Originalmente, a disputa era travada entre as holdings e Jandir Mracsanski, apontado como invasor inicial, ao lado de José Reliquias dos Santos, em 2017. Jandir faleceu em setembro de 2021. Foi então que, em 23 fevereiro de 2022, os direitos hereditários dos filhos de Jandir foram transferidos para a empresa Vallus Agrícola via Escritura Pública de Cessão de Direitos Hereditários, momento em que surge também a pessoa de Tiago Dorileo como interveniente anuente no caso.
Hoje, o imóvel está sendo disputado entre as holdings, propriedades de Erivelto Gasques, e a Vallus, empresa mantida pelo Fundo Somma Investimentos, que possuía em seu comitê os empresários Valdoir Slapak, Heroldo dos Reis e Haroldo Augusto Filho. O trio foi destituído do fundo Somma em assembleia ocorrida no 27 de dezembro de 2023.
Em 3 julho de 2024, a juíza Silvia Renata Anffe reconheceu as divergências e destituiu João Dias, mas manteve seu laudo válido nos autos. Em seu lugar, nomeou a empresa Capital Perícias e Consultoria LTDA, de propriedade da advogada Ludmila Rodrigues. A empresa foi constituída exatamente em 11 de março daquele ano, apenas três meses antes da nomeação, e não apresentou documentação detalhada sobre capacidade técnica, cronograma de trabalho, nem sua inscrição legal. Os honorários foram fixados em R$ 41 mil.
A nova perícia será conduzida por Robson Luiz Marques de Moura, indicado por Ludmila. A nomeação também foi impugnada pela defesa, que questionou a recente constituição da empresa, a falta de transparência quanto ao perito responsável e a possibilidade de terceirização da perícia.
A juíza, contudo, manteve a nomeação da Capital Perícias, validou a terceirização e negou a impugnação. A defesa de Erivelto pagou os honorários e aguarda a produção da nova perícia, que iniciou nesta terça-feira (20) a partir da abertura dos trabalhos, assinadas pelas partes. esteve presente e acompanhou o início da operação, que deve durar mais de 3 meses para ser concluída.
O terreno em litígio foi adquirido em 2003 por Erivelto Gasques, empresário conhecido por ter sido dono da rede varejista City Lar. A compra foi realizada mediante escritura registrada, tendo como vendedor Edgard Bernardino. Em 2017, começaram os problemas: um vizinho do imóvel alertou sobre movimentações suspeitas e construção de barracos na área.
Após constatar a invasão, Gasques registrou boletins de ocorrência e ingressou com ação de reintegração de posse em setembro do mesmo ano. Inicialmente, a Justiça concedeu liminar para reintegrá-lo à posse, com apoio da polícia. No entanto, em agosto de 2018, a Segunda Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de Mato Grosso cassou a liminar. Um dos integrantes da turma julgadora era o desembargador Sebastião de Moraes, afastado em 2024 sob suspeita de participação em esquema de venda de sentenças judiciais no “Caso Zampieri”.
Na tentativa de sustentar a posse, os réus apresentaram duas matrículas como prova de propriedade. A defesa de Gasques, por sua vez, alegou que ambas foram constituídas com base em documentos falsos e acionou a Justiça para anulá-las. A primeira ação judicial (n.º 1/2022), em tramitação na 2ª Vara Especializada da Fazenda Pública de Várzea Grande, contesta a matrícula 57.538. Segundo a inicial, a matrícula se originou de uma procuração falsa em nome de Nilza da Costa, utilizada indevidamente para a transferência do imóvel. A defesa sustenta que a procuração válida que existia era relativa a um veículo, e não ao terreno.
Na segunda ação (n.º 2/2022), também na 2ª Vara da Fazenda Pública, questiona-se a legalidade da matrícula 52.259, constituída a partir de uma procuração inválida datada de 1982, supostamente assinada por Julieta de Souza Viana. Segundo certidões cartorárias anexadas ao processo, a procuração não continha assinaturas válidas, e ainda assim foi usada por Carlos Henrique Aparecido de Souza para registrar a transferência da área.
Durante audiência de justificação realizada em maio de 2019, a juíza Silvia Anffe indeferiu a oitiva de sete das oito testemunhas indicadas pela defesa de Gasques, alegando que os depoentes teriam interesse direto no caso.
A sessão foi marcada por questionamentos entre os advogados de Gasques e a banca que defende os invasores, composta por Antônio Horácio da Silva Neto, juiz reconduzido ao cargo após anos afastado da Corte diante do seu envolvimento no “Escândalo da Maçonaria”.
Em 2022, o engenheiro agrônomo João Dias Filho foi nomeado como perito no processo e apresentou laudo pericial em março de 2023, desfavorável a Gasques. A defesa impugnou o documento e apresentou contralaudo, apontando falhas técnicas como erros de georreferenciamento, omissão de documentos relevantes — incluindo um laudo técnico de desapropriação elaborado pela Secopa durante as obras da Copa do Mundo de 2014 — e o uso de imagens de satélite datadas de 2012, incompatíveis com o histórico do imóvel.
Segundo a defesa, o sistema SmartGIS da Prefeitura de Várzea Grande só incorporou a área em litígio em 2017, o que inviabilizaria a análise temporal utilizada pelo perito.
Após recurso, o Tribunal de Justiça determinou a complementação da perícia com foco nos quesitos de posse, e não de propriedade. A autora da ação apontou ainda um erro cadastral na base de dados da Prefeitura de Várzea Grande, que teria posicionado equivocadamente uma matrícula sobre o terreno disputado.
A própria Prefeitura reconheceu o equívoco e promoveu a correção. Apesar disso, o novo laudo apresentado por João Dias, em março de 2024, manteve inconsistências, como o uso de sistemas geodésicos diferentes que resultaram em deslocamento de 64 metros na área analisada, e a omissão quanto à análise de sobreposição de matrículas.
A defesa então contestou a idoneidade de João Dias, destacando sua citação na Operação Polygonum, que apura fraudes na aprovação de cadastros ambientais rurais (CAR) pela Secretaria de Meio Ambiente de Mato Grosso (Sema). Conforme denúncia do Ministério Público, o perito teria manipulado dados no sistema da Sema para beneficiar proprietários rurais, inserindo informações falsas para legalizar áreas desmatadas ilegalmente.
Atualmente, o processo de reintegração de posse segue em curso com a perícia complementar sendo realizada pela Capital Perícias, enquanto a posse do imóvel continua com a empresa Vallus. As ações declaratórias de nulidade das matrículas permanecem em tramitação na 2ª Vara Especializada da Fazenda Pública de Várzea Grande, ainda sem decisão definitiva.
Fonte: Olhar Direto