Sophia @princesinhamt
Saúde

Explorando os Mistérios das Eras do Gelo: Ciclos e Mistérios Revelados

2025 word3
Grupo do Whatsapp Cuiabá

No dia a dia usamos relógios e calendários para organizar nossas tarefas e compromissos – muitas vezes, sem nos darmos conta de que essas pequenas atitudes nos sincronizam com os ritmos planetários.

O dia obedece os ciclos de rotação, em que o planeta gira sobre seu próprio eixo; os anos equivalem à translação, que é a órbita da Terra em torno do Sol. Esses ritmos não são apenas essenciais para medir o tempo, mas também influenciam discretas variações no clima ao longo do ano. Eles determinam as estações e, com elas, a maneira como nos vestimos, nos alimentamos e até mesmo como nos sentimos.

Na perspectiva do “tempo profundo” – que abrange os bilhões de anos da história da Terra – observamos outros ritmos planetários, com durações muito maiores do que os ciclos de dias, anos ou séculos que conhecemos. Esses ritmos ficam registrados no planeta, que estudamos a partir da união entre Geologia, Astronomia e Paleoclimatologia. Eles nos levam a vislumbrar como o cosmos e o tempo se entrelaçam para moldar a Terra e as diferentes paisagens que surgiram e desapareceram ao longo de sua história.

0509–calendário-celeste-layout_site
Representação artística do pensamento do geólogo Joseph Barrell, publicado em 1917. No trecho adaptado, Barrell propõe que a história da Terra deve ser compreendida por ritmos muito mais longos do que aqueles vivenciados na escala humana. Ele destaca que a sedimentação e a formação de sucessivas camadas geológicas registram, em “tábuas de pedra”, esses ciclos, que só se revelam a nós à luz da ciência e do estudo do tempo profundo. (Fragoso & Kuchenbecker (2025)/Divulgação)

Um olhar profundo sobres os ciclos astronômicos

Civilizações antigas, de diferentes partes do mundo, desenvolveram um conhecimento surpreendentemente avançado sobre os ciclos astronômicos. Sumérios, Babilônios, Hindus, Chineses, Egípcios, Persas, Astecas, Maias e Celtas estão entre os povos que registraram suas observações do céu e construíram observatórios sofisticados para acompanhar os movimentos periódicos dos astros. 

No Brasil, o chamado Observatório de Calçoene, no Amapá, também conhecido como “Stonehenge da Amazônia”, é um exemplo notável da relação entre culturas ancestrais e os ciclos celestes.

Ilustração do Observatório de Calçoene, um dos mais impressionantes sítios de arqueoastronomia das Américas.
O Observatório de Calçoene, um dos mais impressionantes sítios de arqueoastronomia das Américas. (Fragoso & Kuchenbecker (2025)/Divulgação)

A criação dos primeiros calendários, impulsionada pela observação dos ciclos astronômicos, exerceu um papel decisivo na evolução do conhecimento humano sobre o tempo e seus ritmos naturais. Nosso fascínio pela repetição constante dos movimentos observados no céu e na natureza despertou uma forma de pensar especialmente poderosa, capaz de organizar e expandir diferentes áreas do saber.

Os antigos gregos exemplificam perfeitamente essa tendência: movidos pelo desejo de compreender e prever fenômenos astronômicos, eles estruturaram grande parte do seu conhecimento em padrões cíclicos – algo que influenciou até mesmo a percepção das dinâmicas humanas. Não por acaso, a própria palavra “ciclo” deriva do termo grego κύκλος (kýklos), que significa “círculo” ou “roda”, reforçando essa visão circular e periódica do tempo. O legado dessa abordagem permanece profundamente enraizado na ciência moderna.

Representação artística inspirada em Preston e Henderson (1964), que ressalta o papel da periodicidade na compreensão de fenômenos naturais.
Representação artística inspirada em Preston e Henderson (1964), que ressalta o papel da periodicidade na compreensão de fenômenos naturais. (Fragoso & Kuchenbecker (2025)/Divulgação)

Outro exemplo marcante é o trabalho do astrônomo grego Hiparco de Nicéia, que viveu por volta de 190 a.C. Com uma precisão impressionante, ele usou métodos matemáticos para calcular a duração do ano e prever a ocorrência de eclipses. 

Suas descobertas sobre as mudanças graduais das posições das estrelas lançaram as bases para descobrirmos o que hoje chamamos de “precessão dos equinócios”, um movimento circular, lento e contínuo, do eixo de rotação do planeta, que se assemelha ao bamboleio de um pião. Enquanto o eixo gira, ele se inclina para diferentes direções ao longo do tempo, completando um ciclo a cada 20 mil anos aproximadamente. 

Esse movimento acontece porque a Terra não é uma esfera perfeita. Ela é oblata, ou seja, um pouco “achatada” nos polos e “alargada” no equador.  Assim, a interação gravitacional do Sol e da Lua atuam de maneira desigual, “puxando” essa parte mais larga da Terra, fazendo com que o eixo mude de posição. 

Ilustração da precessão é o movimento cônico do eixo da Terra, com ciclo de cerca de 20 mil anos, ilustrado aqui por meio da analogia com um pião.
A precessão é o movimento cônico do eixo da Terra, com ciclo de cerca de 20 mil anos, ilustrado aqui por meio da analogia com um pião. (Fragoso & Kuchenbecker (2025)/Divulgação)

Os ciclos glaciais: resposta celeste para um mistério terrestre

A ideia de que o nosso planeta passou por mudanças climáticas tão extremas que, em tempos remotos, vastas geleiras cobriram extensas áreas dos continentes parece coisa de ficção científica. No entanto, entre os séculos XVIII e XIX, cientistas começaram a reunir evidências de que a Terra passou por intensas eras glaciais. A chamada Teoria Glacial marcou uma revolução nas ciências da Terra e trouxe à tona uma pergunta fundamental: como essas eras do gelo começaram — e por que terminaram?

A resposta, ao que tudo indica, está no cosmos. Movimentos orbitais como o da precessão, por exemplo, embora quase imperceptíveis na escala da vida humana, alteram gradualmente o equilíbrio da irradiação solar recebida pelos hemisférios. Ao longo de milênios, essas variações na insolação podem reconfigurar o clima do planeta. 

Além da precessão, dois outros movimentos desempenham um papel crucial na regulação do clima em escalas geológicas: a obliquidade e a excentricidade.

A obliquidade diz respeito às mudanças de inclinação do eixo terrestre, que varia entre 22,1° e 24,5° em ciclos de aproximadamente 40 mil anos. Essa inclinação afeta a distribuição da irradiação solar nas diferentes regiões do planeta e a intensidade das estações do ano.

Ilustração da obliquidade é a variação do ângulo de inclinação do eixo da Terra em relação à sua órbita, com ciclos de cerca de 40 mil anos.
A obliquidade é a variação do ângulo de inclinação do eixo da Terra em relação à sua órbita, com ciclos de cerca de 40 mil anos. (Fragoso & Kuchenbecker (2025)/Divulgação)

A excentricidade, por sua vez, refere-se à forma da órbita terrestre ao redor do Sol, que alterna entre mais circular e mais elíptica ao longo de dezenas de milhares de anos. Essa variação influencia a quantidade e o padrão da radiação solar recebida anualmente, afetando o clima global.

Ilustração da excentricidade é a variação na forma da órbita da Terra ao redor do Sol, ora mais elíptica, ora mais circular, com ciclos de cerca de 100 e 400 mil anos.
A excentricidade é a variação na forma da órbita da Terra ao redor do Sol, ora mais elíptica, ora mais circular, com ciclos de cerca de 100 e 400 mil anos. (Fragoso & Kuchenbecker (2025)/Divulgação)

Por trás desses ciclos estão forças invisíveis, mas poderosas: as interações gravitacionais entre a Terra e outros corpos do Sistema Solar. O Sol, a Lua e os planetas gigantes como Júpiter e Saturno exercem sua influência silenciosa, alterando lentamente a inclinação do eixo da Terra e a forma de sua órbita. São esses ajustes sutis, orquestrados no cosmos, que moldam o ritmo do clima em nosso planeta.

A interação entre precessão, obliquidade e excentricidade foi desvendada ao longo de séculos por cientistas que uniram conhecimentos da Astronomia, Matemática e Geociências. Combinados, esses ciclos formam os chamados Ciclos de Milankovitch, capazes de desencadear longas eras glaciais, com avanço de geleiras, seguidas por fases de aquecimento e retração do gelo. Eles ajudam a explicar os grandes ritmos climáticos que moldaram o passado da Terra.

Ilustração dos últimos 250 mil anos, o planeta alternou entre períodos glaciais e interglaciais, marcados por grandes oscilações na temperatura global média (linha roxa). Tais variações estão intimamente relacionadas pelos ciclos astronômicos de excentricidade, obliquidade e precessão, que alteram a distribuição e intensidade da radiação solar que chega à Terra (linha dourada). No entanto, explicar todas as variações climáticas do planeta não é uma tarefa fácil. Observa-se, por exemplo, que a condição atual destoa do padrão, sugerindo a influência de fatores adicionais, como as atividades humanas, que podem ter modificado o equilíbrio climático do planeta.
Nos últimos 250 mil anos, o planeta alternou entre períodos glaciais e interglaciais, marcados por grandes oscilações na temperatura global média (linha roxa). Tais variações estão intimamente relacionadas pelos ciclos astronômicos de excentricidade, obliquidade e precessão, que alteram a distribuição e intensidade da radiação solar que chega à Terra (linha dourada). No entanto, explicar todas as variações climáticas do planeta não é uma tarefa fácil. Observa-se, por exemplo, que a condição atual destoa do padrão, sugerindo a influência de fatores adicionais, como as atividades humanas, que podem ter modificado o equilíbrio climático do planeta. (Fragoso & Kuchenbecker (2025)/Divulgação)

O que deixa esse assunto ainda mais interessante é saber que nosso planeta, através dos muitos processos que compõem o Sistema Terra, é um verdadeiro arquivo destas mudanças climáticas, registrando nas rochas estes compassos astronômicos. Saiba como as rochas revelam esses ciclos ocultos no tempo. [Leia a continuação clicando aqui].

Fonte: abril

Sobre o autor

Avatar de Redação

Redação

Estamos empenhados em estabelecer uma comunidade ativa e solidária que possa impulsionar mudanças positivas na sociedade.