Ouriços-do-mar parecem apenas esferas escondidas nas poças de maré, mas novos dados indicam que eles são muito mais do que um conjunto de espinhos (e cujas ovas são apreciadas na gastronomia).
Uma equipe internacional de cientistas revelou que esses animais possuem um “cérebro por todo o corpo”, uma estrutura tão complexa que pode redefinir as teorias sobre como sistemas nervosos evoluíram.
A descoberta, publicada na revista Science Advances, surgiu quando o biólogo Periklis Paganos, da Estação Zoológica Anton Dohrn (instituto de pesquisa italiano), e seus colegas investigavam o processo de metamorfose do ouriço-do-mar roxo (Paracentrotus lividus). O que começou como um estudo sobre transformação corporal tornou-se uma revelação sobre a arquitetura neural desses equinodermos.
Os ouriços passam por uma metamorfose profunda: deixam de ser larvas bilaterais, com duas metades simétricas como as de humanos e peixes, para assumir n forma adulta a simetria radial – um corpo dividido em cinco seções ao redor de um eixo central, semelhante ao de estrelas-do-mar e águas-vivas (é isso, somado ao fato de serem animais marinhos, que os define como equinodermos).
Essa transição, uma das mais radicais do reino animal, mostrou-se ainda mais extrema quando os pesquisadores começaram a mapear os tipos de células envolvidas. O que encontraram foi um conjunto diverso de neurônios espalhados por todo o corpo do jovem ouriço recém-transformado.
Usando um atlas celular detalhado, produzido por meio do mapeamento de quais genes estavam ativos em cada célula, os cientistas identificaram que mais da metade de todos os grupos celulares do animal eram neurônios. E não neurônios simples: muitos carregavam assinaturas moleculares familiares a humanos, incluindo dopamina, serotonina, GABA e glutamato.
Para comparar, 0,2% do total de células do corpo humano corresponde a neurônios.
A descoberta sugere que o sistema nervoso do ouriço-do-mar é muito mais sofisticado do que a rede neural descentralizada que se acreditava existir em equinodermos.
Os autores vão além e propõem que, em vez de um organismo “sem cérebro”, o ouriço é um organismo “todo cérebro”, no qual cada parte do corpo funciona como uma região especializada de uma estrutura neural distribuída.
Essa descoberta desafia a noção clássica de que cérebros complexos só evoluíram em animais com sistemas centralizados, como os vertebrados. Segundo o biólogo evolutivo Jack Ullrich-Lüter, do Museu de História Natural de Berlim, os dados mostram que “animais sem um sistema nervoso central convencional ainda podem desenvolver uma organização parecida com a de um cérebro”, em comunicado. Isso pode alterar a maneira como cientistas entendem a evolução de nervos e cérebros no reino animal e desafiam suposições antigas sobre a simplicidade dos sistemas nervosos dos equinodermos.
Fonte: abril






