Autos ao final • O Tribunal de Justiça de Goiás (TJ-GO) deferiu liminar para suspender leilão extrajudicial de imóvel rural dado em garantia em contrato de alienação fiduciária, após identificar indícios relevantes de irregularidades no procedimento de consolidação da propriedade e na própria formação da garantia.
De acordo com os advogados Mateus Cunha (@mateuscunha.adv) e Marina Kássia Gomes (@marinakassia), a petição inicial sustentou a existência de indícios de irregularidades na formação da garantia, destacou a condição de idosos em situação de especial vulnerabilidade, apontou a ausência de intimação pessoal para purgação da mora e questionou a validade da assinatura atribuída a pessoa analfabeta, fundamentos levados ao Judiciário por meio do pedido de tutela de urgência.
Ao analisar o pedido, o magistrado considerou, entre outros pontos, a hipervulnerabilidade dos garantidores, a ausência de intimação pessoal para purgação da mora, a suspeita de vício formal na assinatura de pessoa analfabeta, bem como a aplicação do art. 26 da Lei nº 9.514/1997 e dos requisitos do art. 300 do CPC, reconhecendo a presença do fumus boni iuris e do periculum in mora.
Entenda o caso
Segundo os autos, foi celebrado instrumento particular de contrato de limite de crédito com pacto adjeto de alienação fiduciária de imóvel, tendo como garantia uma propriedade rural com área superior a 18 alqueires, registrada em cartório de imóveis no interior de Goiás. Os devedores principais seriam familiares próximos dos proprietários do bem, enquanto os titulares do imóvel figuraram como emitentes garantidores.
Os garantidores são pessoas idosas, com idades avançadas, ambos analfabetos. A mulher não sabe assinar o próprio nome e utiliza impressão digital, enquanto o homem, embora consiga firmar assinatura, possui severa limitação visual, incluindo cegueira total em um dos olhos, conforme documentação médica juntada aos autos. Essas condições pessoais, devidamente comprovadas, colocam os envolvidos em situação de especial vulnerabilidade jurídica.
A defesa sustentou que os garantidores não tiveram ciência efetiva do contrato que onerou o imóvel nem do procedimento extrajudicial de consolidação da propriedade, tomando conhecimento do leilão apenas quando terceiros compareceram à residência para visitação do bem. Os autos também registram a lavratura de boletim de ocorrência e a formulação de reclamação administrativa junto ao órgão de defesa do consumidor, sem solução prévia. Também foi alegado que o imóvel possui natureza de bem de família, sendo a única moradia do núcleo familiar há décadas, com invocação da proteção legal prevista na Lei nº 8.009/1990.
Fundamentos da decisão
Ao analisar o pedido de tutela cautelar antecedente, o magistrado entendeu que havia probabilidade do direito alegado, destacando indícios de irregularidades formais no procedimento adotado pela instituição financeira. Entre os pontos considerados relevantes, a decisão ressaltou que a assinatura atribuída à garantidora analfabeta no contrato não observou as formalidades legais exigidas para assinatura a rogo, com a presença de testemunhas, o que levanta dúvida quanto à validade da manifestação de vontade. Nesse contexto, o magistrado destacou que “há indícios de irregularidade na formação da garantia, o que recomenda a suspensão do ato expropriatório até melhor análise do mérito”.
Também foi reconhecida, em cognição sumária, a possível violação ao art. 26, §1º, da Lei nº 9.514/1997, diante da ausência de comprovação de intimação pessoal dos garantidores para purgação da mora, requisito indispensável para a consolidação da propriedade em nome do credor fiduciário. O juízo observou ainda que o prosseguimento do leilão poderia gerar dano grave e de difícil reparação, especialmente em razão da possibilidade de arrematação por terceiro de boa-fé.
Na decisão, o magistrado consignou que, diante de indícios de irregularidade na formação da garantia e no procedimento expropriatório, a suspensão do leilão se mostra medida prudente até a análise aprofundada do mérito da controvérsia.
Considerações finais
Com base nesses fundamentos, o juízo deferiu a tutela de urgência para determinar a suspensão dos leilões extrajudiciais designados, fixando multa diária em caso de descumprimento como meio de assegurar a efetividade da ordem judicial e determinando a imediata comunicação à instituição financeira e ao leiloeiro responsável. O processo tramita com prioridade legal, em razão da idade avançada dos autores.
O processo seguirá para regular instrução, ocasião em que serão analisadas de forma definitiva a validade do contrato, a regularidade da alienação fiduciária e os efeitos jurídicos decorrentes, inclusive quanto à proteção conferida a pessoas idosas e analfabetas em contratos que envolvem a perda da moradia familiar.
Processo nº 6006632-86.2025.8.09.0017
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