Ă difĂcil saber qual era a aparĂȘncia dos neandertais, nossos primos extintos, a partir apena de seus restos mortais fossilizados. Quando trabalhadores do vale de Neander, na Alemanha, descobriram os primeiros vestĂgios desses hominĂdeos em 1856, acharam que haviam encontrado ossos de urso.
Pesquisadores logo perceberam que aqueles ossos, na verdade, pertenciam a uma espécie irmã dos Homo sapiens, que chegou a conviver (e a transar) com os humanos modernos. Os neandertais viveram entre 400 mil e cerca de 30 mil anos atrås e deixaram um grande legado genético para a humanidade. Uma anålise com 200 mil brasileiros de 2023 mostrou que nós temos, em média, 2,5% de DNA neandertal no nosso genoma.
Nos anos desde a descoberta desses hominĂdeos e de sua importĂąncia para a composição genĂ©tica dos Homo sapiens, muitas hipĂłteses foram levantadas sobre como eles eram em termos de aparĂȘncia. Por muito tempo, por exemplo, se acreditou que os europeus herdaram a pele clara dos neandertais, que viviam espalhados pela EurĂĄsia. Mas serĂĄ que isso Ă© verdade?
Alguns traços anatĂŽmicos atĂ© podem ser depreendidos dos fĂłsseis, como o formato do crĂąnio e o tamanho corporal, mas nĂŁo dĂĄ para saber nada sobre cor da pele, dos olhos e do cabelo a partir de um osso. Para isso, Ă© preciso sequenciar um genoma neandertal. O primeiro sequenciamento completo do cĂłdigo genĂ©tico de um Homo neanderthalensis sĂł aconteceu em 2008. Desde entĂŁo, os cientistas tĂȘm aprendido cada vez mais sobre esses hominĂdeos â e desmentido ideias equivocadas sobre suas aparĂȘncias.
Diversidade neandertal
Mesmo com os genomas sequenciados, Ă© difĂcil definir como a informação genĂ©tica se manifestava no fenĂłtipo. A maioria dos traços de aparĂȘncia Ă© definida pela combinação de mĂșltiplos genes, e sĂł dĂĄ para entender como eles tendem a se manifestar observando populaçÔes grandes. Como nĂŁo dĂĄ para fazer isso com os neandertais, todos extintos, o mĂĄximo que dĂĄ para fazer Ă© investigar essas pistas de caracterĂsticas fĂsicas no genoma.
Mas a pigmentação dos olhos, dos cabelos e da pele nos Homo sapiens nĂŁo foi herdada diretamente dos neandertais, entĂŁo nĂŁo dĂĄ para usar os humanos modernos como modelo perfeito da aparĂȘncia dos neandertais.
Um bom exemplo disso é quando, em 2007, uma equipe de cientistas encontrou uma variante do gene MC1R nos neandertais. Esse é o mesmo segmento de DNA que, quando sob o efeito de uma mutação, produz o cabelo ruivo. A pesquisa sugeriu que os neandertais tinham cabelo ruivo a partir dessa descoberta.
Desde entĂŁo, essa variante do gene â que nem Ă© a mesma que deixa os cabelos de 2% da população mundial vermelhos, mas outra variante do mesmo gene â nĂŁo foi mais encontrada em nenhum sequenciamento de genoma neandertal. Isso mostra que, se o gene realmente se expressava da mesma forma que acontece nos sapiens, ele tambĂ©m era bem raro. NĂŁo dĂĄ para dizer que os ruivos herdaram os cabelos flamejantes dos neandertais, e nem que todos os Homo neanderthalensis tinham o cabelo com essa cor.
Outra hipĂłtese sobre os neandertais dizia que eles tinham olhos azuis, porque o gene OCA2, que pode ser responsĂĄvel pela pigmentação azul ou marrom da Ăris nos humanos, aparece em alguns genomas dos nossos parentes evolutivos. PorĂ©m, a variante genĂ©tica mais associada com olhos azuis entre os Homo sapiens nunca nem foi encontrada entre os neandertais.
Em um estudo de 2017 que analisou o impacto dos genes dos neandertais nas caracterĂsticas fĂsicas dos Homo sapiens, cientistas perceberam que informação genĂ©tica herdada desses hominĂdeos pode contribuir para tons de pele e de cabelo tanto mais claros quanto mais escuros, sugerindo que os Homo neanderthalensis eram diversos nesse aspecto.
De forma bem parecida com os Homo sapiens, os neandertais provavelmente eram diversos e podiam se diferenciar bastante de uma população para outra. NĂŁo dĂĄ para reduzir eles a algumas poucas caracterĂsticas, como dizer que todos tinham a pele de um jeito ou o cabelo de outro.
Fonte: abril