Segundo dados do governo federal, o território ocupa o primeiro lugar no ranking de alertas de garimpo ilegal entre todas as TI do Brasil. Estima-se que 5 mil garimpeiros atuem na região. Além dos impactos à cultura e à autodeterminação do Povo Katitãuhlu, a atividade exploratória provoca danos ao meio ambiente e à subsistência dos indígenas.
A recomendação foi assinada pela Defensoria Nacional dos Direitos Humanos (DNDH), pela Defensoria Regional de Direitos Humanos no Mato Grosso (DRDH/MT) e pelo Grupo de Trabalho dos Povos Indígenas e enviada ao Ministério dos Povos Indígenas (MPI), Ministério da Justiça e Segurança Pública (MJSP), Polícia Federal, Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai) e Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama). O prazo para resposta, devidamente fundamentada, é de 15 dias úteis.
A Defensoria reuniu informações, por meio de ofícios enviados aos órgãos, sobre as operações já realizadas no território de Sararé para reprimir o avanço do garimpo ilegal, mas as iniciativas têm produzido apenas resultados temporários, tendo em vista que, após finalizadas, o garimpo retorna às atividades. O documento acrescenta ainda que “as operações costumam ocorrer com intensa reação violenta e armada por parte dos criminosos”, resultando em risco à integridade dos agentes e dos indígenas. A DPU destaca a necessidade de um plano de atuação mais complexo, com estruturas e ações integradas a longo prazo.
Além da imediata da desintrusão, a recomendação pede que sejam instituídas medidas urgentes de proteção ao Povo Indígena Katitãuhlu e ao território, diante da gravidade do cenário; ações definitivas de cessação do circuito de extração ilegal de garimpo, degradação socioambiental, desmatamento e invasão da TI; inclusão da Terra Indígena no calendário de desintrusões ainda no ano de 2025; e adoção de medidas estruturantes para assegurar providências efetivas em defesa dos povos e comunidades tradicionais do Mato Grosso.
Contexto
A TI Sararé é habitada por cerca de 200 indígenas Katitãuhlu, da etnia Nambikwara, organizados em diversas aldeias. O território, que tem acesso facilitado por estar às margens da BR-174, possui cerca de 67.420 hectares de extensão e foi demarcado em 1985. A TI está situada entre os municípios de Conquista D’Oeste, Nova Lacerda e Vila Bela da Santíssima Trindade, na região da fronteira oeste do Mato Grosso.
Embora a atividade garimpeira exista em Sararé desde a década de 1990, ela se intensificou nos últimos dois anos, conforme denúncias feitas pela Associação Indígena Sararé – Katitãurlu, do Povo Indígena Katitãuhlu (Nambikwara do Sararé). “As medidas adotadas até o momento não foram suficientes para impedir a violência estrutural e sistemática contra terras indígenas de menor dimensão, como é o caso da TI Sararé, o que continua a ameaçar a integridade e os direitos fundamentais da comunidade, configurando risco de dano irreparável”, aponta trecho do documento.
A recomendação destaca que, no ano de 2024, foram identificados 570 hectares de destruição pelo Sistema de Detecção do Desmatamento em Tempo Real (Deter), do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), o que equivale a cerca de 570 campos de futebol. A facilitação do acesso ao território e ao escoamento do minério extraído também contribui para que a região tenha recorde de alertas de garimpo ilegal. Esta foi a TI com mais máquinas apreendidas e destruídas nos anos de 2023 e 2024.
Impactos
A associação dos indígenas, assistida pela Defensoria, aponta que a presença do garimpo na região tem impedido a manutenção do estilo de vida tradicional na comunidade, com interferência nas atividades cotidianas pelo barulho da operação e passagem das máquinas, além de impactos na realização de rituais e danças pelo medo constante em que vivem. A degradação do solo, da água, da vegetação e da fauna prejudicam a subsistência e a sobrevivência do Povo Katitãuhlu.
De acordo com o documento, o córrego Água Suja, principal recurso hídrico que atravessa a Terra Indígena Sararé, foi removido do leito original, “resultando em buracos e crateras profundas, algumas com mais de 20 metros de profundidade”. O Rio Sararé também já se encontra gravemente poluído pelos rejeitos de garimpo e do mercúrio pelo processo de lavra. Foi verificado no local o uso de mercúrio e cianeto no refino do minério. Ambos são compostos químicos comuns ao garimpo ilegal e extremamente tóxicos, que causam severos e irreversíveis danos à saúde e ao meio ambiente.
O aumento da violência, inclusive com a presença de facções e associações criminosas, também é uma marca da exploração ilegal. “Multiplicam-se os registros de ameaça de morte e de danos à integridade física dos indígenas, bem como os registros de danos e de ameaças de destruição das aldeias, já que o território está sendo ocupado, loteado e explorado ilegalmente”, diz o texto. Em fevereiro deste ano, os assistidos informaram à Defensoria que estão ainda mais frequentes os registros de tiros, e que a comunidade está em uma situação extremamente delicada e vulnerável.
Fonte: Olhar Direto