O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Gilmar Mendes liberou para julgamento, nesta terça-feira (2), duas ações que podem dificultar o impeachment de ministros da Corte. A Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB) e o partido Solidariedade defendem regras mais rígidas para a tramitação desses pedidos no Senado.
O julgamento ocorrerá no plenário virtual da Corte, no qual os ministros apenas depositam seus votos, entre os dias 12 e 19 de dezembro. As ações defendem que a prerrogativa para denunciar integrantes do STF deveria ser exclusiva do procurador-geral da República.
Hoje, qualquer pessoa pode solicitar a abertura de processo de impeachment contra integrantes do Supremo. A AMB e o Solidariedade também sustentam que a admissibilidade da denúncia deve ser aprovada por maioria qualificada, ou seja, com o voto de dois terços dos senadores, e não por maioria simples, como está definido atualmente.
“A remoção de ministro do STF, à luz da separação de poderes modelada pela Constituição Federal de 1988, não poderia, em hipótese alguma, decorrer de contrariedade de maiorias políticas fugazes em relação a atos jurisdicionais típicos”, disse o Solidariedade.
Para o partido, a “Lei do Impeachment, ao deixar de conferir salvaguardas funcionais aos ministros do STF, não fragiliza somente a situação jurídica deles, mas deixa desprotegido todo o sistema institucional que alicerça o Estado de Direito, os direitos fundamentais e o funcionamento da democracia”.
A AMB apontou que parte das regras do impeachment de ministros do STF não foi recepcionada pela Constituição. Em 17 de setembro, Gilmar pediu informações sobre as regras ao Congresso Nacional, à Advocacia-Geral da União (AGU) e à Procuradoria-Geral da República (PGR).
PGR diz que ministros do STF estão sujeitos “à perseguição”
Em 9 de outubro, a Procuradoria-Geral da República (PGR) disse que os magistrados estão sujeitos “à perseguição por crime de responsabilidade” e defendeu a exclusividade do órgão na acusação para impeachment de ministros e concordou com a necessidade de maioria qualificada para o afastamento.
“Estar permanentemente sujeito a que qualquer cidadão insatisfeito nos seus interesses possa acioná-lo criminalmente perante o Senado Federal não condiz com a tranquilidade desejada pelo constituinte para que o guardião da Constituição desempenhe a contento a tarefa de, quando necessário, ser contrário ao que quer e pensa a maioria da população por meio dos seus representantes”, enfatizou.
O procurador-geral da República, Paulo Gonet, afirmou que é preciso promover a “correção procedimental” no rito de impeachment de ministros do STF, pois a Lei 1.079/1950 (Lei do Impeachment) foi concebida em uma “quadra histórica bastante distinta da atual”.
Gonet apontou que o presidente da República está sujeito à responsabilização política por ter sido eleito por voto popular, enquanto o ministro do STF é escolhido por notório conhecimento jurídico e reputação ilibada, exercendo uma “função contramajoritária”.
A PGR menciona a “banalização do instrumento” de impeachment como justificativa para ter exclusividade nas denúncias. Segundo o parecer, o Senado somava 78 pedidos de impeachment de ministros do Supremo até outubro de 2025, sinalizando uma “recente e explosiva tendência” e um “manifesto desvirtuamento da sua finalidade republicana”.
Gonet reforçou que atos decisórios praticados pelos ministros da Corte não podem fundamentar acusações de crime de responsabilidade. Ele rechaçou a ideia de “crime de hermenêutica” e lembrou que a Lei 13.869/2019 prevê que a “divergência na interpretação de lei ou na avaliação de fatos e provas não configura abuso de autoridade”.
Senado defende manutenção da regras de impeachment
Em manifestação ao STF, a Advocacia do Senado afirmou que a Lei do Impeachment cumpre o mandamento constitucional que prevê lei especial para definir crimes de responsabilidade e ritos processuais.
O Senado apontou que o afastamento cautelar e a redução temporária de vencimentos são provisórios e não violam as garantias da magistratura. Além disso, destacou a legitimidade ativa de qualquer cidadão para protocolar pedidos de impeachment.
“O controle do exercício do poder pelos cidadãos constitui exercício legítimo dos direitos políticos constitucionalmente assegurados, faz parte da tradição constitucional brasileira e ajusta-se ao sistema de freios e contrapesos constitucionalmente assegurados”, diz o parecer da Advocacia do Senado enviado à Corte em outubro.
PGR defende quórum qualificado para impeachment de ministros
O parecer argumenta que o trecho da Lei do Impeachment que estabelece maioria simples para a instauração do pedido de afastamento de ministros deve ser considerado “não recepcionado” pela Constituição.
De acordo com Gonet, a gravidade do ato de iniciar um processo de afastamento de um titular do Poder Judiciário exige um “consenso elevado”, o que demanda a anuência de dois terços dos senadores.
Gonet é contra afastamento automático de ministros
A manifestação da PGR defende que o afastamento automático do cargo, com a perda parcial da remuneração, previsto na Lei de 1950, “viola as garantias constitucionais da vitaliciedade e inamovibilidade dos magistrados”.
Segundo Gonet, o afastamento automático previsto para o presidente da República não se aplica aos ministros do STF. “O constituinte foi coerente com os cuidados que estimou devidos para assegurar a independência do magistrado em face de incursões de outro Poder”, disse.
Além disso, a PGR afasta a possibilidade de se aplicar o art. 319, VI, do Código de Processo Penal, que trata da suspensão de função pública como medida cautelar diversa da prisão, ao processo de impeachment de ministros do STF.
Medidas cautelares e eleições
A ADPF 1.259, protocolada pelo Solidariedade, também questiona uma “matéria estranha” ao impeachment de ministros do STF. “Trata-se do artigo 236, § 1º, do Código Eleitoral, por força do qual candidatos não podem ser presos ou detidos nos quinze dias que antecedem a eleição, salvo em flagrante delito”, mencionou a PGR.
O procurador-geral também se manifestou sobre o tema no parecer, defendendo a extensão da imunidade eleitoral para abarcar medidas cautelares diversas da prisão, inclusive para candidatos às eleições proporcionais, nos 15 dias que antecedem o pleito.
Fonte: gazetadopovo






