Enquanto ainda era noite de segunda-feira no Brasil, a terça-feira amanhecia no Tibete com um terremoto de magnitude 6,8. Até o momento, a mídia chinesa divulgou que morreram pelo menos 126 pessoas, enquanto 188 ficaram feridas. O Tibete é uma região autônoma, com status de província da China.
Segundo o Centro de Redes de Terremotos da China (CENC), o epicentro do terremoto estava a cerca de 80 quilômetros ao norte do Monte Everest, no distrito de Tingri. Os maiores impactos foram sentidos em toda a região de Shigatse (que abriga Tingri), uma cidade sagrada para o budismo tibetano que abriga cerca de 800 mil pessoas. Além disso, os tremores foram sentidos também em Bangladesh, Nepal, Índia, Butão e em outras áreas da China.
A agência oficial de notícias Xinhua disse que mais de mil casas foram danificadas. Os terremotos são comuns na cidade, que fica em uma região de colisão entre as placas tectônicas da Índia e da Eurásia. Há dez anos, em 2015, quase 9 mil pessoas morreram e mais de 22 mil ficaram feridas em um terremoto de magnitude 7,8 que destruiu mais de meio milhão de casas.
Mesmo assim, o terremoto de terça-feira está entre os piores terremotos a atingir a região no último século. Situado aos pés do Monte Everest, que separa o Nepal da China, o condado de Tingri é uma base popular para alpinistas que se preparam para subir o pico mais alto do mundo.
Além disso, a cidade de Shigatse é palco de uma disputa religiosa no budismo. Lá é onde vive o Panchen Lama, uma figura importante no budismo tibetano, cuja autoridade espiritual fica atrás apenas do Dalai Lama. Vale lembrar que o Dalai Lama não é um indivíduo só, mas um título dado ao líder do budismo tibetano.
Dalai Lama é o título dado à pessoa considerada a reencarnação de Avalokiteshvara, o bodhisattva da compaixão. Um bodhisattva é aquela criatura que está pronta para alcançar o estado de Buda, um estado de consciência definido pelo “despertar para a verdadeira natureza dos fenômenos”. Entretanto, os bodhisattvas fazem votos de só alcançá-lo plenamente quando nenhum outro ser existir mais na roda de encarnações neste mundo.
O atual Dalai Lama, Tenzin Gyatso, é o 14º na linha de sucessão. Nascido em 1935, ele foi reconhecido como a reencarnação do 13º Dalai Lama quando ainda era criança. Ele viveu no Tibete até 1959, mas fugiu exilado para a Índia quando a sua terra natal foi ocupada pelos chineses. Lá, ele fundou o governo tibetano no exílio, que é composto pelos três poderes republicanos e oferece suporte e serviços à comunidade tibetana exilada.
Tradicionalmente, o Panchen Lama é o chefe do Mosteiro Tashi Lhunpo, que fica em Shigatse, e controla o poder religioso e secular sobre a região. Seu poder é independente do sistema político Ganden Poodrang, que foi instituído pelo 5º Dalai Lama, em 1642. Entretanto, não há disputa: a Dalai Lama e o Panchen Lama estão intimamente ligados e cada um participa do processo de reconhecimento das reencarnações do outro.
O Dalai Lama vive na Índia até hoje, e executa um papel forte de promoção da cultura tibetana e dos ensinamentos budistas. Desde essa ruptura, ele e o governo chinês têm uma importante disputa ideológica, política e religiosa.
É por isso que existe uma polêmica de décadas sobre quem é o atual Panchen Lama. O 10º Panchen Lama morreu em 1989 e tanto o governo tibetano no exílio quanto o governo chinês iniciaram processos paralelos na busca do 11º Panchen Lama.
Depois de seis anos, em 1995, Dalai Lama reconheceu que o 11º Panchen Lama era um garoto tibetano de seis anos de idade, Gedhun Choekyi Nyima. Três dias depois do anúncio, as forças de segurança chinesas o escoltaram de sua casa, afirmando que ele “corria o risco de ser sequestrado por separatistas tibetanos”.
A China rejeitava a escolha, dizendo que havia sido conduzida de forma arbitrária. Por isso, o país escolheu seu próprio Panchen Lama, um menino de cinco anos chamado Gyaincain Norbu. O Panchen Lama nomeado por Dalai Lama nunca mais foi visto, e diversos movimentos e governos internacionais pedem informações sobre seu paradeiro e por sua liberação até hoje.
Em comunicado, Dalai Lama disse que estava profundamente triste ao saber do terremoto que classificou como “devastador”. “Ofereço minhas orações por aqueles que perderam suas vidas e desejo uma rápida recuperação a todos os que ficaram feridos”, disse o ganhador do Prêmio Nobel da Paz.
Fonte: abril