CENÁRIO AGRO

Indígena Parecis denuncia perseguição a modelo produtivo em terras demarcadas: Vídeos revelam denúncia impactante

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Em um desabafo gravado em vídeo, o líder indígena Arnaldo Zunizakae, da etnia Parecis, de Campo Novo do Parecis (MT), denunciou o que chamou de perseguição institucional e ideológica contra o projeto de produção agrícola desenvolvido em terras indígenas há mais de duas décadas. Segundo ele, o trabalho realizado por sua comunidade tem gerado autonomia econômica, dignidade e qualidade de vida para mais de 3 mil pessoas, mas enfrenta sucessivos entraves burocráticos e ameaças de embargo por parte do Ibama.

“Estamos há 22 anos nessa luta para usar 1,5% do nosso território para atividades agrícolas, seguindo as legislações ambientais, com cooperativas organizadas, contabilidade regular, e mesmo assim, ainda somos tratados como criminosos”, afirma a liderança.

A crítica está relacionada à dificuldade enfrentada por indígenas produtores diante de notificações e embargos do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), que inclusive, voltou a assombrar os indígenas na semana passada. Em um vídeo gravado em uma plantação de milho, ele afirma que as aldeias estão prestes a sofrer novos embargos, o que pode provocar um “colapso social” entre os povos que vivem do cultivo dentro dos territórios demarcados.

“Será que é isso que vocês querem? Que os índios se aliem ao narcotráfico que é forte aqui na região? Que voltem a ser pedintes, tendo que sair das aldeias para trabalhar nas fazendas e perder a dignidade?”, questiona Arnaldo no vídeo, gravado em 1º de abril de 2025, data que, segundo ele, simboliza a ironia da “mentira institucional” que, na prática, impede que povos indígenas prosperem mesmo quando seguem todas as exigências legais.

Atualmente, segundo dados da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), os povos indígenas da etnia Parecis cultivam cerca de 12 mil hectares nas terras indígenas Utiariti e Rio Formoso, no noroeste de Mato Grosso. Os plantios ocupam menos de 2% do território demarcado e incluem culturas como soja, milho, arroz e feijão. A produção é organizada por cooperativas e segue normas ambientais estabelecidas, com supervisão da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai) e do Ministério Público Federal (MPF).

De acordo com o Instituto Mato-grossense de Economia Agropecuária (Imea), a produção agrícola dentro das terras Parecis gerou, em 2023, cerca de R$ 80 milhões em receitas, revertidas para as aldeias em forma de melhorias em infraestrutura, educação, saúde e alimentação. Mais de 3 mil indígenas se beneficiam diretamente das atividades, que incluem desde o trabalho nas lavouras até a gestão das cooperativas.

“O que nós queremos é o direito de trabalhar, gerar emprego, renda, sustentar nossa cultura e viver com dignidade no nosso território”, afirma a liderança. Arnaldo ressalta que o projeto agrícola indígena existe há mais de 20 anos e que, mesmo com o reconhecimento de sua importância social, econômica e ambiental, ainda enfrenta barreiras legais e políticas para sua regularização definitiva.

A situação descrita por Arnaldo ocorre mesmo após a emissão de termos de anuência da Funai e o cumprimento de exigências técnicas, como estudos de impacto ambiental e relatórios de viabilidade. Ainda assim, os indígenas relatam que são alvo constante de fiscalizações e penalidades por parte de órgãos ambientais, especialmente o Ibama. “Desde 2013, tentamos regularizar a atividade com os órgãos competentes. Já gastamos mais de R$ 2 milhões em estudos, atendemos todas as condicionantes, e mesmo assim voltam a querer nos multar e embargar”, relata.

De acordo com Arnaldo, o processo segue emperrado em Brasília, sofrendo sucessivas reprovações técnicas sem resposta definitiva. 

O modelo produtivo dos Parecis, que mescla práticas de agricultura convencional e manejo regenerativo com uso controlado de insumos, é visto como referência entre os povos indígenas brasileiros. Segundo dados da Fundação Amazônia Sustentável (FAS), que apoia projetos produtivos indígenas, ao menos 14 povos em Mato Grosso já discutem formas de replicar a experiência, o que preocupa setores contrários à ocupação produtiva em terras indígenas.

Arnaldo alerta que as lavouras estão prestes a serem novamente embargadas pelo Ibama, sob a justificativa de irregularidades antigas já contestadas judicialmente. De acordo com ele, essa medida pode levar ao colapso econômico e social de dezenas de aldeias da etnia Parecis, bem como dos demais povos, que também desenvolvem atividades semelhantes.

“Se isso acontecer, vamos voltar a ser pedintes, deixar nossos territórios para trabalhar nas fazendas e nas cidades, e perder tudo o que conquistamos. Só queremos o direito de trabalhar na nossa terra”, lamenta.

O desabafo da liderança indígena Parecis também levanta críticas à postura do governo federal e cobra posicionamentos mais firmes da bancada de Mato Grosso em Brasília. “Nós não estamos pedindo cesta básica nem emenda parlamentar. Estamos exigindo apenas o direito de produzir, pagar impostos e viver com dignidade no nosso território”.

No vídeo, Arnaldo destaca que, além da geração de renda, o projeto reduziu drasticamente os índices de desnutrição infantil, evasão escolar e dependência de programas assistenciais. Atualmente, mais de 60 jovens Parecis possuem ensino superior, com apoio financeiro vindo das próprias aldeias, e o índice de violência interna diminuiu significativamente, segundo dados da Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai).

A luta dos Parecis por autonomia produtiva é vista por especialistas como um reflexo de um novo perfil de povos indígenas que buscam protagonismo econômico sem abrir mão da identidade cultural. “A nossa cultura não celebra fome, celebra fartura”, resume o cacique Arnaldo. “E é por isso que lutamos para continuar cultivando o que é nosso, dentro do que é nosso”.


 

Fonte: leiagora

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