A quarta edição do Café com Negócios, realizada nesta quarta-feira (03), na Embrapa Agroindústria Tropical (Fortaleza), contou com a participação de representantes do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN-CE), da Secretaria da Cultura e Turismo do Ceará (Secult) e do Mercado AlimentaCE. O encontro teve como tema o processo de registro e salvaguarda do modo de produção tradicional da cajuína, bebida símbolo do Nordeste brasileiro, e a possibilidade de ampliação deste reconhecimento para o Ceará. O debate ressaltou a atuação integrada entre instituições de pesquisa, órgãos de preservação cultural e produtores, essencial para fortalecer a identidade cultural e agregar valor econômico à cajuína, ampliando sua relevância no cenário regional e nacional.
A produção tradicional e as práticas socioculturais associadas à cajuína foram registradas como Patrimônio Cultural e do Brasil em 2014, pelo IPHAN no estado do Piauí. O processo de produção artesanal envolve uma tradição secular transmitida entre gerações, que consolida o produto como símbolo cultural e alimento afetivo para as famílias nordestinas. O registro registrado do produto como bem imaterial representativo da cultura e identidade simbólica do estado.
Bebida não fermentada e não gaseificada, produzida a partir de suco clarificado de caju, cajuína conservada ou sabor de fruto de maneira única. Para além de sua importância cultural, esse produto se conecta ao potencial econômico da cadeia produtiva da cajucultura, atividade de grande importância para a economia do Nordeste, que gera renda para milhares de agricultores familiares da região.
A Embrapa Agroindústria Tropical desempenha um papel estratégico nesse cenário, desenvolvendo pesquisas para modernizar os processos produtivos da cajuína, tanto em nível industrial como em pequenas agroindústrias. Além disso, os estudos da empresa possibilitaram recomendar clones de cajueiro-anão com características ideais para a produção da bebida, como maior doçura, acidez reduzida e baixo teor de taninos.
Desafios para registro de segurança
Durante o encontro, Vinicius Frota, técnico de Antropologia do Iphan-CE, destacou que, em geral, os processos de salvaguarda como principais desafios a mobilização e as articulações com os detentores do saber e com as instituições que atuam na proteção do bem cultural. O Plano de Salvaguarda é um documento obrigatório para os bens culturais registrados como Patrimônio Cultural e Imaterial do Brasil.
“A elaboração do documento é um processo coletivo, realizado em diferentes etapas, com o objetivo de instrumentalizar a gestão compartilhada do registro, espécie de acordo social em defesa dos modos de fazer artesanato do produto, para proteger e valorizar o bem cultural registrado. No Piauí, já temos um plano de segurança, fruto de reuniões, amplo debate em fóruns de discussão e pesquisas conjuntas. No Ceará, estamos iniciando o processo, buscando estabelecer sua abrangência e promover o diálogo com os produtores locais para avanço no registro”, explica.
Educação patrimonial
O pedido de registro de um produto ou processo como Patrimônio Cultural Brasileiro pode ser feito ao IPHAN por instituições ligadas à cultura, secretarias estaduais ou municipais, sociedades civis e associações. O dossiê deve reunir informações que demonstrem a importância cultural do produto, a sua existência histórica e a continuidade do processo produtivo ao longo do tempo e as práticas culturais atuais e como elas se desenvolvem. Além disso, é necessário apresentar documentos que caracterizem o bem e comprovem o consentimento dos seus titulares em relação ao registro. Para a cajuína foi feito um pedido de registro pela Cooperativa de Produtores de Cajuína do Piauí (CAJUESPI).
Segundo a palestrante Jéssica Ohara, coordenadora de Patrimônio Cultural e Memória da Secult-CE, o processo de registro de um bem cultural envolve não apenas uma realização de pesquisas para coleta e sistematização de dados, mas também uma necessidade de formação de novas gerações. “No caso da cajuína, investimos na realização de cursos de educação patrimonial e estamos articulando com as secretarias municipais de educação a inclusão desse tema nos conteúdos trabalhados em sala de aula, com uma abordagem transversal que contempla diferentes disciplinas do currículo escolar. Essa é uma maneira eficaz de garantir a transmissão do saber-fazer tradicional desse produto para os jovens e de contribuir para o enfrentamento do desafio do êxodo rural”,.
Identidade cultural alimentar
Para Gio Frapiccini, coordenador de Pesquisa em Culturas Alimentares do Mercado AlimentaCE, centro cultural com sede em Fortaleza, outro palestrante do evento, a cajuína faz parte de um sistema alimentar muito mais amplo, que envolve o caju e suas múltiplas derivações. O trabalho realizado pela instituição parte da cajuína, para responder a questões relacionadas ao processo produtivo dessa bebida, mas se expande para as casas de farinha e outras expressões do patrimônio alimentar do caju. Esse rico universo exige articulações entre diferentes atores – do pequeno produtor artesanal ao setor agroindustrial.
“O cearense já registrou a cajuína como parte de sua identidade cultural, mas precisa estruturar esse reconhecimento em políticas públicas. Fortalecer a mobilização e ampliar o diálogo entre instituições e comunidades é crucial para dar robustez a esse processo que tem no centro das discussões a cajuína como patrimônio cultural alimentar do Ceará”, afirma o gestor.
Inovação no foco do debate
O Café com Negócios é um projeto coordenado pela área de Transferência de tecnologias da Embrapa Agroindústria Tropical, que possibilita o diálogo e interação entre pesquisadores, analistas e gestores da casa com profissionais de outras instituições ligadas ao ecossistema de inovação do Ceará, ambiente que reúne uma rede de empresas que atuam de forma colaborativa. O objetivo é debater inovação, cultura e agronegócio de forma integrada, identificando alternativas para ampliar a adoção de tecnologias da Embrapa, e prospectar oportunidades para novas pesquisas, negócios e parcerias estratégicas.
Fonte: cenariomt