Política

Especialistas pedem urgência na reforma da legislação penal no Brasil: segurança pública em foco

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O Brasil atravessa uma das fases mais violentas da história recente. Entre 2000 e 2022, mais de 1 milhão de pessoas foram assassinadas no país, segundo o . Isso é fruto da atuação cada vez mais sofisticada de facções criminosas, da expansão do narcotráfico internacional, dos mercados ilícitos altamente lucrativos e de um desafio permanente para as forças policiais: agir sob forte risco, mas frequentemente sem respaldo jurídico e político.

Foi nesse contexto que ocorreu o III Simpósio sobre Segurança Pública, promovido nesta sexta-feira, 15, na Assemblei Legislativa de São Paulo (Alesp). O encontro reuniu especialistas, autoridades e representantes da sociedade civil para debater os rumos da segurança no país. “O objetivo é aproximar experiências reais, dados concretos e propostas viáveis”, afirmou o organizador do evento, Alexandre Guimarães. “Segurança pública não é um debate restrito às polícias: é um debate da sociedade.”

O secretário de Segurança Pública do , Victor César dos Santos, começou o discurso com um alerta: a maior ameaça já não está apenas no tráfico de drogas, mas na estrutura econômica que sustenta facções e milícias. Delegado da Polícia Federal aposentado, Victor César classificou a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 635, a chamada “ADPF das Favelas”, como um divisor negativo na política de segurança fluminense.

Em linhas gerais, a ADPF 635 é uma ação ajuizada em 2019 pelo Partido Socialista Brasileiro no . Essa medida visa a limitar as operações policiais em favelas do Rio, sob o argumento de que há violações de direitos fundamentais dos moradores durante confrontos armados.

De acordo com o secretário, a ADPF das Favelas gerou insegurança jurídica para os policiais e fragilizou operações em comunidades dominadas pelo tráfico. Ele citou, por exemplo, uma ação realizada em 2021 na Favela do Jacarezinho. Na ocasião, 25 dos 27 suspeitos que morreram tinham ficha criminal. “A ADPF trouxe anos de prejuízos à segurança pública”, afirmou.

Na avaliação de Victor César, o cerne do problema é a dominação do território fluminense pelos bandidos. “O tráfico de drogas representa só 15% da receita do crime no Rio”, revelou, ao destacar que facções lucram com serviços como internet clandestina, gás e energia. “Na Rocinha, com 80 mil moradores, as facções chegam a faturar R$ 4 milhões por mês só com planos de internet clandestina.”

O secretário também criticou a fragilidade da legislação penal no país. “Enquanto o custo-benefício do crime for favorável, o bandido continuará entrando nessa vida”, observou, ao citar a teoria do economista norte-americano Gary Becker, vencedor do Prêmio Nobel de 1992. O autor dessa tese entende que o crime pode ser entendido como uma decisão racional: o indivíduo compara os benefícios esperados (dinheiro, poder, status) com os custos esperados (probabilidade de ser pego × severidade da punição). Assim, uma pessoa com poucas oportunidades econômicas pode ver no crime um “investimento” racional.

Para o secretário, organizações como o , o Comando Vermelho e o Terceiro Comando Puro deveriam ser considerados grupos terroristas. O que justificaria essa classificação seria o poder bélico e econômico das facções, além do envolvimento delas com a máfia italiana e com o Hezbollah. “O inimigo comum é o crime organizado”, disse, ao defender a cooperação internacional para aniquilar os criminosos. “Se estivermos unidos, venceremos.”

Se no Rio de Janeiro o desafio está na dominação territorial das facções, em São Paulo a lembrança do “11 de setembro” de 2006 mostrou a força do PCC. De acordo com o cientista político João Henrique Martins, ex-oficial da com mais de 25 anos de experiência, o país percebeu naquele momento a real dimensão do crime organizado.

Um dos pontos centrais de seu discurso foi a defesa dos direitos das vítimas, quase sempre ignorados no sistema judiciário brasileiro. “Entre preso, Estado e vítima, quem é o mais frágil?”, perguntou. “É a vítima. Ela precisa aparecer no sistema de justiça criminal.”

Martins também apontou a infiltração das facções criminosas em setores econômicos formais. “O crime organizado é o segundo maior vendedor de defensivos no Brasil, com rentabilidade maior que a da cocaína”, revelou. “No mercado de cigarros, entre 35% e 60% estão nas mãos do crime.”

Ele defendeu uma reforma ampla do sistema de justiça criminal, que inclua nova Lei de Execução Penal, endurecimento contra reincidência e a inclusão do direito à proteção da sociedade e das vítimas no artigo 5º da . “Hoje, temos criminosos com 80 passagens, algo inconcebível em outros países”, criticou.

Para Martins, a luta não é apenas das polícias: “O enfrentamento deve ser sociedade contra o crime, e não polícia contra o crime”.

O empresário Salésio Nuhs, presidente da Taurus, trouxe ao debate a perspectiva da indústria nacional de armas e munições. Em tom pessoal, recordou os anos 1990, quando a Companhia Brasileira de Cartuchos (CBC), então sob sua direção, apoiava grupos especiais da polícia que treinavam nas dependências da empresa por falta de recursos.

Salésio destacou inovações que marcaram a segurança pública, como a introdução de coletes balísticos mais leves e, mais recentemente, o desenvolvimento do primeiro drone armado do mundo, apelidado de “soldado voador”. “A Taurus é a única empresa do mundo que atira com um drone”, afirmou. “Isso é orgulho para nós, brasileiros.”

Ele também rememorou sua atuação no referendo de 2005, que manteve o direito do cidadão de comprar armas. “Contra tudo e contra todos, ganhamos com 65% dos votos”, disse, ao lembrar a tentativa do governo petista de restringir o acesso dos brasileiros às armas. “Não dissemos que todos deveriam ter arma, mas que ninguém poderia tirar o direito de quem precisa.”

Para Salésio, a vitória no referendo consolidou a garantia constitucional da legítima defesa. “Asseguramos a todos nós o direito de ter uma arma de fogo para defender a vida, a família e a propriedade”, concluiu.

Deputado estadual, o Capitão Telhada exaltou o protagonismo paulista no enfrentamento da criminalidade. “Hoje, São Paulo pauta a segurança pública no Brasil”, afirmou, ao citar a atuação do secretário Guilherme Derrite e do governador .

Telhada lembrou que muitos parlamentares estaduais vieram da polícia, o que garante legitimidade à atuação legislativa. Entre os avanços, destacou o fim das saídas temporárias em 2023, mas listou temas ainda pendentes, como as audiências de custódia, o auxílio-reclusão e a progressão de pena.

Em discurso incisivo, o coronel Paulo Telhada, ex-comandante da Rota, comparou o crime organizado ao diabo. “Sua maior arma é convencer que não existe”, disse. “Está infiltrado em empresas, política, igrejas e até órgãos do Estado.”

Ele criticou a fragilidade das leis criminais no país, ao alegar que a legislação impede a ação efetiva dos policiais e incentiva a prática criminosa. “Jogam sem regras e ainda posam de inocentes”, afirmou, em referência aos bandidos. Para o coronel, penas mais duras e cumprimento integral das sentenças são indispensáveis. “No Brasil, criminosos reincidem 20, 30 vezes, e a sociedade encara isso como normal”, observou.

Além da legislação, Telhada defendeu melhores condições para policiais, desde salários até assistência jurídica. “Esses profissionais deveriam ser carregados no colo, pois defendem a sociedade”, salientou. “Hoje, infelizmente, ainda existe abandono.”

O pesquisador e policial civil Lucho Andreotti, fundador do Instituto NISP, criticou a organização das forças de segurança no combate ao crime. “É tudo engessado e burocrático”, ressaltou o especialista, ao lembrar que o Brasil é um dos poucos países do mundo sem o ciclo completo de polícia. Trata-se de uma prática de atuação em que uma mesma entidade é responsável por todas as etapas do trabalho policial: prevenção, repressão, investigação e registro de ocorrências até a apresentação do caso à Justiça.

A proposta de Andreotti é que o ciclo seja aplicado ao agente público, que conduziria a ocorrência do começo ao fim. Nesse modelo, guardas municipais passariam a ser polícias municipais, a Polícia Militar investigaria crimes cotidianos e a Polícia Civil ficaria com os delitos complexos.

Para o especialista, o corporativismo é o grande entrave desse processo de evolução. “Cada grupo se apega às próprias prerrogativas”, afirmou, lembrando que apenas 5% dos crimes são esclarecidos no Brasil. “É um verdadeiro câncer que trava o sistema. Não é culpa do policial, é culpa do modelo.”

Ao fim do discurso, Andreotti defendeu uma “implosão” do sistema atual: “Precisamos reconstruir toda a lógica da persecução penal”.

Com mais de 40 anos de experiência, o comandante Diógenes Lucca, fundador do Grupo de Ações Táticas Especiais (Gate) da Polícia Militar de São Paulo, celebrou a evolução das policiais ao longo das últimas décadas. Ele afirmou que, apesar de avanços materiais, a sensação de insegurança nunca deixou de ser o principal anseio da população.

Lucca criticou a legislação penal brasileira, que considera branda. “Não é admissível que crimes graves cometidos por menores resultem em, no máximo, três anos de internação”, resumiu. “Isso é um tapa na cara da sociedade.”

Ele também defendeu maior valorização dos policiais e sugeriu premiar a população por denunciar criminosos, responsabilizar financeiramente bandidos e endurecer a progressão de penas.

Ao lembrar da passagem pela Rota e pela fundação do Gate, Lucca destacou: “Orgulho-me de nunca ter perdido reféns ou policiais em operações que comandei”. Para o comandante, a regra é clara: “O crime tem sido um bom negócio. O Estado precisa mostrar que vale a pena andar do lado certo da lei”.

No encerramento do ciclo de palestras, a ex-deputada federal Kátia Sastre (PL-SP) cobrou o fortalecimento das políticas de segurança pública e defendeu o direito de legítima defesa dos cidadãos.

Com 21 anos de PM, Katia lembrou a vida na linha de frente e afirmou que a vocação “nunca sai do sangue”. Para a ex-parlamentar, não basta endurecer leis: é preciso enfrentar a “narrativa da esquerda” que coloca policiais como vilões.

Katia lidera o PL Defesa, núcleo do Partido Liberal que busca conscientizar a população sobre o direito de se proteger. “Quem já esteve na mira de um criminoso sabe que precisamos reagir imediatamente”, afirmou. “O direito à defesa é essencial.”

Segundo a ex-deputada, a sociedade não pode recuar. “Estamos nessa luta pela liberdade, e contra o crime só existe um caminho: avançar, assegurando o direito de defesa de cada brasileiro”, salientou.

Fonte: revistaoeste

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