de pedaços lascados e separados.”

O pesquisador brasileiro explica que a descoberta “nos faz questionar se de fato houve um avanço na inteligência, ou um salto evolutivo, a partir do momento em que nossos ancestrais começaram a utilizar a pedra lascada – e se ela foi fabricada intencionalmente”. A criação de apetrechos exige uma complexidade bem maior dos sistemas cognitivos, em comparação com o uso conveniente de materiais da natureza. 

Claro, isso não exclui as habilidades dos mineirinhos. A pesquisa dá mais força para uma ideia que vem sido dispersa há um tempo: esses símios seguiram uma estrada evolutiva similar a nossa. 

“Analisando outros conjuntos de pedra lascada criados por primatas e hominídeos, revela-se que a produção intencional de lascas é um componente universal do uso do martelo e bigorna, sugerindo que comportamentos similares dos primeiros hominídeos pode ter levado à tecnologia de pedra lascada”, escrevem os cientistas.

Martins explica, porém, que um mesmo caminho evolutivo não quer dizer que os bichinhos lerão essa nota em alguns milhões de anos. “Existem muitos fatores que influenciam a evolução, como ambientais e genéticos”, diz o pesquisador. Os macacos precisariam passar por fatores semelhantes para se igualarem ao que somos hoje.

 “Não necessariamente porque eles fazem agora o que fizemos milhões de anos atrás, que daqui milhões de anos eles farão o que a gente faz agora”, brinca Martins. Uma pena: alguns mineiros a mais fazendo pães de queijo não machucariam ninguém.

Além disso, o estudo revive análises anteriores feitas na Serra da Capivara, que questionavam se as evidências da presença de humanos teriam mesmo sido feitas por humanos. Lá no Piauí, os macacos-prego também deixaram rastros de suas lascas – então, vale a dúvida. 

Para o futuro, o biólogo garante que os macacos-prego-do-peito-amarelo ainda devem brilhar bastante nos campos de pesquisa. Esses pequenininhos ocorrem em Sergipe, Bahia e Minas Gerais. Seus primos, que vivem na Mata Atlântica úmida, não fazem uso de ferramentas. 

O comportamento é exclusivo para as populações de caatinga e mata seca. “É importante preservar a espécie como um todo e preservar a cultura do uso de ferramentas”, disse Martins, que busca entender o motivo da disparidade e o motivo do uso do martelo e bigorna.

Fonte: abril

Sobre o autor

Avatar de Redação

Redação

Estamos empenhados em estabelecer uma comunidade ativa e solidária que possa impulsionar mudanças positivas na sociedade.