Levou um século para que os cientistas encontrassem 430 desenhos conhecidos como Linhas de Nasca, no Peru. Conhecidos como geoglifos, esses desenhos foram feitos na terra entre 2,5 mil e 1,5 mil anos atrás. Agora, com o auxílio de ferramentas de inteligência artificial (ia), cientistas conseguiram identificar 303 novos geoglifos em apenas seis meses.
Os achados variam em complexidade: alguns são apenas linhas e figuras geométricas, mas outros trazem retratos complexos de papagaios, gatos, macacos, baleias e até de cabeças decapitadas. Todos têm entre três e sete metros, e são menores do que os que já foram encontrados anteriormente.
É porque alguns dos que já haviam sido encontrados são realmente enormes e só podem ser vistos de cima: o maior geoglifo da região tem 370 metros de comprimento, o equivalente a dez Cristos Redentores deitados em fila. No total, os desenhos ocupam 50 quilômetros quadrados. O sítio arqueológico é Patrimônio Mundial da Unesco, e é a atração turística mais popular do Peru depois de Machu Picchu.
Dessa vez, o uso de drones e de IA revolucionou a velocidade e o ritmo com que os geoglifos foram descobertos. “Com um drone, é possível percorrer vários quilômetros em um dia”, disse Johny Isla, arqueólogo-chefe do Peru para as Linhas de Nasca, em entrevista ao The Guardian. “O que antes levava três ou quatro anos, agora pode ser feito em dois ou três dias.”
A IA foi treinada para reconhecer os padrões deixados pelos desenhos, e ajudou a analisar grandes quantidades de imagens geradas por drones. “Mesmo com exemplos de treinamento limitados, a abordagem de IA demonstrou ser eficaz na detecção de geoglifos menores do tipo relevo, que, ao contrário dos geoglifos gigantes do tipo linha, são muito difíceis de diferenciar”, os autores escrevem no artigo que foi publicado nesta semana na revista Proceedings of the National Academy of Sciences (PNAS).
Nas imagens deste texto, mostramos primeiro os desenhos como são vistos na pedra. Depois, os desenhos contornados pelos pesquisadores. A terceira imagem mostra uma versão simplificada de cada desenho. Assim, fica mais fácil visualizar as figuras, que são alvo de incessante especulação e pesquisa minuciosa de arqueólogos.
As novas figuras representam principalmente animais selvagens, mas também humanoides abstratos e camelídeos domesticados, como lhamas e alpacas. Elas são também mais recentes, historicamente, e fogem um pouco do padrão mais antigo, que mostrava vastos padrões geométricos e das figuras zoomórficas da cultura Nasca.
“Podemos dizer que esses geoglifos foram feitos por humanos para humanos, pois geralmente mostram cenas da vida cotidiana”, disse Isla ao The Guardian. “Já os geoglifos do período de Nasca são figuras gigantescas feitas em superfícies quase sempre planas para serem vistas por seus deuses.”
Os desenhos ficam em um planalto desértico a 50 quilômetros da costa sul do Peru, em uma área de clima seco e solo inadequado para a agricultura. Foi isso que permitiu que os geoglifos resistissem por milênios.
Eles não são escavados na pedra, pelo contrário: o solo da região é arenoso e claro, coberto por uma camada superficial de seixos escuros. Para criar as imagens, as pessoas retiravam os seixos, para expor o solo claro e criar o contraste visto nas linhas. Essas pedras retiradas eram empilhadas em outras áreas para criar o efeito mais escuro.
A terceira imagem, que mostra os desenhos de forma simplificada, respeita esse padrão: nela, o branco representa onde as pedras foram totalmente removidas, o cinza escuro é onde as pedras foram empilhadas e o cinza claro é a superfície original. A barra de escala representa cinco metros de comprimento.
Não há um consenso entre os pesquisadores sobre a motivação por trás dessas obras enormes. Existem cinco hipóteses principais: os geoglifos seriam parte do entendimento de calendários e astronomia; de geometria; da agricultura e irrigação; de movimento ou comunicação, incluindo caminhada, corrida e dança; ou uma expressão artística.
No geral, mesmo sem concordarem na utilidade específica, os autores dizem que os arqueólogos concordam que os geoglifos lineares são “parte integrante do espaço sagrado dos Nasca”.
Fonte: abril