Ao contrário do que se pode imaginar, o lobo-guará não é um predador voraz, mas um onívoro equilibrado. A parte carnívora da dieta consiste principalmente em mamíferos médios e pequenos, mas ele também consome répteis, aves, peixes e anfíbios de vez em quando. A outra metade é composta por frutos, como a gabiroba (Campomanesia spp), o jerivá (Syagrus romanzoffiana) e a fruta-do-lobo (Solanum lycocarpum).
O nome da última já dá pistas sobre a sua importância nesta história. Alguns estudos apontam que a fruta, que também é conhecida como lobeira ou maçã-do-cerrado, pode corresponder a 50% da dieta de alguns lobos. A fruta-do-lobo e os lobos vivem em uma relação de íntima simbiose – ou seja, de vantagem mútua.

Isso porque, depois da alimentação, os lobos eliminam as sementes intactas, ainda em condição de germinar. Isso contribui para a disseminação da espécie vegetal. Para o lobo, a vantagem é ainda mais especial: a fruta funciona como um vermífugo natural e elimina parasitas como o verme-gigante-do-rim (Dioctophyma renale), que pode ser fatal para os lobos.
Mas, se você encontrar uma lobeira em passeios pelo Cerrado, é preciso cuidado. A fruta crua não tem o mesmo efeito no organismo humano, e pode provocar problemas digestivos e diarreia. Cozida, é usada para fazer doces e como alimento supostamente medicinal, embora sem comprovação científica.
É justamente por ser utilizada de forma tradicional há tanto tempo que a fruta-do-lobo chamou a atenção de pesquisadores. Já se sabia, por exemplo, que a fruta possui compostos com propriedades anti-cancerígenas, pelo menos em células isoladas em laboratório.
Agora, um estudo da Universidade de São Paulo (USP) aponta que o fruto pode conter partículas com potencial para combater o câncer de bexiga. Os experimentos extraíram da fruta dois compostos que já eram conhecidos por serem anticancerígenos, solasonina e solamargina. Eles foram encapsulados em nanopartículas 600 mil vezes menores que um fio de cabelo.
As nanopartículas foram administradas em células de tumores de bexiga, e, depois, em tumores do mesmo tipo em camundongos. Esses compostos extraídos da fruta-do-lobo induzem a apoptose, ou seja, a morte das células do tecido canceroso.
Os resultados, publicados na revista científica International Journal of Pharmaceutics, apontam que o tratamento reduziu significativamente o volume dos tumores.
Entretanto, os dados são apenas preliminares, feitos apenas em células isoladas em laboratório e camundongos. Muitos outros estudos ainda precisam ser realizados para confirmar a eficácia e a segurança do método antes que ele tenha as chances de se tornar um tratamento para humanos.
Ou seja, pode demorar um bocado até a lobeira se tornar um lanche e remédio tão queridinho para nós quanto para os nossos colegas lobos-guará.
Fonte: abril